A Procuradoria-Geral da República (PGR) de Moçambique aplicou esta terça-feira a medida de termo de identidade e residência a Venâncio Mondlane, num processo em que o Ministério Público acusa o político de incitação à violência nas manifestações pós-eleitorais.

"Foi-me aplicada uma medida [de coação] sancionatória e de limitação. Isto significa que eu não me posso deslocar sem avisar a Procuradoria, não posso ficar por mais de cinco dias fora da minha casa", explicou o político moçambicano à comunicação social, à porta das instalações do Ministério Público, momentos após ser ouvido por mais de dez horas.

Venâncio Mondlane foi ouvido na PGR sobre um dos oito processos em que é visado no âmbito dos protestos e agitação social pós-eleitoral em Moçambique.

"Foi-me feita uma saraivada de perguntas que justificou este tempo todo. São perguntas que têm a ver com a promoção das manifestações, a incitação à violência, os prejuízos à economia. Eu respondi essas perguntas sem saber exatamente de que crime sou acusado", declarou Mondlane.

Segundo Mondlane, as medidas aplicadas pela PGR não o impedem de continuar a fazer as suas atividades políticas."Eu vou continuar a fazer a minha atividade política normal e o meu trabalho normal. A única questão é que todos os movimentos para além dos cinco dias têm de ser comunicados", declarou o político moçambicano, que promete apresentar o partido político que está a fundar nos próximos dias.

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Mondlane acrescentou que a PGR abriu espaço para que a sua equipa apresentasse o dossiê dos processos submetidos à justiça e que não tiveram resposta.

"São processos que nós submetemos à PGR no ano passado e que a PGR vai, processo por processo, dossiê por dossiê, dar-nos o devido esclarecimento sobre o ponto de situação de cada um deles", r eferiu Mondlane.

Polícia chegou a lançar gás lacrimogéneo

A audição do ex-candidato presidencial levantou um clima de suspense esta terça-feira em Maputo, com um forte contingente policial a bloquear, de manhã, os acessos à avenida Vladimir Lenine.

Logo pelas 07:00, nos principais acessos àquela avenida, que atravessa o coração de Maputo, um forte contingente da Unidade da Intervenção Rápida (UIR) da polícia, incluindo a força canina, estava posicionado, aconselhando simpatizantes de Mondlane que ficaram à porta da PGR, em frente do Tribunal Supremo, a sair do local.

A polícia moçambicana chegou a lançar gás lacrimogéneo nas imediações da Procuradoria-Geral da República (PGR), para dispersar dezenas de apoiantes de Mondlane, que insistiam em permanecer nas imediações, entoando hinos de apoio.

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Em 22 de novembro, o MP moçambicano exigiu uma indemnização de 1,5 milhões de euros pelos prejuízos das manifestações na província de Maputo, num novo processo contra Mondlane e o Podemos, partido que o apoiou até fevereiro deste ano.

Esta foi uma segunda ação cível do género conhecida, depois de uma outra a que o MP deu entrada no Tribunal Judicial de Maputo, só referente a prejuízos na capital, pedindo uma indemnização de 32.377.276,46 meticais (486 mil euros).

Em 27 de janeiro, a PGR anunciou a abertura de processos considerando que o autodenominado "decreto presidencial" de Mondlane subverte os princípios do Estado democrático.

Em causa está "decreto" assinado por Mondlane

Em causa estava um documento assinado e divulgado por Mondlane na altura, intitulado "decreto", publicado no autodesignado "Jornal do Povo", com 30 medidas para 100 dias, sendo que, numa delas, o político afirma que "cabe ao povo, às vítimas, instituir-se como tribunal autónomo que emite sentenças para travar a onda macabra da UIR, GOE e Sernic", referindo-se a unidades da Polícia da República de Moçambique que acusou de "incessante fulgor de execuções sumárias".

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A PGR entende que "a publicação do suposto decreto (...) consubstancia uma flagrante violação" da Constituição.

Moçambique vive desde outubro um clima de forte agitação social, com manifestações e paralisações convocadas por Mondlane, que rejeita os resultados eleitorais de 09 de outubro, que deram vitória a Daniel Chapo.

Desde outubro, pelo menos 353 pessoas morreram, incluindo cerca de duas dezenas de menores, de acordo com a Plataforma Decide.