Caro Presidente Jorge Nuno Pinto da Costa,
Antes de me focar no conteúdo principal desta carta, desejo-lhe toda a sorte do mundo no frágil momento em que atravessa e que ainda tenha muito tempo disponível para ver o FC Porto continuar a triunfar, agora sobre a égide da direção de André Villas-Boas.
Devo dizer-lhe que o seu novo livro, editado pela Contraponto, assenta-lhe muito mal.
O livro é uma panóplia de contradições e revela um ressabiamento excessivo pelo facto de ter perdido de forma esmagadora as eleições de abril de 2024.
Fica-lhe mal “cuspir” em Sérgio Conceição depois deste ter sido o principal responsável por ter mantido o Presidente na “cadeira de sonho” juntamente com a turma de incompetentes que o acompanhou ao longo dos últimos anos de presidência. É injusto culpar Conceição pelo descalabro financeiro do clube e pela necessidade em vender talentos geracionais da equipa a preço de saldo. Foi Sérgio Conceição que bateu recordes pagos em comissões a agentes que gravitam em torno do FC Porto? Foi Sérgio Conceição que aumentou a despesa com a administração do clube?
Pelo contrário, Presidente Jorge Nuno Pinto da Costa. Foi Sérgio Conceição que voltou a colocar o clube na rota dos títulos mesmo com todas as limitações financeiras. Foi também o responsável, mesmo com um orçamento inferior aos dos rivais, que quebrou um jejum de quase cinco anos sem troféus. Foi também Sérgio Conceição que valorizou ativos que ajudaram o clube sair do sufoco financeiro enquanto que a administração, liderada por si, continuava a auferir rendimentos estratosféricos para a realidade do futebol português e do clube.
Não me interprete mal. Sérgio Conceição está longe de ser um santo no meio desta história. Sobretudo no que toca à polémica renovação. O Presidente tinha razão em não querer renovar com Sérgio Conceição após a eliminatória contra o Inter de Milão. A razão estava do seu lado, pelos motivos errados. Por um ato de desespero, voltou atrás e quis renovar a dois dias das eleições. Teve o aval do próprio, o que também o coloca como um dos “vilões” neste enredo. Uma renovação que foi um desrespeito total a todos os associados que são os verdadeiros donos do clube, sobretudo quando a dois dias desse episódio, se definia o futuro do clube. O treinador “queimou-se” para servir de trunfo eleitoral e não merece essa falta de decoro por parte do Presidente.
O que também lhe fica mal é chamar “traidores” a nomes que escreveram a história do FC Porto. Aqui conseguiu incluir jogadores que escreveram a história europeia do clube e que foram dos principais responsáveis pelas páginas mais douradas do futebol português. Para alguém que se considera democrático, achar “traição” a uma opinião contraditória não é coerente. Nomes como Maniche, Helton, André ou Sousa ajudaram a cimentar a missão iniciada por si em 1982: transformar um clube regional num clube de dimensão mundial – de longe o mais bem-sucedido clube de futebol português no que toca a troféus internacionais.
Por último, tem todo o direito em querer presente no seu funeral quem deseja. O futebol, como um desporto apaixonante, desperta muitas emoções. Muitas vezes de forma irracional. É natural que dentro do seu círculo mais íntimo, não queiram ver no momento da despedida, nomes que o derrotaram para tomar posse da sua grande obra. É legítimo. O que não é compreensível é o constante ataque a André Villas-Boas quando este último, sempre que tem possibilidade, trata de enaltecer e respeitar o legado do Presidente.
A lista de André Villas-Boas não é perfeita. Quer-me parecer que existem nomes que rodeiam o atual Presidente que não estão lá por serem competentes, mas por outras razões. Porém, estão longe de auferir o rendimento de Vítor Baía – sem os associados perceberem o porquê – de Luís Gonçalves ou Fernando Gomes. Três nomes muito elogiados no seu livro, mas que, pelas contas que o clube apresentou nos últimos exercícios, três dirigentes que fizeram muito mal o seu trabalho.
Fica-lhe mal, Presidente Jorge Nuno Pinto da Costa, em não reconhecer os seus erros ou em procurar desculpas esfarrapadas, quando todos o reconhecem – inclusive a atual administração – como a figura mais importante da história do clube. Espero que o tempo lhe traga a lucidez e a coragem necessária de emendar muito do que foi escrito.