«Nem estou muito cansada. Ao fim do dia a felicidade ganha sempre ao cansaço quando se consegue uma medalha destas», declarou Catarina Costa a A BOLA depois de ter recebido a prata dos -48 kg no Europeu de Podgorica, que, esta quarta-feira, começou na capital do Montenegro e no qual apenas perdeu na final face à francesa Shirine Boukli, 6.ª do ranking mundial e bronze nos Jogos de Paris 2024.

Para Catarina (9.ª), de 28 anos, trata-se do quarto pódio consecutivo no evento, seguindo-se à prata em Sófia 2022 e Montpellier 2023, e ao bronze em Zagreb 2023. Em comum nas outras duas ocasiões em que também havia chegado à discussão do título: Boukli, de 26 anos, era igualmente a adversária.

Desta feita, depois de ter anulado uma desvantagem de yuko, Catarina ainda levou a discussão do ouro a prolongamento, mas acabou por receber um terceiro castigo, decorridos 4.24m

«Fico orgulhosa do trabalho que temos feito e desta consistência, porque não é fácil»

De qualquer forma, são quatro medalhas em quatro Europeus seguidos. Incrível! «É mesmo», concorda de imediato. «Fico orgulhosa do trabalho que temos feito e desta consistência, porque não é fácil. Mas é a prova que temos vindo a trabalhar mesmo bem e nos preparamos da melhor maneira para este tipo de competição», acrescenta.

«Naqueles primeiros anos não conseguia avançar bastante. Por isso, sim, nunca imaginei chegar a um patamar de tantas medalhas em Europeus. Só que, quando se começa a ter o gosto pela medalha…»

E isto vai muito além do que pensou quando chegou a sénior e levou pelo menos mais de um ano para se começar a adaptar da passagem dos -44 kg aos -48 kg? «Não, nunca pensei», confessa. «Até porque nas primeiras épocas foi um bocadinho para descobrir a prova. Em 2019, estive mesmo muito perto, quando fui 5.ª nos Jogos Europeus, após ter realizado uma bela competição», recorda.

«Depois, em 2021 também estava preparada, mas tive um azar que me obrigou a ir ao médico antes da prova, o que acabou por me desconcentrar. Perdi no primeiro combate para uma adversária que veio a ser medalhada...», conta Catarina.

«Não quero dizer falhar, mas, salvo em 2019, naqueles primeiros anos não conseguia avançar bastante. Por isso, sim, nunca imaginei chegar a um patamar de tantas medalhas em Europeus. Só que, quando se começa a ter o gosto pela medalha… Esta prova é sempre especial, por isso ambiciono todas as vezes mais uma. Agora, que não é nada fácil, não é.»

Com mais este êxito, no historial das 43 medalhas individuais de Portugal em Europeus, Catarina Costa repetiu o sucesso de Telma Monteiro e Pedro Soares como os únicos a terem conquistado um mínimo de quatro.

Telma com incríveis 15 (6+2+7), entre as quais seis de campeã; e todas consecutivas em edições que participou.

«Estar nesse lote de atletas tão prestigiados em Portugal dá-nos sempre uma grande responsabilidade mas, ao mesmo tempo, também estou a escrever a minha história no judo português»

Já Pedro Soares, contabilizou as quatro (0+2+2) entre 1995 e 2002, com a proeza de na última ocasião ter arrebatado duas num só campeonato: uma nos -100 kg e a outra na categoria open [sem limite de peso], que então existia.

O que é que isso significa para si, até porque o Pedro é o selecionador masculino e continua a estar nas provas [ainda hoje dava apoio tático da bancada durante os combates] e levou anos a viajar com a Telma pela Seleção até aos Jogos de Paris? «Estar nesse lote de atletas tão prestigiados em Portugal dá-nos sempre uma grande responsabilidade mas, ao mesmo tempo, também estou a escrever a minha história no judo português», vai contando a duas vezes olímpica.

«Serve ainda para mostrar às gerações mais novas, da mesma idade e até mais velhas que é possível. Que esta medalha está ao alcance de todos e que isto sirva, de alguma maneira, para inspirar os atletas nacionais a conquistar estas medalhas, porque só assim é que a modalidade pode crescer», acrescenta.

Agora só ainda falta o ouro para igualar o João Neto [treinador de Catarina, campeão em Lisboa 2008]? «É, essa tem estado a escapar mas, pelo menos em número de medalhas já lhe ganhei», responde rindo-se.

«A verdade é que estas medalhas se ganham nesse primeiro combate. Com aquela resiliência e querer. Ter cabeça fria até o fim. Nem olhava para o tempo, já não sabia há quanto é que estava a lutar. É: mais um ataque, mais um ataque... Por isso é que gosto dos Campeonatos da Europa.»

Isenta da ronda inaugural, na caminhada para o pódio, Catarina começou por defrontar a eslovena Patrícia Tomankova (17.ª do ranking júnior). Adversária que lhe causou bastantes dificuldades iniciais, procurando resolver as coisas rapidamente e, se possível, no chão. Foram necessários 9.52m para que Costa se impusesse e viesse a ganhar por castigos.

«Sabia que seria um combate difícil porque já havíamos lutado em estágios, mas, a verdade é que estas medalhas se ganham nesse primeiro combate. Com aquela resiliência e querer. Ter cabeça fria até o fim. Nem olhava para o tempo, já não sabia há quanto é que estava a lutar. É: mais um ataque, mais um ataque... Por isso é que gosto dos Campeonatos da Europa, deste desafio. Ter que ir ao pormenor, não errar primeiro e manter a estratégia até o fim», vai explicando a judoca da Académica de Coimbra.

«Na verdade, nesse nem me senti particularmente bem. Não estava muito explosiva. O primeiro combate é sempre complicado por estarmos a entrar em prova. Além disso, as regras mudaram e este ano ainda não tinha lutado propriamente bem com as novas normas porque nas duas provas que fiz internacionalmente calhou-me sempre uma japonesa no sorteio e não avancei. Não tinha sentido como é que é agora poder sair-se do tapete [sem castigos imediatos], haver yukos e tudo mais», explica.

Seguiu-se a neerlandesa Amber Gersjes (39.ª) nos quartos de final, ganho por shidos, e a sérvia Andrea Stojadinov (14.ª), nas meias-finais, resolvido por yuko.

Quando deles foi o mais complicado: o primeiro, o da final…? «Acho que, à sua maneira, todos tiveram o seu quê de dificuldade. E depois existe ainda aquele momento em que, de alguma maneira, fiz a diferença», analisa. «Até a final, onde perdi, mas consegui ir buscar o empate [yuko]. Portanto, todos tiveram a sua dificuldade de maneira diferente», confirma.

«Sabemos o que temos de fazer e que não pudemos errar. Mas mantive cabeça fria.»

«No primeiro, a dureza de ter que manter a estratégia muito tempo e ir procurar aquele terceiro shido. No segundo, a infelicidade de ter levado dois castigos bastante cedo - não percebi um deles -, mas no qual tive de ir buscar o ippon numa luta que não previa ser tão complicada. Mas nunca senti pressão, estava calma e confiante que conseguiria projetá-la, porque tínhamos a estratégia certa», revela.

«Depois, na meia-final, foi necessário haver gestão das emoções porque é o que nos dá a passagem à final. Além do mais, era uma atleta com quem treinamos muitas vezes em estágios. Sabemos o que temos de fazer e que não pudemos errar. Mas mantive cabeça fria.»

«Na final, acho que houve um momento em que tive um clique a nível das pegas onde consegui perceber que também conseguia ganhar essa pega e atacar para pontuar. Acabou por acontecer, mas, infelizmente, no ponto de ouro não voltei a repetir», acaba por contar Catarina Costa, que teve ainda uma especial felicidade por esta última medalha ter sido obtida na capital do Montenegro.

«Foi bom ter tido esta performance no sítio onde temos os nossos amigos e sentir o apoio deles. É destas coisas bonitas que o Judo também tem»

«Este é um sítio especial, que me diz qualquer coisa, por isso também gostei de ter conseguido um resultado destes cá», vai contando a internacional portuguesa.

«Há muitos anos que tenho aqui um amigo. Vem desde o tempo em que competíamos em cadetes e ele dizia que queria que eu ganhasse uma medalha em Podgorica. Acabou por não seguir a carreira de judoca, mas tornou-se treinador e tem cá um clube. Foi bom ter tido esta performance no sítio onde temos os nossos amigos e sentir o apoio deles. É destas coisas bonitas que o Judo também tem, ter amigos um bocadinho por todo o mundo e por isso há sítios que às vezes são um bocadinho mais que outros por causa disso. E este Europeu também vai ser marcado por isso. É bom», concluiu.