"É uma medida política para silenciar os moçambicanos", acusou, em declarações à Lusa, a ativista Quitéria Guirengane, representante do grupo que se reuniu nos últimos dias com o Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique (INCM), entidade reguladora, avançando hoje para as ruas, face à falta de respostas.

"Queremos exigir a revogação total da resolução que aprova estas tarifas, que são completamente insensíveis, imorais, anticoncorrenciais, desumanas, insustentáveis e improporcionais, porque violam gravemente os nossos direitos fundamentais, quer o direito do acesso à informação, o direito à educação, ao trabalho, à identidade, consignados na Constituição", acrescentou, durante a marcha de hoje.

Em causa está a publicação pelo INCM, em 19 de fevereiro, de uma resolução a estabelecer novas tarifas mínimas no setor das telecomunicações, de voz, mensagens e dados, cuja adaptação pelas três operadoras, desde 04 de maio, levou ao aumento real das tarifas e ao fim dos pacotes ilimitados.

Os promotores da marcha de hoje garantem, contudo, que "não é uma medida proposta pelas operadoras" e que resulta da intervenção, apenas, do regulador.

"O INCM, ao mesmo tempo que diz que não é responsável pela medida, dá todos os sinais que ele é que está a insistir", acusou Quitéria Guirengane.

"Queremos a cabeça das ordens superiores que impedem que a vontade dos cidadãos seja materializada", disse ainda a porta-voz da marcha, recordando que as consequências dos aumentos das tarifas, sobretudo pelo fim dos pacotes de dados ilimitados, se faz sentir em todas as áreas.

Como na agricultura, em que as sementes são "importadas, compradas pela Internet", ou para tratar de um bilhete de identidade e de um passaporte, no estudo ou na criação de emprego.

"É por esses que nós lutamos", assumiu Quitéria Guirengane.

Da marcha de hoje saiu o apelo a uma "operação geral de cancelamento e bloqueio" das páginas das operadoras nas redes sociais das operadoras de telecomunicações, seguindo-se uma "ação judicial contra o INCM".

"É uma decisão ausente de fundamentação. Já percebemos que não existe nenhum estudo. Segundo, mata a ideia de uma concorrência leal, terceiro, o próprio regulamento exige que haja uma auscultação pública e não houve", explicou.

Xavier Nhanala, 28 anos, é professor e juntou-se à marcha de hoje porque o custo das telecomunicações tornou-se insustentável.

"Nem livros nós temos, a Internet é o único veículo para buscar informação e conhecimentos", explicou, assumindo que dos 1.000 meticais (14,3 euros) que gastava por mês para ter internet e fazer chamadas, passou a gastar quatro vezes mais.

"Ao fim de duas ou três a Internet acaba. E note que nada mudou na minha forma de trabalhar", relatou, afirmando não compreender as decisões: "A não ser que haja uma agenda política para limitar a informação ao cidadão moçambicano".

Também Zaquia Tuacal, mediadora cultural de 32 anos, diz que a medida "é um meio de limitar os jovens", a "geração futura, que quer mudança"

"Antes eu gastava 500 meticais [7,2 euros] mensais, hoje posso dizer que até ao momento, desde a subida de preços, já gastei 800 meticais [11,5 euros], numa semana e pouco (...) Antes transformava 1 GB com 15 meticais [21 cêntimos de euro], hoje custa 70 meticais (um euro), que é o preço de quilo de açúcar, do quilo de arroz. É um absurdo", atira, de cartaz em punho.

Com a bandeira moçambicana às costas, Francisco Tembi, 39 anos, produtor de um programa televisivo, descreve as novas tarifas como uma "aberração", sobretudo pelo acesso limitado que passou a existir à Internet, que "não é um capricho", mas "uma grande necessidade" e uma "garantia do sustento de muitas famílias".

"Em 24 horas gastava cinco meticais [sete cêntimos], agora tenho de gastar 50 meticais [72 cêntimos], para fazer o mesmo. É incomportável.

O presidente do INCM disse anteriormente que orientou as operadoras das telecomunicações a retirar os pacotes ilimitados de dados e de voz para evitar o "colapso do mercado" e a "concorrência desleal", visando também permitir maior abertura do mercado para atração de investimentos no setor.

"Estavam a prejudicar a economia. Os pacotes de 30 dias continuam, mas o consumidor não pode falar de forma ilimitada a ponto de lhe custar zero", esclareceu Tuaha Mote.

PVJ // MSP

Lusa/Fim