Jannik Sinner completou o seu ano de sonho com a conquista da Taça Davis ao serviço da seleção italiana, que revalida o título ganho na edição transacta.
A última metade do ano do tenista transalpino é das melhores da história do ténis, com a conquista do Open dos Estados Unidos, do Masters 1000 de Xangai, das ATP Finals e terminando com a cereja no topo do bolo com o tal título na Taça Davis, como já mencionado anteriormente.
É certo que todos estes títulos foram obtidos na sua superfície preferida (piso rápido), onde as qualidades de Sinner se evidenciam e quase sempre, o tenista italiano consegue superiorizar-se aos seus adversários.
A potência das suas pancadas, o seu excelente serviço e o ritmo que emprega ao seu jogo, torna-o num tenista quase imbatível e neste momento, só mesmo um Carlos Alcaraz em estado de graça, poderá derrotá-lo em piso rápido, como foi o caso dessa final épica entre ambos no ATP 500 de Pequim, em que o tenista espanhol conseguiu derrotar Sinner, mas ao fim de mais de três (!) horas de partida. Só por aí vemos como é extremamente complicado derrotar o tenista italiano nos pisos mais rápidos do ténis.
A velocidade da bola de Sinner é alucinante, a intensidade do seu jogo é estratosférica. Sinner nunca tem momentos em que se vai da partida, ao contrário de Alcaraz, que por ter mais recursos tenísticos, muitas vezes se desconcentra, perde o foco e acaba derrotado por esse mesmo motivo. O nível médio de Sinner é suficiente para derrotar quase todos os outros, mesmo que estes joguem no máximo das suas capacidades.
Sinner tem igualmente um excelente serviço e consegue ganhar vários pontos sem necessitar de estar constantemente em trocas de bola exigentes na linha de fundo, mas se tivesse que o fazer, também teria essa capacidade física para aguentar esses pontos mais longos.
É dos melhores do circuito a responder ao serviço dos adversários, e isso coloca-o várias vezes em vantagem na discussão do ponto a partir da sua primeira pancada, o que é claramente um fator diferenciador e chave em superfícies mais rápidas.
E assim o comprova a forma como o tenista italiano consegue desarmar e combater o jogo do russo Daniil Medvedev (que é extremamente consistente e muito inteligente taticamente) ou a célebre solidez de jogo do campeoníssimo Novak Djokovic, que apesar de levar Sinner à exaustão, neste ano Sinner conseguiu levá-lo sempre de vencida.
É igualmente um tenista muito frio (talvez por ter nascido na zona do Tirol, na fronteira com a Áustria), que pouco expressa as suas emoções e que canaliza a sua energia na conquista dos pontos. Ao contrário de outros tenistas italianos, raramente vemos Jannik Sinner em discussões com árbitros, a interagir demasiado com o público, a revelar algum tipo de frustração e joga de maneira sublime os pontos mais importantes em tie breaks, em sets apertados ou na forma como salva pontos de break.
Tem um instinto matador bastante apurado, sente quando o seu adversário está fragilizado ou dubitativo, e raramente desperdiça essas oportunidades. E tudo isso é feito num absoluto silêncio e com uma expressão facial praticamente inalterável ao longo de todo o jogo. Festeja os pontos com punho cerrado, olha para a sua equipa técnica, mas termina aí a exteriorização das emoções do tenista italiano.
O recorde de Sinner no ano de 2024 é absolutamente absurdo. Disputou 79 jogos, ganhou 73 (!) e apenas perdeu 6 jogos, sendo que três dessas derrotas foram contra o espanhol Carlos Alcaraz (que bela rivalidade teremos na próxima década entre estes dois tenistas) e conseguiu a proeza de se tornar o segundo tenista da história em ganhar pelo menos um set em todos os jogos disputados, recorde que agora compartilha com o campeoníssimo suiço Roger Federer, que conseguiu o mesmo feito no ano de 2005.
Nos Grand Slam, Sinner foi bastante competitivo. Ganhou o Open da Austrália (seu primeiro Grand Slam) depois de estar a perder por dois sets a zero contra Medvedev. Em Roland Garros, sucumbiu ao fim de cinco sets ao fim de mais de quatro horas contra Carlos Alcaraz nas meias-finais e esteve bem perto da final, pois esteve a ganhar por dois sets a um.
Em Wimbledon, cedeu fisicamente perante Medvedev na derrota mais estranha e provavelmente mais inesperada do seu ano desportivo. Mas mesmo assim, perdeu em cinco sets ao cabo de quase quatro horas e dando muita luta ao tenista russo, apesar das suas evidentes limitações físicas. No Open dos Estados Unidos, voltou a superiorizar-se a toda a concorrência e ganhou o torneio numa final sem história ao norte-americano Taylor Fritz, que foi completamente varrido da pista por Sinner em menos de duas horas e meia de jogo.
Neste 2024, Sinner tornou-se no único tenista da história a ganhar dois Grand Slam, as ATP Finals e a Taça Davis no mesmo ano. E é igualmente de destacar que ganhou as ATP Finals (sem a presença de Djokovic e com um Alcaraz limitado fisicamente, é preciso dizê-lo) sem perder um único set, algo que não acontecia há quase 40 anos.
Todos esses incríveis feitos mencionados anteriormente, foram obtidos em meio de um escândalo de doping, e mesmo assim o tenista italiano mostrou ter uma grande força mental para superar as adversidades e a desconfiança dos seus adversários de estarem a competir com um desportista que joga com as mesmas regras do que todos.
Sinner, incontestável número um mundial, foi absolvido pela Agência Mundial de Antidoping, apesar de ter sido detectado o uso de clostebol (numa quantidade ínfima, do qual não obteve um maior rendimento desportivo), uma substância proibida, em seu corpo. A Agência Mundial Antidoping decidiu recorrer da decisão, e o tenista italiano ainda pode ser suspenso, sendo que o resultado do recurso será conhecido brevemente.
Sinner sabe que todos os olhos do ténis estão postos em si, que muitos dos seus adversários torcem (apenas e só por despeito) que seja efetivamente suspenso e que assim esses possam ter mais possibilidades sem terem de competir com o tenista italiano. Considero uma atitude bastante pobre por parte desses tenistas.
Claro que o processo poderia ter sido conduzido de outra forma, e provavelmente Sinner deveria ter sido suspenso provisoriamente, mas o tenista italiano não tem culpa de que o tribunal tenha decidido de forma mais célere no seu caso e que o tenha absolvido posteriormente.
Provavelmente, outro tenista iria ceder mentalmente e isso teria repercussão nos seus resultados desportivos. Mas este caso de doping foi o combustível que Sinner usou para demonstrar que não necessita de se dopar e que é indiscutivelmente o melhor tenista da atualidade. O que Sinner conseguiu, ainda tem mais mérito por ter acontecido num contexto tão convulso. O próprio Sinner diz: “Eu gosto de falar em court”.
Este caso de doping impediu o tenista italiano de representar a seleção italiana nos Jogos Olímpicos de Paris e que apesar de ter sido um torneio disputado em terra batida (que não é de todo a melhor superfície do tenista italiano), como os jogos eram à melhor de três sets e tendo em conta o seu estado de forma, considero que deva ter sido bastante frustrante para Sinner que não pudesse participar, pois seria um fortíssimo candidato a uma medalha olímpica, mesmo que não fosse a de ouro.
Conseguiu a sua vingança com a conquista da Taça Davis, obtida recentemente em Málaga, numa competição que marcou a retirada oficial do super campeão espanhol Rafael Nadal.
Para o ano de 2025, pede-se a Sinner que mantenha o seu nível de jogo e que consiga demonstrar que também tem ténis para poder ganhar os outros Grand Slam (Roland Garros e Wimbledon) que lhe faltam no seu currículo.
São torneios disputados em terra batida e relva respetivamente, e aí não basta ser consistente e ter pancadas muito potentes. É necessário saber jogar taticamente e ter mais soluções de jogo. Tomar a iniciativa do ponto, ser consistente, mas ser igualmente criativo e apresentar dificuldades diferentes aos seus adversários.
Deverá ver de que forma Alcaraz conseguiu ganhar esses mesmos Grand Slam no ano de 2024, não perdendo a essência do seu jogo, mas melhorando em alguns capítulos do mesmo, que poderão fazer com que esteja mais próximo de ganhar em Roland Garros e Wimbledon.
Há muita margem de progressão no jogo de rede de Sinner, a quem deveria ser igualmente aconselhado a refrear os seus ânimos e intensidade em superfícies tão exigentes, como a terra batida. Prova disso, é que dos 18 títulos da carreira do tenista italiano, apenas um foi ganho em terra batida e outro em relva. 16 (!) foram conquistados em piso rápido, e 2025 será o ano de Sinner demonstrar a todos os amantes do ténis que não é um jogador unidimensional.
O 2024 de Sinner já é um dos melhores anos da história do ténis, mas para se tornar um dos melhores de sempre, necessita de dar esse passo em frente nas outras superfícies, tal como por exemplo fizeram em seu dia Rafael Nadal e Roger Federer, para se libertarem dessas mesmas críticas, de que eram apenas especialistas em terra batida e relva respetivamente.
Sinner tem apenas 23 (!) anos e mais de uma década de ténis pela frente. Foram 9 títulos ganhos (10 se quisermos incluir o torneio de exibição Six Kings Slam), e agora a fasquia está muito elevada para o próximo ano.