Eindhoven, cidade onde o PSV é rei e o Sporting vai procurar rugir esta terça-feira. Para Rodrigo Rego, um jogo em que diferentes pontos da carreira se cruzam.

Formado em Alcochete, o jovem de 22 atuou nas duas últimas épocas ao serviço do FC Eindhoven, clube atualmente no segundo escalão dos Países Baixos.

Em entrevista ao zerozero, o atual jogador do Varzim apresentou-nos esta cidade, o futebol neerlandês e as memórias dos muitos anos de leão ao peito.

«Tive saudades de um bom peixinho grelhado»

zerozero - Após uma época de empréstimo ao Varzim, o Rodrigo acaba por desvincular-se do Sporting e assinar pelo FC Eindhoven. O que levou a essa decisão?

Rodrigo Rego - Fui para o Varzim no último dia de mercado, uma grande aventura para ainda assinar a tempo. Com seleção pelo meio só comecei a trabalhar no clube na segunda semana de setembro. Os últimos meses da época correram-me bem.

Tinha mais um ano de contrato com o Sporting, mas percebi que dificilmente ia ter uma oportunidade na equipa principal. Não fazia sentido ir para a equipa B tendo estado na II Liga.

O FC Eindhoven apareceu como um projeto desportivo interessante. Tinham estado perto da subida na época anterior. Tinha boas referências, depois até superadas, da II Liga neerlandesa.

Os treinadores e os diretores fizeram força para a minha ida e acabei por aceitar a oportunidade.

Chegada a Eindhoven aconteceu em 2022 @Getty /

zz - Já tinha estado nos Países Baixos?

RR - Só em Amesterdão, num torneio de formação que o Ajax organiza normalmente. Até fui pelo escalão acima no Sporting, com a geração de 2001 do Gonçalo Inácio e do Félix Correia. Nunca tinha estado em Eindhoven.

zz - Como foram as primeiras impressões?

RR - É um estilo de vida diferente. As pessoas são mais pacatas e descontraídas que em Portugal. Não na simpatia, atenção. Nós somos pessoas muito acolhedoras, até mais no Norte que na Margem Sul, de onde venho.

Sinto mais no trânsito, por exemplo. Outra coisa engraçada, se não estás em casa para receber uma encomenda, entregam ao vizinho e deixam-te uma nota a avisar onde está. Não vês isso tanto em Portugal, pelo menos na Margem Sul.

As rotinas são diferentes. Refeições principais muito baseadas em sandes e no pão, com jantares por volta das 18h00. Os trabalhos acabam mais cedo e começam os dias também mais cedo.

zz - Há também a cultura da bicicleta.

RR - Eu e a minha namorada tínhamos duas no primeiro ano. Utilizávamos bastante e ela ficou mais com esse hábito. Deixei de utilizar porque não me compensava pagar o aluguer mensal.

Sendo o clima mais severo, eles desenvolvem várias atividades lúdicas em espaços interiores.

Parques de diversão, museus interativos, SPAS e parques aquáticos, que não cheguei a fazer. Não falta por onde escolher.

Meteorologia e gastronomia não conseguem competir connosco. Cozinhávamos muito em casa e comia comida portuguesa, mas tive saudades de um bom peixinho grelhado (risos).

zz - Alguma recomendação especial para ver em Eindhoven?

RR - O museu da Philips é um marco da cidade. O estádio do PSV e o museu do clube são também espaços a visitar. Joguei lá duas vezes e gostei muito da experiência.

Os bons acessos no país e as distâncias curtas também permitem visitar várias coisas em diferentes cidades. Roterdão e Amesterdão têm outro tipo de oferta, admito.

Utilização foi irregular nas duas épocas @Getty /

«Jogava em estádios com mais de 12 mil adeptos»

zz - Noto que os clubes neerlandeses estão muito espalhados pelas várias cidades.

RR - Acho a II Liga de lá superior à portuguesa e um dos pontos é os estádios terem muito público, fiel aos clubes das suas cidades. Sete/oito estádios em que jogava contra mais de 12 mil adeptos.

O FC Eindhoven, porém, não é o melhor exemplo. É claramente a segunda equipa da cidade, que respira PSV. Um histórico e atual campeão do país.

zz - Há um ambiente saudável entre os clubes da cidade?

RR - É uma relação boa. Todos os anos durante a pré-época acontece o Lichtstadderby entre os dois clubes, uma finalíssima na cidade. Nunca ganhei nas épocas em que lá estive, mas a minha estreia a titular foi lá.

qNão é uma grande diferença, mas escolho a II Liga de lá
Rodrigo Rego

Foi um privilégio jogar no estádio do PSV. É usual nas diferentes temporadas chegarem jovens do PSV por empréstimo ao FC Eindhoven.

zz - Ainda é justo associar o futebol dos Países Baixos a um estilo muito atacante? Porque acredita que é melhor que a II Liga portuguesa?

RR - Não é uma grande diferença, mas escolho a II Liga de lá. Muito superior a nível ofensivo, seja na qualidade individual dos jogadores ou nas dinâmicas coletivas.

Em Portugal as defesas organizam-se melhor, nos Países Baixos corre-se muito e coloca-se muita gente a chegar a zonas avançadas.

Alguns golos acontecem por erros infantis. Sinto que é um estilo fomentado pelos treinadores, ainda está muito enraizada a ideia do futebol total. Fui desafiado a fazer coisas que nunca me tinham sido solicitadas como defesa central.

Pressão homem a homem e tens de estar confortável para apertar os adversários em zonas mais avançadas. Desenvolvi muito esse aspeto. Fisicamente, vantagem para a II Liga portuguesa.

zz - A utilização foi algo irregular durante as duas épocas.

RR - Quando cheguei as coisas estavam a correr bem, mas depois descambaram um pouco e fui abaixo. Não voltei a ter as oportunidades que precisava no centro da defesa e, sinceramente, não acho que tenha características para ser ala numa defesa a cinco, como fui algumas vezes utilizado.

Num futebol tão ofensivo jogar nessa posição é quase ser um extremo. Estou a jogar como central esquerdo no Varzim e as coisas têm corrido muito bem a nível individual. Acredito que seja o meu melhor papel.

zz - Curiosamente foi colega de equipa de Ozan Kökcü, irmão do atual médio turco do Benfica. Falavam regularmente sobre Portugal?

RR - Falávamos algumas vezes, até porque ele chegou também a ter possibilidade de ir para Portugal jogar. Mais que o sobre o irmão, os temas eram o Benfica e o país.

Agora está na Finlândia a jogar. Sei que já visitou o irmão algumas vezes e viu jogos do Benfica.

Ligação ao Sporting começou em 2012 @Sporting CP

«Gostava de ter tido um caminho mais certo para a equipa principal»

zz - Fez a formação praticamente toda no Sporting. Qual é o balanço desse ciclo?

RR - Uma experiência enriquecedora. Definiu muito quem sou como jogador e homem. Torneios internacionais pelo mundo fora, treinadores e colegas de muita qualidade. Consegui estar nas seleções jovens nacionais. Só tenho a agradecer.

Gostava de ter tido um caminho mais certo para a equipa principal, como sinto que outros jogadores têm tido. Fica essa mágoa, mas acredito que possa lá chegar um dia por outros caminhos, talvez.

Foi um privilégio. Ficaram amigos para a vida, memórias e muito crescimento.

zz - O Rodrigo fez durante anos dupla na defesa com o Eduardo Quaresma. Como tem visto o percurso que sido construído por ele?

RR - O Edu sempre foi um jogador a quem se criou grande expetativas. Eu também tinha um pouco esses olhares, mas ele nesta fase está num nível superior. Teve o mérito de mostrar valor quando teve a oportunidade e resistir aos momentos difíceis.

Rodrigo esteve presente num Euro Sub-17 @Getty /

Aí entram dois fatores: mentalidade do jogador e alguém para o segurar, neste caso o Rúben Amorim. Gostava de ter tido esse apoio nos Países Baixos, por exemplo.

O Edu amadureceu e está mais jogador. Tem todo o mérito e desejo-lhe o melhor, assim como o Inácio que jogou comigo desde criança.

Nuno Mendes, Tiago Tomás, Joelson Fernandes, Francisco Conceição, são muitos os casos de sucesso.

zz - Acredito que tenha passado a acompanhar mais o futebol dos Países Baixos. O que acha da equipa do PSV?

RR - Passei a estar mais atento. O PSV é uma equipa muito vertical e estou curioso para perceber como vão pressionar o Sporting. Acredito que vão quer manter essa filosofia a jogar em casa.

O Sporting está muito forte e acho que é favorito, mesmo a jogar fora. Espero um bom espetáculo e podemos ver muitos golos.

Pressionar o Gyökeres homem a homem é que pode não ser muito boa ideia (risos). Estou curioso para ver o jogo.

zz - Ficou algo escaldado em relação a jogar no estrangeiro com esta experiência?

RR - Um futebolista, até chegar a um patamar em que eu não estou, vive muito do imediato. São contratos de curta duração e muitas malas feitas.

A minha prioridade era voltar a Portugal e encontrei no Varzim um projeto bom. Tenho estado satisfeito com o meu rendimento e podemos fazer coisas bonitas.

A porta do estrangeiro tem de estar aberta. Aprendi algumas coisas com esta experiência e apercebi-me que existe bom futebol por essa Europa.

Temos de capitalizar ao máximo as nossas carteiras curtas e o fator financeiro tem de pesar. Portugal está a melhorar nesse aspeto, mas ainda não está ao nível de vários países.

No Varzim em busca de recuperar sensações @FPF/Francisco Paraíso