A filha de Dominique Pelicot, condenado em França por drogar a mulher, Gisèle, para a submeter a dezenas de violações por outros homens, denunciou na quarta-feira o seu pai por violação, disse esta quinta-feira a sua advogada.

Segundo a imprensa francesa, Caroline Darian apresentou uma queixa contra Dominique Pelicot junto do Ministério Público de Versalhes, nos arredores de Paris, acusando-o de violação, tentativa de violação, agressão sexual por um ascendente e uma dezena de outros crimes, segundo a sua advogada Florence Rault, citada por vários meios de comunicação franceses.

Dominique Pelicot, de 72 anos, foi condenado a 20 anos de prisão pelo Tribunal de Avignon, no sul de França, em novembro de 2024 por drogar reiteradamente a sua ex-mulher, Gisèle, sujeitando-a a ser violada enquanto estava inconsciente por dezenas de homens que recrutou pela internet entre 2011 e 2020.

"A grande esquecida no processo"

Na altura do julgamento, Caroline Darian disse que era "a grande esquecida no processo", porque não foi reconhecida como vítima do progenitor apesar de terem sido descobertas fotografias suas, inconsciente e em roupa interior, no disco rígido de Dominique Pelicot, quando foi detido em 2020.

Por considerar que assim como a sua mãe foi também vítima de violação, Caroline Darian apresentou igualmente uma queixa por "administração de uma substância de natureza a afetar o discernimento com o objetivo de cometer uma violação ou uma agressão sexual", ou seja, por sujeição química.

Durante o julgamento, que decorreu entre setembro e dezembro de 2024 em Avignon, Dominique Pelicot insistiu que "nunca" tocou na filha, negando que tenha sido ele o autor das fotografias.

"Tenho de seguir em frente com esta tragédia absoluta do silêncio e da dúvida que permanece", afirmou na quarta-feira em entrevista à France Inter, na sequência do lançamento em França do seu segundo livro "Para que alguém se lembre: Após o julgamento de Mazan, a luta continua para todas as vítimas de sujeição química".

Gisèle Pelicot, que foi casada com Dominique durante cerca de 50 anos, tornou-se um ícone feminista por se recusar a ter um julgamento à porta fechada, para que "a vergonha mude de lado".

Primeiro livro sobre o caso foi lançado em fevereiro em Portugal

O primeiro livro sobre o caso, "E Deixei de Te Chamar Papá", foi lançado em Portugal pela editora Guerra e Paz em fevereiro, para chamar a atenção das pessoas para o "flagelo" da submissão química, "um verdadeiro problema de saúde pública em França e, sem dúvida, noutros países da Europa", disse na altura Caroline Darian em entrevista à Lusa.

"Assim que o livro foi publicado, recebi muitos testemunhos e disse a mim mesma que tinha verdadeiramente de ajudar, de continuar o combate para contar a verdade e dar voz às vítimas que ainda hoje são invisíveis em França", afirmou, referindo que é esse o objetivo da sua associação #Mendorspas (Não Adormeça, em português), criada há cerca de dois anos.

Para além de Dominique Pelicot, o processo de Avignon resultou na condenação de 50 outros acusados de violação de Gisèle sob o efeito de drogas, com idades compreendidas entre os 27 e os 74 anos, dos quais 17 recorreram da sentença, sem contar com Dominique, que só comparecerá como testemunha no novo julgamento.

O julgamento do recurso dos 13 arguidos condenados que não retiraram o pedido terá lugar de 06 a 21 de outubro em Nîmes, no sul da França. Dominique Pelicot está ainda a ser acusado pela unidade de "casos arquivados" de Nanterre por uma tentativa de violação em 1999 e por uma violação e posterior homicídio de uma agente imobiliária de 23 anos em Paris, em 1991.