Para o bem de todos os males, o futebol continua a jogar-se com uma bola. Por mais que as táticas tenham evoluído, que os tablets, as analíticas e os dispositivos de controlo de batimentos cardíacos se tenham multiplicado, ao final de contas, é na bola que continua a estar o principal elemento de um jogo de futebol. Felizmente para o jogo, infelizmente para o FC Porto.
Em todo o onze titular dos dragões na derrota diante do Olympiacos , só dois jogadores tratam a bola por tu, sem formalismos, cuidados redobrados ou pensamentos ansiosos. Nico González, melhor jogador dos dragões na temporada, e Rodrigo Mora, maior projeto da academia azul e branca dos últimos largos anos, eram os únicos em campo que, com a bola no pé, efetivamente conseguiam resolver. E, quando ambos foram tapados, o jogo do FC Porto ressentiu-se.
Rodrigo Mora foi o melhor jogador dos dragões nos primeiros 15 minutos de jogo, procurando receber sob a meia esquerda, nas costas dos médios gregos, aproveitando o espaço livre para rodar e definir. Quando o FC Porto deixou de conseguir colocar a bola no jovem português, foi aparecendo Christos Mouzakitis. Apenas uns meses mais novo que Rodrigo Mora foi o jogador que esteve melhor em campo, tapando linhas de passe para o português, recuperando bolas, vencendo duelos e fazendo jogar o Olympiacos. Foi a chave para o desaparecimento do jogador que, neste FC Porto, já carrega tanta responsabilidade nas costas.
Quanto a Nico González, foi afastado do jogo por plano estratégico. José Tavares procurou dar conforto a Rodrigo Mora na meia esquerda, concentrado a saída de bola e o volume de jogo do FC Porto por este lado e, simultaneamente, colocando Nico González à direita de Alan Varela. Além de procurar afastar um marcador direto desta zona, abrindo espaço à entrada da bola em Rodrigo Mora, o técnico interino dos dragões procurou no espanhol o jogador capaz de fazer rodar a bola de corredor. Sempre que a teve nos pés, soube o que fazer com ela, mas reduzir a participação do melhor jogador do FC Porto no jogo diminuiu também a capacidade dos dragões controlarem e terem a bola.
Neste oásis do FC Porto, sobressaiu o deserto quando a bola chegou a outros pés. Wenderson Galeno, Pepê, Samu Aghehowa, João Mário, todos tiveram a bola em condições de fazer melhor, todos definiram mal vezes e vezes consecutivas. O lateral direito português, chave na forma como aproveitava a construção do lado esquerdo, para ter campo aberto a explorar à direita, somou mãos cheias de más decisões. Galeno e Pepê, na teoria as principais referências ofensivas do FC Porto, vão fazendo uma época entre o fantasma que desaparece e se apaga e o pirilampo, que depois de um brilho ocasional, também rapidamente fica sem luz. Está claro (e a transferência frustrada para o Al Ittihad demonstra-o) que o ciclo terminou, mas exige-se outro compromisso a dois dos jogadores que mais capacidade têm de definir o rumo do jogo.
Por fim, Samu. O início arrebatador elevou o jovem avançado espanhol a uma dimensão que não corresponde, necessariamente, à realidade. O potencial está lá todo e é imenso, mas entre o teto e o nível atual a diferença é grande. Dentro da área, como referência para cruzamentos, é um jogador capaz de oferecer inúmeras soluções ao jogo do FC Porto. Com espaço para galgar nas costas da defesa, idem. Quando é obrigado a jogar de costas para a baliza, quer segurando bolas, quer combinando com os colegas, sobressaem as evidentes lacunas técnicas que tem. Ao contrário dos parceiros de ataque, não se nota um desligar competitivo ou qualquer falha na atitude, mas o futebol de um grande obriga a jogar com a bola. E nisso, o avançado espanhol – que é um jogador imenso – ainda não cumpre sempre.
O futuro trará, a menos que algo de muito estranho se suceda, Martín Anselmi ao reino azul e branco. O terreno desconhecido do argentino que fez do México casa nos últimos meses, tem sido desbravado e os sinais são claros: vontade de sair a jogar desde trás, capacidade de pressão em todo o campo, dinamismo no jogo e valorização da bola. Mais do que sistemas, importam as ideias de um modelo de jogo que vai muito para lá dos números. E, para um treinador que quer ser protagonista, falta muito toque de bola a este FC Porto.