António Lacerda Sales recusou esta quarta-feira qualquer "interferência pessoal ou política" no caso das gémeas luso-brasileiras, depois de a comissão de inquérito ter concluído que o antigo secretário de Estado da Saúde deu instruções para a marcação de uma primeira consulta.

"Rejeito, de forma categórica, qualquer interferência pessoal ou política, por iniciativa própria ou a pedido, na marcação de consultas ou na prescrição de medicamentos. Não marquei nem solicitei, direta ou indiretamente, a marcação de consulta ou a administração de qualquer medicamento às duas bebés mencionadas."

Num comunicado divulgado esta quarta-feira, Lacerda Sales sublinhou que não exerceu "qualquer tipo de influência que pudesse favorecer essas crianças no acesso aos cuidados de saúde" e lamentou que o assunto tenha sido alvo daquilo que considera ser "um aproveitamento político na Assembleia da República, protagonizado pelo Chega, que tenta desviar a atenção dos verdadeiros desafios que o nosso Serviço Nacional de Saúde enfrenta".

"Lamento, igualmente, que forças políticas como o PSD e o CDS se tenham associado a esta tentativa de manipulação política, em vez de contribuírem para a credibilização das instituições junto dos portugueses."

"Deu orientações à sua secretária pessoal para assegurar a marcação da primeira consulta"

Os deputados aprovaram na terça-feira, na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com um dos medicamentos mais caros do mundo, uma proposta de PSD e CDS-PP para o relatório final que conclui que Lacerda Sales "deu orientações à sua secretária pessoal, Carla Silva, para assegurar a marcação da primeira consulta junto do serviço de neuropediatria do CHULN, E.P.E".

"Carla Silva cumpriu a instrução dada, realizando os contactos necessários (via telefónica e por e-mail, conforme acervo documental) para assegurar o início do processo destinado à marcação da consulta", estabelece a conclusão aprovada.

Esta conclusão foi aprovada com os votos favoráveis dos partidos proponentes, do Chega e do PAN, e mereceu a abstenção de BE, PCP e Livre e o voto contra de PS e IL.

Rejeitada foi uma proposta de alteração do PS que não implicava diretamente Lacerda Sales e indicava apenas que a "Secretaria de Estado da Saúde sinalizou o caso clínico das crianças à chefe do departamento de pediatria do Hospital Santa Maria, através de correio eletrónico".

Casa Civil do Presidente da República com "intervenção especial" mas sem ilegalidade

As conclusões finais da comissão de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras apontam para uma "intervenção especial", sem ilegalidade, da Casa Civil do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

"Existiu uma intervenção especial pela Casa Civil da Presidência da República, embora não tenha sido identificado qualquer tipo de ilegalidade. Ainda assim, não conseguimos identificar, com total certeza, contactos realizados entre Maria João Ruela e as diversas instituições hospitalares."

Esta ideia estava contida originalmente no corpo do relatório alternativo apresentado pelo PSD/CDS mas não foi refletida nas conclusões propostas por estes partidos. O PS decidiu apresentá-la como conclusão, conseguindo a aprovação com os votos favoráveis do PS, e a abstenção do PSD, CDS, IL, BE, PCP, Livre e PAN, e o voto contra do Chega.

Relatório da CPI deve ser debatido esta quarta-feira

Uma outra conclusão aprovada, proposta pelo PS, refere que "as diligências levadas a cabo por Nuno Rebelo de Sousa [filho do Presidente da República] junto dos órgãos de soberania são a origem deste processo, sem nunca revelar o real motivo da sua atuação".

Este relatório é esta quarta-feira debatido e votado em plenário da Assembleia da República, o último da legislatura.

A comissão de inquérito rejeitou o relatório preliminar elaborado pela relatora, Cristina Rodrigues (Chega), que acusava o Presidente da República de "abuso de poder".


- Com Lusa