Numa conferência de imprensa realizada na embaixada iraniana em Lisboa, Seyed Abbas Araghchi salientou que o Irão respeitará o acordo enquanto Israel também o fizer, afirmando que Teerão está pronto para qualquer cenário.
"Temos o direito de defender-nos e reservar-nos a este direito" se Israel voltar a atacar os interesses do Irão, sublinhou Araghchi.
O acordo de cessar-fogo entrou em vigor às 04:00 de hoje locais (02:00 em Lisboa) e é válido por 60 dias, após mais de um ano de combates entre o grupo xiita libanês pró-iraniano Hezbollah e Israel, que causaram milhares de mortos.
O Hezbollah começou a bombardear Israel a partir do sul do Líbano para apoiar o grupo extremista palestiniano Hamas, que atacou Israel em 07 outubro de 2023 e enfrenta, desde então, uma ofensiva israelita em Gaza.
Em setembro, Israel intensificou os bombardeamentos do Líbano, a que se seguiu uma invasão do sul do país vizinho.
"Sobre o cessar-fogo, cabe ao Governo libanês e à resistência do Hezbollah para decidir sobre isso. Fomos consultados por diferentes partidos sobre o cessar-fogo, mas sempre dissemos que, embora possamos ajudar, a decisão é do Hezbollah e do Governo libanês para fazer. E nós apoiamos qualquer decisão que eles tomem e isso é agora o caso", frisou o representante de Teerão.
E prosseguiu: "Se o Governo libanês e o Hezbollah estão felizes com o cessar-fogo, nós também estamos felizes e vamos apoiá-los. Sobre as coisas entre o Irão e o regime israelita, obviamente, reservamo-nos aos nossos direitos para reagir à guerra israelita e recente contra o Irão".
Confrontado com a questão se o Hezbollah sai enfraquecido no atual processo, Araghchi sublinhou que, apesar de todos os revezes e da morte de altos comandantes, o movimento xiita libanês manteve-se de pé.
"Reorganizaram-se e estão agora numa grande resistência no sul do Líbano, enfrentando forças israelitas. Considerando todos esses factos, acho que a principal razão pela qual Israel aceitou o cessar-fogo é por causa do desastre que constitui o grande número de baixas que tiveram ao enfrentar o Hezbollah", argumentou.
Perante os recentes ataques israelitas que visaram instalações militares iranianas, Seyed Abbas Araghchi frisou que tais manobras são "uma agressão" e que Teerão "tem todo o direito de se defender, de acordo com a lei internacional e com a Carta das Nações Unidas".
"Se o regime israelita quiser concentrar-se mais no Irão, pode tentar. Já planeou isso no passado. Mas, ao contrário dos israelitas, não queremos uma escalada na região, não queremos guerra, mas estamos preparados para ela", sustentou.
Segundo Araghchi, o Irão está também preparado para diminuir as tensões no Médio Oriente contra as "atrocidades" de Israel, que acusa de ser o único Estado a querer manter um conflito.
Questionado pelos jornalistas se o regresso do republicano Donald Trump à Casa Branca (presidência norte-americana) vai mudar alguma coisa no Médio Oriente, o chefe da diplomacia iraniana insistiu na ideia de que "a sabedoria tem de prevalecer".
"Espero que todos tentemos a diplomacia em vez do confronto. Provamos no passado que se o Irão for abordado pela língua do respeito, nós reagiremos de acordo. E se eles nos abordarem com a língua de ameaças, intimidação, avaliações, pressões, novamente nós reagiremos de acordo", afirmou.
Para Teerão, a Faixa de Gaza é hoje a causa principal de todos os problemas na região, tal como a Palestina foi sempre a causa principal de todas as dificuldades que a região enfrenta nos últimos 80 anos.
"As pessoas em Gaza estão a viver em condições adversas. Como disse a relatora especial da ONU (para os refugiados palestinianos), Francesca Albanese, há uma era colonial acontecendo em Gaza. O que é uma grande tragédia", realçou.
Sobre o alegado apoio iraniano à Rússia no conflito com a Ucrânia, o governante salientou a oposição de Teerão em relação ao conflito que é idêntico ao de Gaza, pois, na sua opinião, há um genocídio num país sobre o qual o Irão sempre apoiou uma política de integridade territorial.
"Essa foi a nossa política desde 2014, mesmo após a questão da Crimeia. Nós nunca reconhecemos a anexação da Crimeia. E continuamos a apoiar a supervisão territorial completa da Ucrânia", sustentou, admitindo, porém, que Teerão tem mantido uma cooperação militar com Moscovo, "cooperação que já é antiga".
"Não entregamos mísseis balísticos à Rússia. Mas temos de considerar que grupos independentes, com as suas próprias políticas, decidem sozinhos e implementam essas suas decisões sozinhos. E o Irão só os apoia. Eles não são 'proxies' [nome utilizado para designar grupos aliados que Teerão financia em vários países] do Irão, mas nossos amigos", concluiu Araghchi.
JSD // SCA
Lusa/Fim