A artista falava aos jornalistas no final de uma visita guiada à exposição "Lourdes Castro - todos os livros", com meia centena dos seus livros de artista, no Museu Calouste Gulbenkian, com curadoria de Paulo Pires do Vale.
Questionada pela agência Lusa sobre que importância tinha a sua obra, respondeu: "A minha obra é a minha vida, é como respirar. E faço tudo sem intenção, só porque gosto", sublinhou.
Os livros de artista que criou desde os anos 1950 até hoje, muitos deles nunca expostos, vão estar na Galeria de exposições temporárias da Gulbenkian até 26 de outubro.
Há livros com textos, colagens, citações de poetas e escritores portugueses, franceses e alemães, como Herberto Helder, Rainer Maria Rilke, Guillaume Apollinaire, Arthur Rimbaud, palavras escritas com bordados; e os temas variam, desde a moda, à ilha da Madeira, onde nasceu, a histórias e à natureza.
Entre os livros inéditos, vai estar "Un autre Livre Rouge", realizado em Paris, no início dos anos de 1970, em colaboração com o seu companheiro, Manuel Zimbro, uma obra nunca antes exibida ao público, e que ocupa grande parte da galeria, partindo do livro de Mao Tse Tung, mas que se estende a uma grande diversidade de objetos e imagens em vermelho.
"Nunca pensei nestes livros como livros de artista. É uma coisa que todos fazemos na infância. Hoje há muita coisa, mas antigamente não havia quase nada, e tínhamos de ser nós a fazer os nossos brinquedos", recordou a autora, acrescentando que esse fascínio pelo livro criado manteve-se até hoje.
Um aspeto da personalidade de Lourdes Castro, muito falado pelo comissário durante a visita guiada, é a capacidade de organização da criadora, que regista tudo o que faz e sabe exatamente onde está guardado.
"Sempre gostei de fazer essas notas. Não me define como artista, mas acho que tudo é precioso", salientou.
A proximidade com a natureza, o jogo, os sonhos e a abertura, são outros interesses de Lourdes Castro, que se retirou da vida artística intensa nos anos 1980, regressando à Madeira, em 1983, depois de 25 anos em Paris.
Organizada pela Biblioteca de Arte da Fundação Gulbenkian, a mostra "constitui um testemunho da importância destes trabalhos no desenvolvimento da obra de Lourdes Castro", considerada uma das figuras mais importantes da arte portuguesa.
Muitos dos livros são únicos, outros tiveram edições limitadas, feitas em serigrafia, e alguns resultaram da colaboração com escritores, como Benjamin Patterson, outros ainda da recolha sobre temas prediletos da artista, nascida no Funchal.
O livro de artista permitiu a Lourdes Castro explorar muitas possibilidades, desde a criação, com o artista René Bertholo, da revista e editora KWY, em Paris, no final dos anos de 1950, até hoje, continuando a completar o seu "Álbum de família", no qual recolhe as referências, imagens e textos, que encontra relativamente à sombra.
Depois de ter estudado Belas Artes, foi para Paris, em 1958, onde publicou, com René Bertholo, João Vieira, José Escada, Costa Pinheiro, Gonçalo Duarte, Christo e Jan Voss, a revista/movimento "KWY: Da abstração lírica à nova figuração", com as três letras que não existiam no alfabeto português.
A revista tornou-se um objeto artístico, impresso à mão, no qual eram misturadas serigrafias originais com fragmentos de objetos, fotografias, imagens, ao mesmo tempo que promoviam exposições.
Ao longo da carreira apresentou exposições individuais em Portugal, na Alemanha, na Holanda, na República Checa, em França, no Brasil, no Reino Unido, em Espanha.
A sua obra encontra-se em diversas coleções públicas e privadas, tais como o Victoria e Albert Museum, em Londres, o Museu de Arte Moderna de Havana, o Museu de Arte Moderna de Belgrado, os Museus Nacionais de Varsóvia, Vroclaw e Lódz, o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, e a Fundação de Serralves, no Porto.
No âmbito da mostra, a Gulbenkian vai publicar o 'catálogo raisonné' dos livros de artista, com imagens e indicações sobre as obras, ao qual Loures Castro chama "catálogo comprovado".
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