O Tratado de Proibição das Armas Nucleares (TPAN) "não se constitui como a resposta" à necessidade de alcançar um mundo livre de armas nucleares, "uma vez que não toma em conta as legítimas preocupações de segurança de muitos países e a conjuntura internacional", afirmou Augusto Santos Silva, em entrevista ao jornal 'online' SeteMargens.
"Além disso, carece de significativo valor prático ao nível dos seus objetivos e implementação, uma vez que foi negociado à revelia de todos os países que possuem armas nucleares", acrescentou o ministro, apontando o facto de o tratado não estabelecer "medidas credíveis e eficazes de fiscalização do seu eventual cumprimento".
Aprovado na Assembleia Geral da ONU em julho de 2017, o Tratado de Proibição das Armas Nucleares entra em vigor às 00:00 de sexta-feira, depois de ter sido ratificado pelos necessários 50 países.
Assume-se como o primeiro acordo internacional que proíbe exaustivamente as armas nucleares, com o objetivo de levar à sua eliminação total, mas não foi assinado por Portugal.
"Portugal partilha o objetivo último de se alcançar um mundo livre de armas nucleares", admitiu Santos Silva, ressalvando, no entanto, que "tal como um número considerável de outros países, incluindo mais de metade dos nossos parceiros na UE e praticamente a totalidade dos países não nucleares da NATO, acreditamos que tal só poderá ser alcançado de forma gradual e progressiva e, naturalmente, com o envolvimento dos países nucleares".
Além disso, acrescentou o ministro, "Portugal continua a ser membro da NATO, uma aliança com capacidade nuclear que no seu conceito estratégico afirma que continuará a dispor dessa capacidade enquanto as armas nucleares continuarem a existir".
Quando foi aprovado pela ONU, o TPAN foi considerado "uma decisão histórica", sobretudo por ter acontecido num quadro de posições tomadas por líderes políticos e apelos influentes para um mundo sem armas nucleares, explicou o professor e investigador de Relações Internacionais Luís Moita num artigo publicado no mesmo jornal 'online'.
"A recusa do armamento nuclear já não é só um imperativo moral ou humanitário, mas decorre da própria inteligência estratégica", refere o investigador, considerando "incompreensível" que Portugal "se submeta acriticamente às conveniências da Aliança Atlântica e se coloque entre aqueles que não ratificam o Tratado, quando é claro que isso se impõe por razões éticas e técnicas".
Embora admita que já foram assinados vários acordos regionais para não proliferação de armas nucleares, Luís Moita sublinha que este tratado é "inteiramente novo" porque "não se limita a compromissos regionais nem a propósitos de redução, mas a proibir liminarmente a existência de armas nucleares".
Um objetivo que, na sua opinião, justifica "que tenham recusado o tratado tanto as potências nucleares como os países membros da Aliança Atlântica", baseando-se no argumento de que "o armamento nuclear funcionaria como força de dissuasão, desencorajando guerras de envergadura".
Uma ideia que o investigador classifica como "insustentável", já que "se as armas nucleares existissem para não serem usadas" não haveria explicação para "os investimentos colossais na sua produção e as sofisticadas doutrinas militares que preveem a sua utilização".
"Abolir as armas nucleares é uma responsabilidade da nossa geração", sublinha o especialista de Relações Internacionais, considerando que "seria imperdoável" se a entrada em vigor do TPAN ocorresse "na indiferença do mundo político, no silêncio das comunidades religiosas, no esquecimento pela imprensa e no alheamento da opinião pública".
PMC // EL
Lusa/Fim