Programas eleitorais do PS (Um Novo Impulso para Portugal) e da AD (Portugal não pode parar) em termos de Defesa Nacional: a linha vermelha do Estado Social


1. Introdução

Os programas eleitorais dos diferentes partidos políticos não deixam de abordar a situação internacional e as consequências para a segurança e defesa de Portugal, da Europa e do Mundo. No entanto, a abordagem mais política, leva a que não especifiquem conceitos de ação ou números, com receio de serem alvo de debate discutível ou de escrutínio posterior. Como resposta defensiva, estabelecem algumas linhas vermelhas, tendo o cuidado de associar aos inevitáveis investimentos em defesa as garantias de manutenção do Estado Social.

Vejamos agora os programas do PS e da AD, os quais são mais desenvolvidos em função do facto de terem estado no poder muito recentemente e de, simultaneamente, serem partidos de poder.


2. Programa do PS

O programa do PS inclui as principais questões da Defesa na 5ª Missão (de 5), identificada como “Um Portugal central na Europa e no Mundo”.

Antes disso, não deixa de fazer o enquadramento geopolítico de Portugal, seja na afirmação da relação transatlântica como prioridade da Política Externa portuguesa, seja como ator proativo no desenho de uma nova arquitetura de segurança para a Europa, seja ainda na defesa da Ucrânia e do direito à autodeterminação, soberania e integridade territorial. Destaca ainda, a necessidade de aprofundamento da participação nacional em instâncias multilaterais, da NATO à OCDE, apoiando a Organização para a Segurança e Cooperação Europeia e o Conselho da Europa.

Sem destacar números ou percentagens, refere a necessidade de contribuir para o processo de aprofundamento da autonomia estratégica da EU nos domínios energéticos, tecnológico, industrial, da competitividade e ao nível da segurança e defesa.

Para além da ameaça russa, não deixa de sublinhar os novos desafios colocados no âmbito da relação com os EUA. E nesse âmbito destaca claramente a participação no Plano ReArmEurope, destacando em sublinhado que o reforço do investimento europeu em defesa não deve colocar em causa as políticas de coesão e o Estado Social, privilegiando o endividamento comunitário como instrumento financeiro.

No final, e no capítulo “Uma Defesa Nacional à altura dos desafios atuais” (p. 231, subdividido em: 4.1 Capacitação; 4.2 Ação Externa; 4.3 Economia da Defesa; 4.4. Carreira e Condição Militar) sublinha a necessidade de o país estar preparado para encetar uma nova fase de investimento na Defesa Nacional, sendo prioritário acelerar de forma determinada a modernização e o reforço das nossas capacidades militares.

Destaca ainda, a necessidade de Portugal acompanhar e participar ativamente nos esforços de afirmação militar europeia e da indústria nacional poder desempenhar um papel muito relevante na sua concretização, através do investimento na capacitação da base industrial e tecnológica de defesa, do cluster aeronáutico ao cluster marítimo.

Neste capítulo todas as grandes questões associadas à defesa estão levantadas, mas com um discurso muito genérico, muito de La Palice. O programa não reflete a despesa adicional para chegar aos 2% do PIB e muito menos aos 3%, que serão provavelmente decididos na cimeira da NATO poucos dias depois da tomada de posse do governo. Quando aborda o investimento em defesa tem a preocupação de salvaguardar as políticas de coesão e o Estado Social, privilegiando o endividamento comunitário como instrumento financeiro (programa ReARm?).


3. Programa da AD

O programa da AD está dividido em três partes (I -Mais que promessas: resultados; II – Programa social e de governação da AD – coligação PSD/CDS; III – Programa económico da AD – coligação PSD/CDS), e inclui as questões da defesa na parte II, identificada como “A Defesa Nacional: porque é preciso continuar? Metas; medidas” (páginas 184 a 186).

O contexto internacional e o posicionamento geopolítico de Portugal também é feito ao logo do documento, destacando as incertezas, a guerra de conquista que a Rússia desencadeou na Ucrânia (violando fronteiras estabelecidas e o direito internacional, vitimando inocentes e destruindo alvos civis), o agravamento da situação política e militar no Médio Oriente, a ascensão da China como potência global, a deslocação estratégica norte-americana para o Indo-Pacífico e o recente posicionamento da administração Trump.

Assume a importância da credibilidade junto dos aliados, assim como a necessidade de assegurar um aumento dos investimentos da Defesa Nacional, em linha com as exigências dessas organizações multilaterais, mas sublinhando que o irá fazer sem colocar em causa os equilíbrios orçamentais, o bom desempenho da Economia e as obrigações cometidas ao Estado Social.

Nas metas destaca que no novo contexto geopolítico, pretende fortalecer o investimento na segurança e defesa, em linha com a UE e a NATO, antecipando a meta de 2029 (2% do PIB em defesa), mediante duas condições: o investimento não porá em causa o Estado Social e deve ter um efeito multiplicador do crescimento, ampliando a nossa indústria de segurança e defesa.

Mas medidas a alcançar sublinha de novo os 2% do PIB, que serão antecipados para 2029, referindo ainda o desenvolvimento da capacidade industrial nacional gerando emprego e valor acrescentado, com 20% em bens, infraestruturas e equipamentos, em linha com os compromissos NATO.

Todas as grandes questões da defesa estão listadas do garantir forças armadas capacitadas, ciberdefesa, indústrias de defesa, antigos combatentes e história militar.

Com uma metodologia diferente do PS, aborda as temáticas em linha com os trabalhos em desenvolvimento no governo. Assim, é um programa menos teórico e político, e com medidas mais objetivas, designadamente os 2% do PIB na NATO (não fala nos 3%). Mas, tal como o PS, salvaguarda várias vezes que não afetará o estado social destacando que terá um efeito multiplicador do crescimento.


4. Considerações finais

Os dois programas (PS e AD) estão bem trabalhados em termos de defesa, elencando as grandes questões relacionadas com a situação política internacional (ambos abordam a preocupação com a nova administração Trump) e com a necessidade de investimento na defesa em geral e nas forças armadas em particular. Ambos têm a mesma linha de continuidade do compromisso com as organizações internacionais de que fazemos parte, desde a ONU à NATO, passando pela EU.

Relativamente ao investimento concreto na defesa e para além das palavras, só o programa da AD refere concretamente a intenção de antecipar os 2% do PIB para 2029, mas destacando que não porá em causa o Estado Social e que vai ter um efeito multiplicador do crescimento, ampliando a nossa indústria de segurança e defesa. Por outro lado, não aborda a maneira como vai fazer esse mesmo crescimento do PIB, designadamente no que respeita a eventuais empréstimos no âmbito da União Europeia.

Neste âmbito, o programa do PS não aborda valores de crescimento, destacando que o crescimento poderá ser suportado por empréstimos no âmbito do programa ReARm da União Europeia. E tal como o programa da AD, sublinha por diversas vezes que o reforço do investimento europeu em defesa não deve colocar em causa as políticas de coesão e o Estado Social, privilegiando o endividamento comunitário como instrumento financeiro.

Em nenhum dos programas é abordada a possibilidade dos 3% do PIB (apesar da pressão dos EUA para um compromisso com os 5%), situação que será certamente discutida e aprovada em sede da cimeira da 38ª cimeira da NATO, que terá lugar em Haia a 24 e 25 de junho. E isso constitui um compromisso com inevitáveis consequências para a gestão das contas públicas de Portugal e dos diferentes países da NATO. Mas em campanha eleitoral, a defesa não dá votos e muito menos quando se fala em cortes financeiros nas diferentes funções do Estado, com destaque para o Estado Social, considerado pelos dois programas como uma linha vermelha.