O mercado é um cruzamento de manobras de sedução. Os clubes usam argumentos desportivos e financeiros para convencerem os jogadores. O regatear de preços é um processo moroso por culpa da negociação relativa à quantidade de zeros colocados à frente de algarismo já por si elevados. Cada transferência efetuada significa um lugar vago no plantel que vê partir um dos seus ativos. A consequência é a necessidade do lesado grupo de jogadores ter que avançar para um processo de recrutamento que solucione a ausência daquele que partiu. Assim nasce um bailarico de movimentações.

Há sempre quem tenha mais facilidade em encontrar par para a dança. Não é fácil dar uma nega ao Liverpool. A promessa de uma serenata em Anfield – quem é que não se deixa levar pelo “You'll Never Walk Alone”? – e um piscar de olho costuma chegar para que os reds atraiam os alvos que pretendem. Mas não desta vez.

Martín Zubimendi é o protótipo de médio defensivo moderno. Numa entrevista à Tribuna Expresso antes do Euro 2024, onde representou a seleção espanhola, disse que a posição exige “muito ao cérebro”. Um jogador que a ocupe nunca pode “desconectar”, porque “é importante jogar a 360 graus e ver a longa distância”. Isso só se consegue observando “algo mais que os outros”. Não se desfazendo em autoelogios, inconscientemente, estava a fazer uma descrição de si próprio.

Era por todo este manancial de capacidades que o Liverpool estava disposto a pagar 60 milhões de euros. Apesar de Arne Slot, o sucessor de Jürgen Klopp, considerar que já tem “uma boa equipa”, assinala que “que seria uma surpresa se não chegassem novos jogadores”. Martín Zubimendi faria parte das cogitações, mas o próprio descartou o Liverpool de modo a permanecer no emblema basco ao qual está ligado desde os 12 anos.

O valor que a equipa da Premier League estava disposta a pagar corresponde à cláusula de rescisão do jogador de 25 anos, que tem contrato com a Real Sociedad até 2027. Na altura em que assinou o vínculo, foi descrito como o “diretor da orquestra”. Agora, continuará a dar música ao Anoeta, casa de onde não parece ter vontade de sair.

A relação emocional com a Real Sociedad prevaleceu sobre o contrato mais vantajoso que o Liverpool oferecia. “Quando alguém quer estar num clube, a cláusula de rescisão não importa”, tinha dito Martín Zubimendi ao Diario Sport em 2023. No entanto, é previsível que o centrocampista assine um novo contrato que contempla um vencimento superior, ainda que, mesmo assim, “muito baixo” daquele que iria receber em Inglaterra. Pelo menos foi isso que Fabrizio Romano, o suposto guru das transferências, revelou.

O xadrezista que quer ser treinado por Xabi Alonso, mas na Real Sociedad

A propósito dos avanços e recuos nas negociações, Jamie Carragher, antiga lenda do Liverpool, questionou a ligação afetiva de Zubimendi com os txuri-urdin. “A Real Sociedad não pode ser o último passo da carreira dele”, referiu, no podcast do Liverpool Echo, o ex-jogador que, ao longo da carreira, não conheceu outro clube que não os reds.

Embora esteja cada vez mais a abrir as portas a jogadores estrangeiros e a espanhóis que não sejam formados em Zubieta, a cidade desportiva do clube, a Real Sociedad tornou-se célebre pela aposta em jovens por si maturados. Martín Zubimendi é um menino de San Sebástian e, em simultâneo, um produto da casa. Mantém viva a essência de um clube que se tornou mais flexível ao nível da política de contratações, em comparação com o Athletic Bilbao, rival que continua a ter uma filosofia desportiva mais rígida.

Zubimendi já estava a ser associado a outros clubes, nomeadamente ao Barcelona, quando foi entrevistado pelo OK diario e disse que se sentia “muito querido” na Real Sociedad, junto “das pessoas que gosta” e que o momento de abandonar o clube estava “longe” de acontecer.

Apesar de ser comparado a Sergio Busquets e Rodri, era Xabi Alonso quem o jovem Martín, ainda com um jeito agora perdido para jogar xadrez, queria imitar em criança. Hoje usa o número quatro que o atual treinador do Bayer Leverkusen também carregava nas costas nos tempos em que, como jogador, atuou na Real Sociedad. Em 2019/2020, os dois cruzaram-se na equipa B. Zubimendi era um jogador próximo de saltar para o plantel principal e Xabi Alonso estava a dar os primeiros passos como treinador. Martín espera voltar a encontrar o técnico e não quer ter de ir a lado nenhum para o fazer.