Daqui a 72 horas, no mesmo dia em que Ruben Amorim terá oportunidade de fazer a primeira antevisão a um jogo como responsável do Manchester United, o Sporting vai iniciar a era da sucessão, com João Pereira a estrear-se na partida diante do Amarante, a contar para a quarta eliminatória da Taça de Portugal.
Repletas de coincidências e de cumplicidades, as carreiras dos dois treinadores vão estar sempre interligadas, restando saber qual deles vai estar na próxima sexta-feira mais tempo sentado.
Amorim, no âmbito da deslocação ao terreno do Ipswich Town, prepara-se para responder a um leque infindável de perguntas, enquanto o novo técnico dos campeões nacionais sabe que as atuais habilitações o impedem de se levantar livremente do banco e dar instruções indiscriminadas à equipa.
No fundo, esse vai ser o primeiro grande desafio de João Pereira, ou seja, exercer a liderança no decorrer dos 90 minutos através de interposta pessoa, em concreto Tiago Teixeira, o adjunto que assumirá o estatuto de treinador principal assim que os leões forem chamados à ação nas quatro linhas.
Para conforto dos sportinguistas, o quadro competitivo que se avizinha promete aliviar um pouco as dores de cabeça inerentes a uma mudança técnica que estava programada para junho de 2025. Além do Amarante, também o Arsenal e o Santa Clara agendam presença em Alvalade, oferecendo desafios com características bastante distintas.
Se a receção ao segundo classificado da Liga 3 configura um indesmentível desnível, o mesmo não se pode dizer a propósito do confronto com o Santa Clara (o sensacional dono do quarto lugar na Liga Betclic) e muito menos se aplica ao mano a mano com o vice-campeão inglês, 12.º na Liga dos Campeões e somente a uma vitória do adversário que vai enfrentar a 26 deste mês.
Por muitas razões que tenham para estar deslumbrados com a temporada verde e branca (compensando a perda da Supertaça para o FC Porto), os adeptos do Sporting terão a plena consciência de que nem todas as noites podem ser tão inesquecíveis como aquela que eternizou a goleada de 4-1 imposta ao Manchester City. A qualidade do plantel comandado por Mikel Arteta e o simples facto de Pedro Gonçalves se debater com uma demorada lesão obrigam a refrear expectativas e a calibrar com rigor este ciclo de três partidas seguidas no aconchego do lar.
Há vários anos formatado pela estrutura, João Pereira perceberá, como poucos, que a prioridade das prioridades é o campeonato e que das batalhas iniciais a mais importante acaba por ser aquela que assinala o duelo com o representante açoriano. Convém relembrar que apesar de ainda estar a meio da prova, faltando-lhe disputar quatro rondas, o onze capitaneado por Morten Hjulmand, na Liga dos Campeões, está muito bem lançado para o apuramento direto para os oitavos-de-final, cenário suportado pelos 10 pontos conquistados e pela circunstância de fechar a fase de grupos em casa (ante o Bolonha).
A PROVA DOS 29
Aconteça o que acontecer na melhor competição da UEFA, o grau de exigência nada tem que ver com aquele que está definido para a realidade interna, nomeadamente no que respeita à ambição de festejar no Marquês um histórico bicampeonato. O julgamento que será feito ao substituto de Ruben Amorim assentará nos resultados que alcançar na corrida com FC Porto e Benfica, não faltando no horizonte combates diretos que podem marcar de forma decisiva o futuro do homem que Frederico Varandas redescobriu na Turquia.
A finalizar o ano (29 de dezembro), depois de uma série que pode chegar aos cinco compromissos (caso prossiga na Taça de Portugal), o Sporting recebe o arquirrival da Segunda Circular no dérbi que antecede a deslocação a Guimarães e a disputa da meia-final da Taça da Liga perante o... FC Porto. No espaço de um mês, entre 29 de dezembro e 29 de janeiro (data em que o Bolonha estará em Lisboa), João Pereira lidará com um calendário melindroso e que culminará no total esclarecimento sobre o nível da performance na Liga dos Campeões e na Taça da Liga.
Uma vez que o Benfica só vai cumprir o encontro em atraso com o Nacional da Madeira a 19 de dezembro, torna-se ainda mais prematuro avaliar as diferenças que se podem estabelecer no topo da classificação na véspera do “réveillon”, sendo certo que os 8 pontos que separam neste momento águias e leões deixam muitas projeções em aberto atendendo às especificidades da Liga portuguesa. Partindo do princípio de que nenhum dos emblemas lisboetas desperdiçaria mais pontos, o Benfica tanto poderá sair de Alvalade a dois pontos da liderança como a... 11, desprezando-se, claro, a possibilidade de um empate no choque de titãs.
Por outras palavras, João Pereira tem tudo para trabalhar e chegar descansado ao Natal, mas depois disso o tabuleiro muda de figuras e reserva verdadeiros testes de fogo à sua capacidade para lidar com a herança de Amorim e com a turbulência própria do mercado de Inverno. O crescente interesse dos milionários europeus nas pérolas sportinguistas pode virar a mesa e as contas do título de pernas para o ar, sobretudo no caso de o referido Hjulmand ser convidado a sair mais cedo, acompanhando os rumores que se têm intensificado em torno de Gonçalo Inácio.
À semelhança do que acontece com Viktor Gyökeres no ataque, Frederico Varandas não tem interesse nenhum em vender referências do meio-campo e da defesa, facilitando, quem sabe, a vida ao próximo diretor desportivo do Manchester City. Só que entre a vontade do presidente e a força imparável de quem cobre as cláusulas de rescisão vai uma grande distância, e até com isso João Pereira pode sofrer como ninguém e transformar-se na maior vítima das regras da janela de transferências.
Tão impiedosas como aquelas que ainda não o deixam ficar de pé e que há quatro anos já tinham obrigado Amorim a ficar sentado, cumprindo uma proibição que durou até 15 de janeiro de 2021. Nesse dia, Ruben constou da ficha do jogo com o Rio Ave como treinador principal. Aconteceu em Alvalade, numa sexta-feira.