Numa grande entrevista ao Globo Esporte, Jorge Jesus, 70 anos, treinador dos sauditas do Al Hilal, admitiu sentir grandes saudades do Brasil, recordando os tempos no Flamengo e também com uma 'bicada' aos adeptos do Benfica.
«Guardo o Flamengo num lugar no meu coração por tudo o que envolveu jogadores e adeptos. Você [jornalista] é testemunha... Às vezes, coloco os vídeos para lembrar 70 mil pessoas a gritar 'olé, olé, olé, Mister...0. Isso eu não tive, e nunca terei novamente, nem no meu país. Estive no Benfica, ganhei tudo o que havia para ganhar e nunca tive um jogo, um jogo que fosse, em que os adeptos gritassem por mim! Nenhum! Então, tenho de ter saudades do Brasil. Fui bem tratado por todos, até mesmo torcedores que não são do Flamengo me deram carinho nas ruas, nunca me ofenderam, sempre gostaram de mim... Tudo isso conta», comentou o técnico, que comandou as águias entre 2009 e 2015 e, mais tarde, entre 2020 e dezembro de 2022. Primeiro saiu em fim de contrato, assinando pelo Sporting, e, na segunda passagem, abandonou o Benfica com rumores de um possível regresso ao Flamengo, o que acabaria por não se confirmar. Mas a hipótese esteve em cima da mesa, lembra Jesus.
«No meu último ano de Benfica, foi por uma semana que não fui treinador do Flamengo. Marcos Braz esteve em Portugal para me levar e eu ainda era treinador do Benfica. Eu disse que naquele momento não era fácil sair, mas que as coisas não estavam muito boas e que, se pudesse esperar mais um pouco, isso ia acontecer. Mas o que é facto é que saí do Benfica depois de uma semana do acerto com o Paulo Sousa. O timing às vezes não dá, às vezes não é na hora e não se conjugam os interesses», disse.
Rejeita comparação com o Botafogo
Questionado pelo feito do Botafogo, que em 2024, com Artur Jorge, venceu o Brasileirão e a Libertadores, como o Flamengo com Jorge Jesus, o treinador disse:
«Isso nem é conversa, não é comparação possível. Não é por eu ter sido o treinador do Flamengo, mas estão a comparar o Flamengo do meu tempo, que ganhou tudo o que havia para ganhar. O Botafogo não ganhou, o Botafogo ganhou a Libertadores e o Brasileirão. No meu tempo, ganhámos o Estadual, o Brasileirão, a Libertadores, a Supercopa, a Recopa... Sei lá, tudo o que havia para ganhar. O Botafogo teve méritos, eu acompanhei muito, fiquei feliz pelo Artur Jorge ter realizado esse feito, mas não há comparação possível. A qualidade de jogo que a minha equipa tinha e a qualidade de jogo que o Botafogo tinha não dá para comparar.»
Jorge Jesus aproveitou ainda para comentar o enorme legado que os treinadores portugueses estão a deixar no futebol brasileiro atualmente, um fenómeno por si iniciado, dizendo sentir-se como o Pedro Álvares Cabral de Portugal no futebol local.
«Sim, a minha passagem obrigou o futebol brasileiro e o próprio treinador a olhar o jogo de outra maneira. Quando chegámos, o futebol era muito de posição, de pouca pressão. Hoje, não, eles já sabem o que é fazer pressão alta. Esse foi um dos componentes do jogo que fizeram mudar o futebol brasileiro, porque a qualidade que o jogador tem continua, o talento continua todo lá, mas no futebol só o talento não ganha jogos hoje em dia. O talento com a qualidade do trabalho é o que ganha títulos e jogos. Hoje, as grandes equipas do Brasil estão a ir por essa mudança, como na Europa. E, sim, sinto que deixamos um legado para que os outros treinadores portugueses, como Abel e Artur Jorge, tivessem a continuidade dessa ideia de jogo. Isso fez com que três treinadores portugueses no espaço de cinco anos ganhassem. Eu sinto-me como o Pedro Álvares Cabral do futebol português no Brasil, que foi confirmado e justificado. O treinador português é o melhor treinador do mundo», vincou.