Os heróis não usam capa, usam um colete laranja e um boné azul. Na cabeça daquele menino estão os golos que pensa vir a marcar no Estádio do Dragão. Sentado num banco, fora das quatro linhas, imagina-se no lugar de Samu, Galeno ou Pepê e, mentalmente, coloca o seu corpo no lugar dos deles. Aquele posto, à beira do relvado, com vista 4K para toda a ação, é o miradouro dos sonhos azuis e brancos.
Pepê foi-se assegurar que aquela criança sabia que o protagonismo na jogada do 2-1 do FC Porto tinha sido dela e de mais ninguém. O extremo abraçou o garoto que rapidamente cedeu a bola para o lançamento lateral. A perceção que teve dos acontecimentos denotou maior capacidade de leitura de jogo do que muitos que são pagos por, supostamente, a terem. O SC Braga foi apanhado em contrapé com a rápida reposição. O clássico da oitava jornada do campeonato decidiu-se aí, na sagacidade de um apanha-bolas.
Na fase em que se deu o momento crucial para o FC Porto conquistar a vitória e manter a distância de três pontos para o líder Sporting, a equipa de Vítor Bruno não estava confortável no jogo. Carlos Carvalhal desfizera-se de complexos no início da segunda parte e os guerreiros tinham acabado de chegar ao 1-1 com um grande golo de Roger Fernandes. A partir dos 59 minutos, o FC Porto recuperou os índices de intensidade aos quais deu descanso no período imediatamente antes e depois do intervalo.
Os dragões tiveram um arranque de jogo sólido. O rigor na pressão e na reação à perda instalou a equipa no meio-campo ofensivo. Gabri Martínez tentava, pela esquerda, rebocar o SC Braga. Aquela era uma zona sob a qual os portistas nem sempre ao longo da época têm tido controlo absoluto. Desta vez, entre João Mário e Zé Pedro, os buracos foram sendo cosidos.
Os primeiros cerca de 20 minutos abundaram em produção. Samu Aghehowa foi servido à mesa do desalento quando o golo por ele marcado acabou anulado. Na mesma trajetória da locomotiva espanhola estava João Ferreira. O atropelamento não escapou ao VAR. Lamentável que a variação de Nico González, dos píncaros de um hemisfério à ponta do cabelo do outro, tenha sido desaproveitada.
Na linha defensiva do SC Braga, a regra primordial era que os laterais, Víctor Gómez e Adrián Marín, não podiam marcar diretamente os homólogos. Visto que o FC Porto projetava João Mário e Francisco Moura em simultâneo, os extremos dos guerreiros estavam forçados a afundar, ou seja, a distância a percorrer para se desdobrarem ofensivamente, era enorme.
Só na primeira fase de construção é que o FC Porto tinha problemas. Nehuén Pérez passou por um sobressalto, tal como Francisco Moura. Este segundo episódio deu ao SC Braga a oportunidade de desenvolver a melhor oportunidade da primeira parte. Gabri Martínez alimentou o movimento de infiltração de Victor Carvalho. Diogo Costa aliviou o momento de tensão.
A oportunidade de golo dos minhotos congelou a impetuosidade azul e branca. Provavelmente por ordem de Vítor Bruno, a equipa reduziu a exposição ao risco. Martim Fernandes ia aquecendo e, lá dentro, estancar o SC Braga custou a João Mário um amarelo e a iminência do segundo. Aquilo que o internacional português estava a acrescentar no ataque – e era um contributo relevante – não o livrava de eventualmente deixar a equipa em inferioridade numérica. A substituição aconteceu ao intervalo, pouco depois do FC Porto ter chegado ao golo por intermédio de Galeno, de grande penalidade, numa fase menos boa do percurso até à vitória.
Dentro da oscilação emocional, que também esteve presente no empate (3-3) frente ao Manchester United, ocorreu um lapso na salvaguarda do espaço diante dos centrais. Zé Pedro até conseguiu aliviar um cruzamento vindo da esquerda, mas teve que ser ele próprio a tentar resolver nova onda do ataque do SC Braga. Não conseguiu. Roger Fernandes foi violento no remate que desferiu e nem a barra o parou. O momento de inspiração do jovem só não foi mais luminoso, porque acabou ofuscado pela resposta de Pepê.
Carlos Carvalhal lançou Bruma, Ismaël Gharbi, Rafik Guitane e Amine El Ouazzani para o ataque, o que ajudou a que o SC Braga tenha terminado com maior pendor ofensivo. Não estando 100% senhor de si, o FC Porto usou a borracha para apagar os ataques desenhados a lápis, quase todos pelos flancos, do adversário. A diferença no resultado foi segurada por Diogo Costa que parou El Ouazzani e toda a ambição bracarense.