
A questão é quase tão velha como o Mundo: quem apareceu primeiro, a galinha ou o ovo? Transportando esta dúvida existencial para o ‘futebolês’, será verdade que uma equipa joga o que a outra a deixa jogar, ou é a força de quem se apresenta dominador e assertivo a condicionar a prestação do adversário? No caso do Sporting-Moreirense, a ideia que ficou foi a de que o conjunto de Moreira de Cónegos não estaria à espera de um início tão forte, intenso e pressionante do Sporting, e mostrou-se praticamente durante toda a metade inicial atarantada perante tanta dificuldade com que tinha de se haver. Os cónegos, muito provavelmente, pagaram o preço de se terem apresentado em Alvalade com dois avançados, Alan e Maranhão e uma linha de quatro demasiado permeável no meio-campo, que obrigou a defesa e o guarda-redes a trabalhos forçados.
Hoje em dia, defrontar o Sporting não é nenhuma ciência oculta e o treinador italiano da equipa de Moreira de Cónegos foi pouco arguto ao dar a Gyokeres o espaço de que o sueco tanto gosta, deixando demasiadas vezes Marcelo, que não prima pela velocidade, em situações de um-contra-um com o bombardeiro nórdico. Quando se cometem erros de avaliação deste calibre, o preço a pagar é geralmente elevado. E para os cónegos só não foi mais pesado o regresso ao Minho porque o Sporting, a partir do 3-0, levantou o pé do acelerador, deixou de viajar pelo jogo em classe executiva e transferiu-se para a turística, preferindo controlar em vez de ferir, de olhos postos no que falta desta época.
ENTRADA CANHÃO
Ainda os jogadores do Moreirense estavam a admirar a belíssima moldura humana de Alvalade e já Viktor Gyokeres invadia a direita da defesa minhota e assistia Trincão, que só não abriu o ativo por ter sido pouco lesto na conclusão; aos três minutos foi Trincão a assistir Catamo, que falhou o golo duas vezes seguidas; aos sete Geny Catamo obrigou Kewin a boa defesa. Mas tantas vezes o cântaro foi à fonte que acabou por partir-se, e o golo de Gyokeres aos 12 minutos não causou surpresa a ninguém.
O Sporting, graças a uma pressão asfixiante, que envolveu, sem exceções, o coletivo, deu um sufoco épico no Moreirense, que não conseguia ter bola, muito menos era capaz de chegar com perigo às imediações de Rui Silva. A agressividade de Hjulmand e Debast (cada vez mais confortável a meio-campo) davam o mote na recuperação do esférico, e a capacidade para desmontar adversários de Gyokeres mostrava o caminho das redes de Kewin. Aos 20 minutos, o Sporting já tinha chegado nove vezes com perigo à baliza dos cónegos e tinha 70 por cento de posse de bola!
O segundo golo dos leões não podia ser mais emblemático da história que tem vindo a ser contada: aos 25 minutos, Ofori perdeu para Debast que entregou a Trincão, que meteu em Gyokeres. Este, com uma bomba tipo Mokuna, o fura-redes que marcou época no Sporting especialmente na época de 1954/55, já lá vão sete décadas, bateu inapelavelmente Kewin.
Até ao intervalo os leões mantiveram o garrote bem apertado em torno do pescoço do Moreirense, que apenas procurava continuar a respirar, à espera de sobreviver a tanto Sporting, que acabou por ir para intervalo com menos do que aquilo que tinha justificado. O jogo de futebol que que se pretendia um diálogo, não tenha passado de um monólogo.
O GOLO E O SUSTO
No segundo tempo, Bacci tentou dar mais qualidade técnica ao meio-campo (Ofori por Ivo), e o Moreirense conseguiu, até, aos 50 minutos, o seu primeiro remate enquadrado, por Benny. Mas logo a seguir Gyokeres, de livre direto - outra ‘Mokunada’ com a bola a entrar pelo lado do guarda-redes – fez o 3-0 que parecia ser sentença final na partida. Engano. O futebol é um ‘bicho’ esquisito (quem viu o Manchester United-Lyon na quinta-feira que o diga...) e aos 56 minutos Cédric respondeu com um bom cabeceamento a um cruzamento bem tirado, da esquerda, por Frimpong e fez o 3-1. Não pode dizer-se que Alvalade tenha tremido com esta aproximação dos Cónegos, mas apanhou um susto valente quando, quatro minutos volvidos, Maranhão surgiu nas costas de Quaresma para cabecear, tirando tinta ao poste. Este minuto 60 terá sido dos mais importantes do jogo porque o Sporting, que baixara intensidade a partir do 3-0, passou a estar mais alerta, embora nunca chegasse aos níveis de pressão da primeira parte, preferindo um registo mais pausado e uma defesa à zona.
Da dança das substituições nasceu maior equilíbrio (ao intervalo o Sporting tinha 67 por cento de posse bola e terminou o jogo com 59), Bacci refrescou o meio-campo com Jorquera e o ataque com Assué, enquanto que Rui Borges primeiro tirou Quenda, passou Catamo para a direita e fez entrar Pedro Gonçalves (que não jogava em Alvalade desde os 4-1 ao City) e trocou Quaresma por Saint-Juste, reforçando a profundidade da defesa leonina. O treinador do Sporting guardou para mais tarde (82), já depois dos cónegos chamarem Antonisse para o lugar de Frimpong, três mudanças que gelaram o jogo: Esgaio foi para o lado de Hjulmand, reforçar a capacidade de pressão do meio-campo; Fresneda foi para direita (saiu Trincão e subiu Catamo no terreno) e Matheus Reis foi cumprir a missão que vinha a ser desempenhada por Maxi. Foi assim que um Sporting mais equilibrado e pragmático terminou um jogo onde, durante a primeira parte, teve momentos de brilhantismo.
Finalmente, Gyokeres: está para o Sporting como o Nilo está para o Egito (o historiador e geógrafo grego Heródoto - nascido em 485 A.C. - ficou famoso sobretudo pela frase «o Egito é um dom do Nilo»). Mais palavras para quê?