
O Observatório de Violência Obstétrica (OVO PT) denunciou esta segunda-feira casos de recusas de atendimento de mulheres imigrantes por parte de profissionais de saúde, bem como de impedimento de acesso aos serviços por parte de seguranças dos centros de saúde.
Em comunicado, a organização diz que nas denuncias que tem recebido, as mulheres relatam, inclusive, que são fisicamente impedidas de aceder ao balcão de atendimento para se inscreverem nos centros de saúde e poderem ter o devido acompanhamento na gravidez e, posteriormente, no parto.
O OVO PT acredita que tais impedimentos sejam motivados na sequência dos projetos de lei aprovados em dezembro no parlamento relativos ao acesso de estrangeiros ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), que baixaram à Comissão de Saúde e não estão ainda em vigor.
No comunicado, a organização manifesta "profunda preocupação" relativamente ao acesso ao SNS, concretamente aos serviços ginecológicos e obstétricos, que envolvem a vigilância da gravidez, parto, interrupção voluntária da gravidez e planeamento familiar, pelas mulheres imigrantes (estrangeiras) em Portugal, independentemente de estarem em situação regular ou irregular/residente e irregular/não residente.
Alerta que os projetos de lei, se forem aprovados tal como estavam redigidos em dezembro e entrarem em vigor "vão excluir imigrantes cuja validade da autorização de residência tenha terminado, deixando muitos residentes sem cuidados de saúde".
Uma das propostas (do PSD e do CDS-PP) propõe que as pessoas estrangeiras em situação irregular e não residentes tenham de apresentar um comprovativo de cobertura de cuidados de saúde e a documentação considerada necessária pelo SNS, exceto em casos de urgência, e que, mesmo em situações urgentes, apresentar esses documentos posteriormente.
Já as duas iniciativas do Chega preveem que as pessoas estrangeiras, apátridas e migrantes sem situação legalizada, bem como requerentes de proteção internacional cujo pedido ainda não tenha sido deferido, tenham de pagar para aceder ao SNS, exceto em situações de emergência.
Uma delas determina ainda que os cidadãos estrangeiros não residentes paguem as taxas moderadoras ou os custos integrais dos atos médicos, inclusive em casos de urgência, em que há referenciação prévia pelo SNS ou internamento de urgência.
"Uma clara discriminação no acesso à saúde"
A organização lembra que o que está em vigor é que "todos têm acesso ao SNS" e cita a Lei de Bases da Saúde e o Decreto-Lei n.º 52/2022, recordando que, além dos cidadãos portugueses, podem igualmente aceder ao SNS os cidadãos nacionais de Estados-membros da União Europeia ou equiparados, nacionais de países terceiros ou apátridas, com residência permanente ou em situação de estada, como férias, ou residência temporárias em Portugal.
"Também as pessoas estrangeiras requerentes de proteção internacional - assim como as respetivas famílias - e migrantes com ou sem a respetiva situação legalizada, nos termos do regime jurídico aplicável, têm direito ao acesso ao SNS", insiste.
O OVO PT diz ainda que Portugal se congratula por ter tido um crescimento do PIB acima do valor médio da UE, mas que "tal só é possível devido ao trabalho das pessoas imigrantes que escolheram Portugal como a sua nova residência".
A organização considera que as denúncias recebidas "relatam situações de violação da lei e que a falta de sanções prejudica a seriedade do ordenamento jurídico português" e expressa a "maior preocupação" com o "impacto negativo" que os projetos de lei podem ter na saúde pública se forem aprovados, "bem como na integração das pessoas migrantes na sociedade portuguesa".
Entende que os projetos de lei representam "uma clara discriminação no acesso à saúde, violando os princípios da igualdade e do acesso universal à saúde, aumentando o risco de mortalidade materna e infantil para populações estrangeiras/imigrantes".