
As eleições gerais da Gronelândia realizam-se esta terça-feira, apenas uma semana depois de Donald Trump ter reafirmado o interesse na ilha. O Presidente dos Estados Unidos convidou agora os habitantes da Gronelândia a juntarem-se aos Estados Unidos da América, numa postura bem mais conciliadora do que a de todos os comentários anteriores.
O movimento para a independência da Gronelândia em relação à Dinamarca, iniciado na década de 1970, ganhou impulso nos últimos meses.
O que quer a Gronelândia?
As relações entre a Gronelândia e a Dinamarca têm sido tensas, sobretudo depois de revelados os maus-tratos cometidos durante o domínio colonial. O interesse de Donald Trump no território fez com que a Dinamarca acelerasse os esforços de reconciliação.
As sondagens mostram que a maioria dos habitantes da Gronelândia apoia a independência, mas há uma divisão quanto ao momento e potencial impacto nos padrões de vida a que estão habituados.
O interesse de Trump abalou o status quo da ilha. Isso combinado com o crescente orgulho Inuit levou alguns dos 57.000 habitantes a olharem para as eleições desta semana como uma oportunidade histórica para libertar a Gronelândia da influência dinamarquesa.
Desde 2019, os políticos da Gronelândia falam no interesse de reforçar a cooperação e as relações comerciais com os Estados Unidos.
No entanto, o atual primeiro-ministro Mute Egede, que tem intensificado os esforços pela independência, salientou que a ilha não está à venda e que apenas o seu povo deve decidir o seu futuro.
Porque é que Trump quer a Gronelândia?
A localização estratégica e os recursos da ilha poderiam beneficiar os EUA. A Gronelândia situa-se ao longo da rota mais curta entre a Europa e a América do Norte, essencial para o sistema de alerta de mísseis balísticos dos EUA.
Os EUA manifestaram interesse em expandir a presença militar na ilha, incluindo a colocação de radares para monitorizar as águas entre a ilha, a Islândia e a Grã-Bretanha, que são uma porta de entrada para navios e submarinos nucleares russos.
A ilha, cuja capital Nuuk está mais próxima de Nova Iorque do que de Copenhaga, tem riquezas minerais, petróleo e gás natural, mas o desenvolvimento tem sido lento.
Questionado sobre o assunto, um funcionário da Casa Branca afirmou: "A Gronelândia tem uma enorme reserva de minerais de terras raras que vão impulsionar a próxima geração da economia americana."
Até agora, a economia da Gronelândia depende sobretudo da pesca, que representa mais de 95% das exportações, e dos subsídios anuais da Dinamarca, que cobrem aproximadamente metade do orçamento público.
No total, a Dinamarca gasta mil milhões de euros por ano na Gronelândia, ou seja, cerca de 17.000 euros por cada habitante.
Qual é a atual presença dos Estados Unidos na Gronelândia?
Os militares dos EUA mantêm uma presença permanente na base aérea de Pituffik, no noroeste da Gronelândia. Um acordo de 1951 com a Dinamarca estabeleceu o direito dos EUA se movimentarem livremente e construírem bases militares na Gronelândia, desde que a Dinamarca e a Gronelândia sejam notificadas.
Kristian Soeby Kristensen, investigador do Centro de Estudos Militares da Universidade de Copenhaga diz que historicamente, a Dinamarca tem autorizado a presença dos EUA porque não tem capacidade para defender a Gronelândia. Kristensen lembra também as garantias de segurança dada pelos EUA à Dinamarca através da NATO.
O investimento dos Estados Unidos no setor mineiro da Gronelândia tem sido muito limitado d. As empresas mineiras que operam na Gronelândia são maioritariamente australianas, canadianas ou britânicas.
Qual é o estatuto da Gronelândia?
A ilha, antiga colónia da Dinamarca, tornou-se formalmente um território do Reino Nórdico em 1953 e está sujeita à constituição dinamarquesa.
Em 2009, a ilha recebeu ampla autonomia de autogovernação, incluindo o direito de declarar a independência através de um referendo.
De acordo com a lei de 2009, o parlamento da Gronelândia, Inatsisartut, pode invocar uma disposição que obrigaria a Dinamarca e a Gronelândia a iniciarem negociações para alcançar a independência total. Depois, o povo da Gronelândia teria de aprovar a independência através de um referendo, um acordo de independência que exigiria também o consentimento do parlamento dinamarquês.
Pode Donald Trump comprar a Gronelândia?
Segundo Ulrik Pram Gad, investigador sénior e especialista no território, a ideia de comprar a Gronelândia baseia-se num mal-entendido do direito internacional e do princípio da autodeterminação, que dá aos povos o direito de escolher o seu próprio estatuto político.
Trump não descartou o uso de meios militares ou económicos para controlar a Gronelândia. O vice-Presidente JD Vance, em declarações à Fox News, rejeitou o uso da força militar.
E se a Gronelândia se tornasse independente?
Se a Gronelândia se tornasse independente, poderia optar por se associar e aos EUA sem se tornar território americano.
A ilha poderia formar uma chamada "associação livre" com os Estados Unidos que substituiria os subsídios da Dinamarca pelo apoio e proteção dos EUA em troca de direitos militares, um acordo semelhante ao das Ilhas Marshall, Micronésia e Palau.
Embora se sinta o desejo da Gronelândia quebrar a ligação com a Dinamarca, as sondagens mostram que os gronelandeses não querem num novo senhor colonial.
Com um modelo social de estilo nórdico, incluindo cuidados de saúde universais e educação gratuita, os habitantes da Gronelândia vão querer garantir a estabilidade económica antes de realizar um referendo para a independência.
E o que diz a Dinamarca?
Quando Donald Trump se ofereceu para comprar a ilha em 2019, no primeiro mandato na Casa Branca, a primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen rejeitou a ideia e classificou-a como "absurda".
Questionada sobre o renovado interesse de Trump, Frederiksen afirmou, em janeiro, que a Dinamarca precisava de cooperar estreitamente com os EUA, mas sublinhou que a Gronelândia é que deveria determinar o seu futuro.