A Venezuela acusou terça-feira os Estados Unidos da América de deportarem migrantes venezuelanos para que sejam usados para mão de obra escrava em El Salvador a troco de financiamento de um sistema penitenciário repressivo.

"Roubam-lhes os telemóveis, o dinheiro, os veículos, roubam-lhes os bens das suas casas, arrebatam os documentos e, para piorar a situação, agora venderam-nos a Nayib Bukele [Presidente de El Salvador] para que os utilize como mão-de-obra escrava", denunciou o presidente da Assembleia Nacional (parlamento).

Jorge Rodríguez falava no Palácio Federal Legislativo, em Caracas, quando recebia centenas de venezuelanos que marcharam para condenar a deportação de compatriotas, pelas autoridades norte-americanas, e exigir que lhes sejam respeitados os seus direitos.

Gaby Oraa

O parlamentar explicou que o acontecido "viola todas as leis internacionais, o direito internacional, a Carta das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos do Homem e a Declaração Universal dos Direitos das Crianças".

"Estamos a voltar aos tempos da escravatura"

Rodríguez questionou "como é possível que 200 homens e mulheres venezuelanos de bem, tenham sido levados para um país estrangeiro como El Salvador", sem conhecerem El Salvador e sem terem cometido qualquer tipo de crime, nem em El Salvador nem nos EUA.

"Eles levaram-nos. A Nayib Bukele deram 6 milhões de dólares e com o trabalho dos venezuelanos, ele vai financiar o seu sistema penitenciário repressivo. Por outras palavras, estamos a voltar aos tempos da escravatura, ou seja, exatamente ao que os nazis fizeram com os judeus e os comunistas."

Rodríguez denunciou que o ocorrido "é um sequestro" e anunciou que o Governo da Venezuela não descansará até resgatar os venezuelanos deportados.

"Iremos onde tivermos de ir (...) Já o Presidente Nicolás Maduro está a estabelecer contactos, um a um, com chefes de Estado, de Governo, com organizações multilaterais, de direitos humanos. E a todos manifestando a nossa posição firme e indeclinável."

El Salvador ofereceu-se para receber criminosos deportados dos EUA

No domingo, o Presidente de El Salvador, Nayib Bukele, anunciou a chegada de 238 alegados membros do grupo criminoso venezuelano Tren de Aragua e da Mara Salvatrucha (MS-13), transferidos para o Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT) ao abrigo de um acordo com Trump.

No sábado, os EUA expulsaram 261 imigrantes em dois voos para El Salvador e Honduras que partiram do Texas.

Em fevereiro, o Presidente Donald Trump classificou o Tren de Aragua, uma organização criminosa da Venezuela, e o MS-13, um gangue com origem em Los Angeles em 1980, como "organizações terroristas globais".

Trump invocou lei do século XVIII para deportar pessoas

No sábado, um tribunal tentou travar a deportação de imigrantes que o Governo norte-americano decidiu deportar, mas as autoridades dos EUA alegaram que não receberam a determinação judicial a tempo de impedir a deportação em curso.

Trump invocou a lei de 1798, que não era utilizada desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), para agilizar as deportações de membros do gangue internacional.

A imprensa venezuelana publicou as declarações de familiares de alguns venezuelanos, negando que tenham vínculos com o Tren de Aragua. Denunciaram que alguns deles foram detidos e deportados apenas por terem tatuagens no corpo.

Tren de Aragua acusado de diversos crimes, incluindo tráfico de seres humanos

A organização não-governamental Transparência Venezuela, o Tren de Aragua tem mais de quatro mil membros e conseguiu expandir-se para outros países, como Colômbia, Peru, Brasil, Chile, Equador, Bolívia e Costa Rica.

O grupo, que surgiu em 2013, possui armas de guerra e uma estrutura hierárquica definida. O Tren de Aragua teve origem nos sindicatos de trabalhadores da construção de um projeto ferroviário que ia ligar o centro-oeste do país e nunca foi concluído.

O Tren de Aragua está acusado de crimes relacionados com mineração ilegal, tráfico de droga, de seres humanos e armas, contrabando de sucata metálica, extorsão, sequestro, homicídios e roubos.