
Em que consiste o RIPA – Resposta Integrada para as Perturbações do Comportamento Alimentar?
O RIPA é um Hospital de Dia dedicado ao tratamento das doenças do comportamento alimentar. É um programa de tratamento intensivo, que requer frequência diária na unidade, onde decorrem múltiplas atividades de cariz psicoterapêutico e reabilitativo, destinadas a trabalhar a relação que os doentes têm com a comida e com o seu corpo. A opção por um Hospital de Dia acaba por permitir evitar alguns internamentos a tempo integral, com o afastamento da família e de casa que estes implicam. Como tal, é uma solução menos disruptiva do quotidiano e com maior ênfase na faceta psicoterapêutica do tratamento, sem, no entanto, descurar a reabilitação nutricional que é necessária em muitos dos utentes que nos procuram.
Em ano e meio de atividade, quais os resultados?
Até hoje, a equipa conseguiu prevenir o agravamento, evitar a necessidade de internamento hospitalar, ou mesmo levar à remissão da doença, em 90% das 30 mulheres que acompanhou, entre os 14 e os 60 anos de idade. Permitiu reduzir, em 80% dos casos, os comportamentos compensatórios (recurso a laxantes, diuréticos e vómito autoinduzido). A análise dos dados de acompanhamento, após a alta clínica,, regista que 90% das utentes que frequentaram o programa regressaram a uma atividade laboral e/ou académica regular.
“A mais prevalente é a perturbação de ingestão alimentar compulsiva (vulga compulsão alimentar), que pode afetar até 3% da população ao longo da vida”
Quais as perturbações do comportamento alimentar mais prevalentes e quem é mais afetado?
As perturbações do comportamento alimentar afetam duas vezes mais o sexo feminino do que o masculino e têm, frequentemente, início na adolescência ou no início da idade adulta. A mais prevalente é a perturbação de ingestão alimentar compulsiva (vulga compulsão alimentar), que pode afetar até 3% da população ao longo da vida. A anorexia nervosa e a bulimia nervosa têm menor prevalência (cerca de 1% da população ao longo da vida), mas podem trazer repercussões mais graves para a saúde física, chegando a pôr em risco a vida dos utentes.
O que contribui para este problema de saúde? Existe forma de o prevenir?
Sabemos hoje que, muito embora não se deva descurar a importância dos ideais de beleza e da pressão que as redes sociais vão exercendo, há uma grande importância da suscetibilidade genética para a doença. Para além disso, fatores como o isolamento social, o bullying e a existência de outros problemas de saúde mental podem contribuir significativamente para o aparecimento destas patologias.
A prevenção destas doenças deverá sempre basear-se no fomentar de uma relação tão saudável quanto possível com a alimentação e com o corpo. As famílias devem ter presente que fazer as refeições em conjunto, todos sentados à mesa, é extremamente importante para uma vivência saudável da alimentação. Deixar que nasçam tabus sobre grupos de alimentos (como os hidratos de carbono ou as gorduras), ter pais que andam em dietas eternas, ou ouvir constantemente comentários pejorativos sobre o peso ou sobre o corpo (do próprio ou de terceiros) são, naturalmente, fatores que podem predispor e agravar alterações patológicas do comportamento alimentar.
“Esperamos que no futuro o RIPA consiga chegar a mais utentes, seja pela maior divulgação do nosso projeto, seja pelo estabelecimento de parcerias que tornem este tratamento mais acessível”
A que sinais se deve estar atento para que se peça ajuda numa fase precoce?
De facto, é importante saber identificar sinais precoces da existência de um problema para atuar de forma mais rápida e eficaz. São alguns exemplos disso:
– Alterações rápidas do peso ou forma corporal;
– Saltar refeições;
– Omitir por completo grupos de alimentos, como hidratos de carbono ou gorduras;
– Pesagem diária (ou até várias vezes por dia);
– Começar a pesar os alimentos que se consome;
– Aumento brusco da atividade física;
– Demorar mais tempo a fazer a refeição e, em particular, quando se verificam rituais na forma de comer (ex.: comer grão a grão de arroz, comer metodicamente um tipo de alimento de cada vez).
Quais os objetivos do RIPA para o futuro?
Esperamos que no futuro o RIPA consiga chegar a mais utentes, seja pela maior divulgação do nosso projeto, seja pelo estabelecimento de parcerias que tornem este tratamento mais acessível para as famílias. Ao longo deste ano e meio de funcionamento aprendemos muito e pretendemos continuar a inovar e melhorar o programa em função da experiência acumulada.
Maria João Garcia
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