Há áreas da vida nacional que precisam muito mais da atenção política para o Orçamento do Estado (OE) de 2025 do que o IRC e o IRS jovem. É certo que o jogo político-mediático necessita da coreografia confrontacional que o Governo e o Partido Socialista estão a encenar desde julho, mas já ficou razoavelmente claro que Luís Montenegro aceitará as “exigências” do PS: estas convêm-lhe porque – ao contrário, por exemplo, do que o Bloco de Esquerda e o PCP faziam a António Costa – o que Pedro Nuno Santos “exige” (na verdade, oferece) aumenta a margem orçamental do Governo para implementar as políticas que quiser.

Ora, saber que o Governo vai ter margem orçamental permite avaliar melhor o que os ministros dizem. E no último domingo o ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, escreveu no “Público” que “o Governo está a trabalhar para melhorar o enquadramento jurídico das Instituições de Ensino Superior [IES] e porá fim à suborçamentação recorrente nas áreas da Educação e da Ciência, que em 2024 somam um défice de mais 300 milhões de euros deixado pelo anterior Governo”.

Este é que é um ponto central para “a transformação da economia e da sociedade portuguesas”, para usar as palavras de Fernando Alexandre! A suborçamentação das IES, sobretudo as do interior do país, é um golpe mortal em algumas das suas missões: assegurar a coesão do país, reter população qualificada fora dos grandes centros, mitigar a macrocefalia que concentra em Lisboa e Porto recursos estratégicos.

Não há política de coesão territorial, não há apoio ao interior e à sua capacidade de fixar quadros e desenvolver “uma economia cada vez mais baseada nas qualificações e na inovação, geradora de emprego com mais qualidade e com melhores salários (palavras de Fernando Alexandre)” sem apoiar os politécnicos e as universidades que funcionam neste território. O problema é que este apoio tem faltado, no essencial, por duas razões: a suborçamentação que o próprio ministro da Educação quantifica; e o último Governo de António Costa ter suprimido a possibilidade de alunos estrangeiros (da Lusofonia e de outras geografias) e de regimes especiais irem até 30% além do total de vagas das IES.

Como o “Expresso” noticiava em 6 de setembro, o resultado disto é que hoje “Lisboa e Porto concentram quase metade dos universitários”. Ou seja, o ensino superior, em vez de ser um fator de convergência das regiões mais pobres e despovoadas e ajudar o país a equilibrar-se, faz o contrário.

Isto é muito mau em si próprio. Mas é ainda pior se olharmos para o que sucede no interior dos Estados Unidos da América ou em regiões periféricas da União Europeia – como a Turíngia, no centro-leste da Alemanha, onde os neonazis acabam de chegar ao poder. Quando as populações sentem que o comboio do progresso e da convergência lhes escapou, entregam-se aos populismos subversivos de Trump... e outros.

Com um ensino superior enfraquecido por asfixia no interior, não é só a coesão territorial que fica afetada. É a própria saúde da democracia em Portugal. O Governo e o PS deviam ter isto bem presente ao negociarem o OE para 2025.