A existência de goleadores numa equipa é fundamental para uma boa classificação ao final da temporada. É sempre conveniente que um plantel conte com vários elementos com uma boa capacidade de finalização, mas a presença de um especialista nesse aspeto é essencial. Quando analisamos as grandes transferências do mercado de transferências, a presença de elementos do último terço forma a maioria. Podemos olhar para o próprio exemplo da Primeira Liga. Vangelis Pavlidis chegou ao Benfica por 18 milhões de euros, enquanto que Samu Aghehowa custou 15 milhões de euros ao FC Porto, por metade do passe. O próprio Conrad Harder, que não era a primeira opção do Sporting para a posição de ponta de lança, teve um preço de 19 milhões de euros.

As equipas que querem ganhar sabem que precisam de marcar golos ao longo de toda a temporada, prevendo de antemão que todos os jogadores passam por crises e existirão períodos em que a veia goleadora não está tão apurada (veja-se o caso de Samu Aghehowa em 2025).

Tal como em Portugal, em Espanha não é diferente. Na maioria dos casos, a figura de proa dos planteis são os avançados, mesmo que não se tratem de pontas de lança puros, mas sim avançados interiores, segundos avançados ou até mesmo extremos. Barcelona, Real Madrid e Atlético de Madrid têm nas suas frentes de ataque os nomes mais valiosos, além de planteis relativamente equilibrados (isto colocar na equação as lesões). É na La Liga que está o caso que vamos analisar neste artigo.

Existem vários clubes que não estão a fazer uma boa temporada no campeonato espanhol. O Valência é possivelmente a maior deceção, embora as expetativas não fossem muito altas desde o começo, dado o estado atual da instituição. Esperava-se algo mais do Real Bétis, que está a entrar num final de ciclo, podendo vir a trocar de treinador no final da época. Alguns podiam esperar mais do próprio Girona, depois da magnifica época de 2023/24, ou do projeto de Claudio Giráldez no Celta de Vigo (que é claramente a longo prazo).

A Real Sociedad insere-se neste lote de equipas que estão a dececionar. O conjunto do Anoeta encontra-se na décima primeira posição, com 31 pontos, a quatro do sexto posto, ocupado pelo surpreendente Rayo Vallecano, mas a 10 pontos do quinto classificado, o Villarreal.

O nível pedido à turma de San Sebastián era semelhante ao da equipa de Marcelino García Toral e ao do Athletic (quatro lugar, 45 pontos, a seis da liderança da La Liga). Porém, a Real Sociedad não conseguiu acompanhar desde o começo estas duas equipas e está mergulhado no meio da tabela, ainda com claras chances de ocupar um posto europeu (está igualmente nas meias finais da Taça do Rei). Estão em ritmos diferentes.

A má temporada do plantel orientado por Imanol Alguacil deve-se, em grande parte, à falta de um artilheiro. Ao compararmos com as duas equipas referidas, a diferença é gritante:

  • Real Sociedad: 20 golos em 24 jornadas
  • Villarreal: 47 golos em 24 jornadas
  • Athletic: 37 golos em 24 jornadas

Recordar que a turma de Bilbao conta com um autoimposto condicionante no mercado de transferências, que os seus vizinhos não têm. O Athletic tem a falta de um avançado goleador, mas Oihan Sancet destaca-se neste capítulo, com 13 golos (no total das competições). Ainda assim, o conjunto do San Mamés foi ao mercado tentar reverter a situação, adquirindo Maroan Sannadi ao Deportivo Alavés, depois de meia época de empréstimo no Barakaldo, onde se exibiu a alto nível (11 golos em 22 jogos).

Do lado txuri-urdin, o cenário está longe de ser positivo. Os melhores marcadores na La Liga são Takefusa Kubo e Mikel Oyarzabal, com quatro tentos cada um. O espanhol até tem atuado várias vezes como ponta de lança, mas não está a apresentar a forma de outrora, além de ser um extremo de origem (e que precisa de jogar de frente para o jogo). A Real Sociedad optou por não contratar ninguém em janeiro para resolver a sua situação.

O problema da Real Sociedad com a falta de um avançado não é de hoje, nem de ontem. A direção decidiu investir em peso num ponta de lança no verão passado. Orri Óskarsson chegou ao Anoeta por 20 milhões de euros, depois de se ter destacado no Copenhaga. Trata-se de um jovem de 20 anos que se antevia que teria um período de habituação complicado. A Liga Dinamarquesa está longe do nível da La Liga e pedir ao islandês um impacto imediato era algo sem sentido. Ainda assim, esperava-se um pouco mais. Marcou seis golos em 25 jogos esta temporada e ainda não conseguiu convencer os adeptos, embora se reconheça que existe potencial. O que se pedia a Roberto Olabe (diretor desportivo) era um nome mais experiente, com a capacidade de fazer a diferença e de permitir a Mikel Oyarzabal regressar à posição de extremo. Borja Mayoral foi associado à Real Sociedad por diversas ocasiões, mas acabou por ficar no Getafe, depois de ter feito uma temporada estrondosa em 2023/24 (com uma lesão que o impediu de ir ao Euro 2024). Sem dúvida que tinha sido o nome ideal, com um custo semelhante ao de Orri Óskarsson.

Na última temporada a turma de Imanol Alguacil contou com vários pontas de lança: Umar Sadiq, André Silva e Carlos Fernández. O hoje em dia avançado do Valência (cedido pela Real Sociedad) foi identificado em 2022 como um jogador que poderia ocupar o lugar de indiscutível por várias épocas, mas uma lesão grave afetou-lhe a carreira, estando praticamente um ano de fora. Em 2023/24 marcou apenas três golos em 36 jogos, sendo que em 2024/25 não fez nenhum pela equipa de San Sebastián.

Já André Silva também ficou abaixo do esperado, numa carreira aquém das expetativas. Fez quatro tentos em 26 encontros, insuficiente para a Real Sociedad decidir adquiri-lo em definitivo, regressando à Bundesliga. Carlos Fernández sofreu do mesmo mal que Umar Sadiq, ficando a época 2021/22 totalmente de fora devido a uma rotura dos ligamentos cruzados. O espanhol desde aí apenas conseguiu marcar quatro golos em toda a sua carreira, algo inesperado para quem o assistiu nos seus tempos áureos por Granada e Deportivo de La Coruña. Em 2024/25 está emprestado ao Cádiz da La Liga 2. A mudança de escalão não lhe está a fazer bem: 0 golos.

O último grande nome que passou pela frente de ataque da Real Sociedad foi Alexander Isak, de quem os adeptos guardam bastantes saudades. O sueco foi contratado ao Borussia Dortmund por 15 milhões de euros e valeu todos os cêntimos pagos, saindo por 70 milhões para o Newcaslte em 2022 (Umar Sadiq era o seu sucessor). Pela turma de Imanol Alguacil marcou 43 golos em três temporadas, além de ajudar no jogo coletivo, sendo um elemento claramente diferenciador, algo que está a demonstrar na Premier League, contando apenas com 25 anos de idade.

Alexander Sorloth fez a diferença no País Basco, embora estivesse cedido pelo RB Leipzig. Depois de 16 golos em 2022/23, o norueguês partiu para o Villarreal, desta vez em definitivo, confirmando a sua veia goleadora pela Comunitat Valenciana, levando a que o Atlético de Madrid o contratasse por 32 milhões de euros no verão.

Willian José também foi um avançado que fez vibrar as bancadas do Anoeta, principalmente entre 2016 e 2020, acabando por ter sucesso em seguida no Real Bétis. Porém existe uma outra figura que deixa saudades pelo País Basco: Imanol Agirretxe. O ponta de lança fez toda a sua formação na Real Sociedad, mas teve que se retirar em 2018, depois de nunca ter chegado a recuperar totalmente de uma lesão no joelho que o afetou durante 2015/16. O avançado levava nessa temporada 13 golos marcados em 16 encontros e era um dos líderes do balneário, com a sua ausência a afetar todo o plantel. Podia não ser um matador (os números ao longo da sua carreira comprovam este ponto), mas era uma ótima segunda linha, algo que a equipa não tem tido nos últimos anos.

Não parece existir solução para a falta de golos na equipa B. O ponta de lança habitual é Ekain Orobengoa, que leva apenas três golos. O melhor marcador da turma secundária é Mikel Goti (nove golos), que trocou o San Mamés pelo Anoeta em 2023, mas é um extremo. Assim sendo, a direção desportiva terá que tomar uma decisão até ao verão: investir num novo avançado ou continuar a aposta em Órri Oksarsson, com tudo o que essa aposta acarreta.

A Real Sociedad tem Jon Karrikaburu emprestado ao Racing Santander. O avançado já foi considerado a maior promessa do Zubieta, mas tem mostrado algumas dificuldades na passagem para sénior. Pela turma de José Alberto López leva cinco golos e quatro assistências em 28 partidas, naquela que tem sido a sua melhor época desde 2021/22, quando ainda estava na equipa B do conjunto basco.

Roberto Olabe está de saída do cargo de diretor desportivo e a espinhosa missão de resolver o tema caberá a Erik Bretos, que juntamente com Imanol Alguacil terão que colocar um ponto final nesta crise. O dirigente foi responsável de trazer para San Sebastián nomes como os de Alexander Sorloth ou Alexander Isak.

A questão que se coloca neste ponto é saber quanto capital se poderá investir num novo avançado. Há que medir os riscos e ter em conta que Orri Óskarsson custou 20 milhões de euros e terá que ser valorizado. É muito complicado encontrar boas oportunidades de mercado na posição de ponta de lança, já que é dos postos mais encarecidos. Nenhum clube quer perder o seu goleador de serviço e todos querem ter um. Há nomes interessantes na própria La Liga como Vedat Muriqi ou Ante Budmir, mas seriam investimentos sem retorno, dada a idade dos avançados de Mallorca e Osasuna, respetivamente.

Na La Liga 2 o elemento que mais se destaca é Luis Suárez, mas o Almería não quererá perder a sua referência, sendo que o colombiano mostrou-se sempre irregular nas temporadas em que esteve na La Liga. Joaquín Panichelli está em grande no surpreendente Mirandés (26 jogos, 13 golos) e conta com contrato válido com o Deportivo Alavés. Porém, que garantias dá o argentino a uma equipa que luta por objetivos altos como a Real Sociedad? Esta é a sua primeira grande temporada, aos 22 anos.

A falta de um ponta de lança não é o único problema da Real Sociedad. O plantel perdeu nomes importantes no verão. Robin Le Normand rumou ao Atlético de Madrid e Mikel Merino assinou pelo Arsenal. Se o central foi bem substituído por Nayef Aguerd (emprestado pelo West Ham), o médio ainda não tem um sucessor definido, sendo esse um dos principais problemas para a equipa técnica em 2024/25 e que poderá levar a uma investidura no mercado de verão. O projeto da Real Sociedad pode inclusivamente estar a precisar de um pequeno abanão, porque as semelhanças com o caso do Real Bétis (que promete uma segunda parte de temporada em crescendo) são mais do que muitas.

Erik Bretos terá um verão cheio de trabalho, mas a sua prioridade, além de não perder peças importantes (a saída de Martín Zubimendi parece ser um facto consumado), terá que ser resolver a questão do ponta de lança. Uma equipa que luta pelo acesso à Europa League, com ambição de chegar inclusivamente a um quarto lugar, tem que contar com um goleador, que neste caso possa encaixar nas ideias de Imanol Alguacil (que não são convidativas a qualquer tipo de ponta de lança), que parece ser eterno.