
O Eid al-Fitr, a celebração que assinala o fim do mês sagrado islâmico, que durante 30 dias obriga a fazer jejum entre o amanhecer e o anoitecer, começa com uma oração comunitária, realizada em mesquitas ou em espaços abertos, reunindo toda a comunidade.
Em Lisboa, onde se estima viverem cerca de 15 mil muçulmanos, estavam previstas orações para a Praça do Martim Moniz e para a Alameda, além das habituais na Mesquita Central.
Às 07:00, sob o crepúsculo do amanhecer, quando as ruas estavam ainda silenciosas e apenas o canto dos pássaros enchia o ar, algumas dezenas de vultos movimentavam-se a contraluz sobre o relvado central do Jardim da Alameda Dom Afonso Henriques, estendendo grandes lonas impermeáveis, que seriam o chão sobre o qual decorreria a oração prestes a começar.
Um bando de gaivotas sobrevoava esta agitação, que se destacava contra a luz amarelada da fonte luminosa, em frente da qual um outro grupo de muçulmanos começou a estender uma nova lona, dando início ao aglomerar de pessoas que, em pouco menos de meia hora já rondava os milhares.
Chegavam em família, em grupos ou sozinhos, a pé, de carro e de bicicleta, vindos de todos os lados, transportando os seus próprios tapetes de oração, e era evidente a alegria e a forma calorosa como se cumprimentavam e abraçavam.
No topo do relvado central foi montado um pequeno púlpito, ornado com plantas e flores, de onde o imã conduziu as orações para os milhares de fiéis sentados sobre os tapetes, que juntos formavam um grande mosaico colorido, de padrões diversos.
Milhares de sapatos aglomerados emolduravam o retângulo de relva, onde os muçulmanos se encontravam sentados e perfeitamente alinhados, escutando as orações que duas grandes colunas, uma de cada lado da Alameda, propagavam para o ar.
Maioritariamente composto por homens, mas também algumas mulheres e crianças, o grupo de fiéis distinguia-se pelo uso de indumentárias específicas para a ocasião: túnicas longas e kufi (um chapéu típico islâmico, arredondado e sem aba) para os homens, e capas longas coloridas e com apliques brilhantes ou espelhados, juntamente com o hijab (lenço que cobre a cabeça e o pescoço), para as mulheres.
Por volta das 08:30, terminada a oração, recomeçou a movimentação de corpos, a erguerem-se do chão, recolhendo e enrolando os tapetes, calçando os sapatos e reunindo-se em grupos animados para conversar, tirar fotos de grupo e muitas 'selfies'.
Foi também o momento de recolher os vários baldes que antes da oração circularam por entre os fiéis para recolher donativos destinados aos mais necessitados, já que a caridade desempenha um papel central nos festejos do fim do Ramadão.
"Acabou agora a oração do Eid al-Fitr. É a celebração islâmica da nossa comunidade muçulmana. Juntamo-nos todos para celebrar. Hoje rezo a Alá para toda a gente ser feliz", disse à Lusa Akiful Hasam, um jovem muçulmano que se encontrava já encostado a um dos muros que ladeiam a boca do metro, com o seu tapete enrolado e guardado dentro de um saco de plástico.
Para Akiful Hasam, residente em Portugal há alguns anos, este é um país "bom para o islamismo", onde não sente obstáculos à sua liberdade religiosa e à sua "celebração", embora reconheça que os espaços existentes são já exíguos para a população residente.
A mesma ideia tem Mohammed Chowdhury, presidente da mesquita Alameda Jame Masjid, segundo o qual, a comunidade muçulmana é cada vez maior, congregando fiéis de várias partes do mundo residentes em Portugal, do Bangladesh à Índia, passando pelo Paquistão e Marrocos, entre muitos outros países.
Só na celebração de hoje na Alameda, estima que tenham estado perto de cinco mil crentes.
"Na sexta-feira, a oração Jumu'ah teve de ser celebrada três vezes [na mesquita da Alameda], para atender a todos, porque há cada vez mais gente", contou à Lusa, considerando que se houvesse "mais mesquitas, seria mais fácil".
O Salat al-Jumu'ah é uma oração especial que decorre na sexta-feira, e é uma das mais importantes da semana para os muçulmanos, para marcar o fim do Ramadão, um momento de reflexão, gratidão e renovação espiritual para a comunidade islâmica.
"O último dia do Ramadão é marcado pelo avistamento da lua nova, dando início a um novo mês lunar, segundo o calendário islâmico. Neste último dia, em todo o mundo, estamos todos juntos em festa, ricos, pobres, refugiados, em guerra, em qualquer situação, este é um momento de festa grande", afirmou.
Às 09:30, junto à Mesquita Central de Lisboa, sede da comunidade islâmica portuguesa, em São Sebastião, uma multidão - em que se destacava muito mais a riqueza e exuberância das roupas, não só dos homens, mas sobretudo as femininas, as maquilhagens e o perfume no ar -- aglomerava-se junto às portas para entrar.
Lá dentro, alguns funcionários orientavam os caminhos a seguir e a disposição a ocupar, tentando rentabilizar e organizar o espaço de modo a acomodar o maior número possível de pessoas.
Cá fora, a polícia municipal, ia orientando o trânsito e o estacionamento, caóticas para aquela hora da manhã de um domingo.
De acordo com o vice-presidente da Comunidade Islâmica de Lisboa, Abdul Razac Seco, aquele grupo procurava conseguir assistir à segunda oração, celebrada especificamente para atender a quem não conseguiu estar presente da primeira oração, conduzida às 07:30 pelo xeque David Munir, imã da Mesquita Central de Lisboa.
"Alguns optam por vir agora, mas muitos só conseguem assistir a esta oração por questões logísticas, ou seja, pela falta de capacidade do espaço para albergar tanta gente", especificou, à Lusa, adiantando que no final todos irão para as suas casas, fazer as suas refeições e terminar as celebrações.
Durante o mês do Ramadão, a Mesquita Central de Lisboa confecionou cerca de 2.000 refeições diárias para a quebra do jejum, ao pôr-do-sol.
O facto de o ano lunar ser mais curto que o solar explica que a cada ano a data do Ramadão se aproxime do início do ano 10 ou 11 dias. Em 2030, o Ramadão será celebrado duas vezes, no início de janeiro e no final de dezembro.
De acordo com o xeque David Munir, em Portugal, a comunidade muçulmana "já ultrapassou os 100 mil" crentes.
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