A surdez é uma realidade complexa que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, exigindo uma compreensão aprofundada das suas nuances e desafios. No contexto português, essa questão assume uma relevância particular, não apenas pela necessidade de conhecer a situação atual das pessoas com deficiência auditiva, mas também pela importância de compreender as suas necessidades específicas em termos de reabilitação e acessibilidade (recursos tecnológicos, tecnologias assistivas).

Ao adentrar o universo da surdez em Portugal, deparamo-nos com uma multiplicidade de fatores a considerar. Desde os diferentes tipos e níveis de surdez, até às necessidades variadas de reabilitação e apoio, bilateral e diferenciado de pessoa para pessoa, é imperativo dissecar os números e estatísticas que delineiam essa realidade.

“Um aspeto crucial reside na compreensão das diversas faixas etárias afetadas pela surdez.”

Do recém-nascido diagnosticado com perda auditiva à pessoa idosa que enfrenta a diminuição gradual da audição, cada fase da vida apresenta desafios e necessidades únicas que exigem intervenções personalizadas e adequadas.

No entanto, o acesso a dados estatísticos precisos e abrangentes sobre a surdez em Portugal é frequentemente obstaculizado pelo sigilo mantido pelas entidades hospitalares e clínicas, bem como pela falta de atualização das fontes estatais. Esta lacuna na disponibilidade de dados representa não apenas um entrave à compreensão plena da situação, mas também uma barreira para a implementação de políticas e programas eficazes de apoio às pessoas com deficiência auditiva.

A importância de desvendar esses números não reside apenas na mera curiosidade estatística, mas sim na necessidade premente de garantir que os recursos e serviços disponíveis estejam alinhados com as necessidades reais daqueles que vivem com surdez. A falta de acesso a próteses auditivas, bem como estimar quem necessita de uma cirurgia para implantes e consequente acesso aos processadores adequados, por exemplo, pode ter um impacto significativo na qualidade de vida e na integração social das pessoas com deficiência auditiva.

Este artigo propõe-se a explorar a realidade da surdez em Portugal através da lente da estatística, destacando a importância de superar os desafios relacionados com a obtenção e divulgação de dados precisos. Ao fazê-lo, visa contribuir para um maior entendimento e sensibilização em torno desta questão vital, bem como para o desenvolvimento de políticas mais inclusivas e eficazes no âmbito da saúde auditiva e do próprio bem-estar pessoal.

Retirando a opinião pessoal de vários testemunhos auditivos que a nossa Associação OUVIR tem recebido, é preocupante a forma como as entidades privadas e públicas encaram a surdez, de forma leviana e sem devida importância, sem ter o mínimo de noção e responsabilidade. A surdez também pode ser considerada uma doença crónica, a surdez também é um problema de saúde pública, porque pode afetar não somente a capacidade de apreensão e compreensão dos sons, mas igualmente, a capacidade cognitiva e o impacto psicológico que esta pode ter.

É essencial que as entidades públicas e privadas reconheçam a gravidade da surdez e ajam com responsabilidade, garantindo o acesso a serviços de saúde auditiva adequados e promovendo a inclusão e a igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência auditiva. Somente através de uma abordagem abrangente e sensível poderemos enfrentar os desafios que esta condição impõe e assegurar uma melhor qualidade de vida para todos os indivíduos afetados pela surdez.

Quando existem seguradoras que apenas comparticipam ou assumem os dispositivos médicos de reabilitação auditiva, quando esta perda ocorre no período contratual, estão a tomar a surdez como uma epidemia, quando na verdade é uma deficiência e corresponde a uma incapacidade, que na larga maioria das situações é irreversível, e por isso permanente. Para além disso, a surdez pode iniciar-se em qualquer idade do indivíduo: desde a gravidez até ao seu óbito. Como tal, não se pode estabelecer esta comparticipação da forma como se tem efetuado. O Estado continua a querer omitir o acesso aos dados referentes às pessoas com deficiência auditiva, de forma propositiva, sem conseguir responder aos inúmeros pedidos que se vão avolumando nos recursos às próteses e processadores de implantes auditivos. Não apenas para aquisição, mas no agravamento do tempo para upgrade ou substituição, pelo que este processo acaba por ser moroso.

O tempo de espera para uma cirurgia de implante auditivo também se tem vindo a agravar, apesar de existirem cada vez mais meios, médicos otorrinolaringologistas, qualificados conhecedores e familiarizados com este tipo de cirurgias, para além de mais hospitais capazes de responder a este tipo de solicitações. Não podemos esconder os casos particulares, em que os profissionais de saúde auditiva, que deveriam estar habilitados, acabam por recusar ou adiar algum tipo de cirurgia. Para além disso, a generalização e massificação tem conduzido de inconsistente à alguma falta de qualidade prestado por estes profissionais, alguns deles por alguma incompetência.

Os recursos necessários não podem passar somente pela próprias tecnologias de reabilitação, mas também por tudo o que envolve serviços, diagnóstico, profissionais, recursos destinados à acessibilidade e os benefícios que uma pessoa com deficiência auditiva deverá ter como direito e que sirvam os seus interesses e do Estado. As verbas e tudo o que acarreta a operacionalidade, a melhor inclusão social, o bem-estar e a melhor qualidade de vida, são fatores de extrema importância para o quotidiano e na atualidade.

Para concluir, é imperativo reconhecer que a surdez não é apenas uma condição médica, mas sim uma realidade complexa que afeta profundamente a vida das pessoas que a vivenciam. O acesso adequado a serviços de saúde auditiva, incluindo diagnóstico, tratamento e apoio contínuo é essencial para garantir a qualidade de vida e a plena inclusão desses indivíduos na sociedade.

No entanto, enfrentamos desafios significativos na obtenção desses serviços, desde a falta de disponibilidade de dados estatísticos até à burocracia e falta de recursos nos sistemas de saúde.

“A surdez não pode ser negligenciada ou tratada de forma leviana; é uma questão de saúde pública que requer uma resposta abrangente e eficaz.”

Devemos questionar-nos: estamos a fornecer os recursos necessários para atender às necessidades das pessoas com deficiência auditiva de forma adequada? Estamos a garantir o acesso equitativo a serviços de saúde auditiva e apoio social? Estamos a agir com a urgência e responsabilidade necessárias para enfrentar essa questão de forma eficaz?

À medida que continuamos a explorar e desvendar a realidade da surdez em Portugal, é essencial que todos os setores da sociedade, incluindo entidades públicas, privadas e a sociedade civil se unam para garantir que cada indivíduo afetado pela surdez receba o suporte necessário para viver uma vida plena e inclusiva.

Instigamos não apenas uma reflexão mas também uma ação imediata e coordenada para superar os desafios que enfrentamos. Afinal, a verdadeira medida de uma sociedade é como ela trata os seus membros mais vulneráveis. É nossa responsabilidade coletiva assegurar que ninguém seja deixado para trás, especialmente aqueles que enfrentam desafios de surdez.

Notícia relacionada

Investigação dá novas informações sobre cérebro de pessoas com surdez congénita