«Pinto da Costa? Se a instituição Sporting não se revê em quem prejudicou o clube, a indústria do futebol e os nossos valores, seria uma hipocrisia mudar por essa ter morrido».

Estas foram as declarações de Frederico Varandas (atual presidente do Sporting) em relação ao silêncio institucional do clube que preside sobre a morte de Jorge Nuno Pinto da Costa, icónico presidente do FC Porto, que sucumbiu a um cancro da próstata com 87 anos de idade.

Na minha opinião, estas declarações revelam uma profunda falta de empatia de Frederico Varandas, assim como uma total ausência de desportivismo.

Se tanto criticou Pinto da Costa pela sua falta de desportivismo e o acusou de ter destruído o futebol português (uma afirmação totalmente alheada da realidade na minha modesta opinião), não seria a melhor resposta imbuir-se dos valores do desporto que tanto defende e emitir um simples comunicado institucional manifestando o pesar pela perda de uma figura tão emblemática do desporto nacional?

Não estou com isto a dizer que deveria ter marcado presença (conjuntamente com Rui Costa e os seus respectivos órgãos diretivos) no funeral de Pinto da Costa.

O próprio deixou expresso em vida e por diversas vezes (inclusive na sua biografia lançada recentemente) quem queria ter presente na sua despedida e inclusive disse que o atual presidente André Villas-Boas (que lhe sucedeu no cargo e a quem se referiu muitas vezes de forma nada simpática, para não dizer insultuosa nos últimos tempos) não seria bem-vindo.

Villas-Boas cumpriu o seu desejo, deixando apenas uma simbólica coroa de flores junto do plantel da equipa principal num memorial repleto de cachecóis, camisolas e flores em homenagem a Pinto da Costa em frente às portas centrais do Estádio do Dragão.

A presença de Rui Costa e Frederico Varandas no seu funeral poderia ser encarada como uma falta de respeito e poderia ser tida como uma provocação por parte dos adeptos portistas mais acérrimos, gerando um clima de tensão tão desnecessário como despropositado, dada a solenidade do momento.

Quando Frederico Varandas diz que a decisão de permanecer em silêncio não foi pessoal mas sim de clube, quer com isto dizer que pensa que os seus adeptos o iriam considerar menos sportinguista se demonstrasse algum respeito pelos adeptos de um clube que chora a morte da sua principal figura?

A minha resposta é um contundente NÃO. Conheço vários adeptos (quer de Sporting, quer de Benfica), que expressaram e demonstraram publicamente a sua insatisfação perante esta atitude que em nada engrandece dois emblemas nacionais tão históricos.

Numa altura em que as direções dos três principais clubes (Benfica, FC Porto e Sporting), estavam a trabalhar no sentido de estabelecerem alianças e instalarem um clima de paz no nosso futebol, será esta postura a mais adequada?

Veja-se de que prisma se queira ver, esta atitude não é benéfica nem para Benfica nem para Sporting, e pode novamente contribuir para um clima de instabilidade e “guerrilha” dentro e fora dos relvados.

Convém frisar que esse clima de “guerrilha” foi certamente muitas vezes alimentado e potenciado por Pinto da Costa durante os seus mais de 40 anos de presidência. Mas estamos a falar de quatro décadas à frente de uma instituição desportiva. Terá sido o único a cometer erros? Foi tudo mau durante a sua presidência?

Terá sido o único a fazer uso de métodos pouco ortodoxos e bastante dúbios e tirar proveito dos mesmos? A resposta é igualmente um contundente NÃO.

Noutros clubes, as suas maiores figuras são ex-jogadores de futebol, no FC Porto não há cor nem comparação possível sequer. Jorge Nuno Pinto da Costa será sempre a maior figura do clube azul e branco e um homem que mudou a história de um clube de bairro e transformou-o numa potência mundial.

Pinto da Costa é inclusive o único dirigente a nível mundial (se a memória não me atraiçoa) a ter o seu nome entoado pelos seus adeptos num cântico emblemático que se tornou uma presença assídua em todos os jogos do FC Porto.

Assumidamente portista mas igualmente desprovido de clubismos, escrevo este artigo com um sentimento desencontrado e bastante ambíguo sobre aquele que antes de eu nascer, já era presidente do meu clube.

Obviamente que não estive sempre de acordo com muitos dos seus métodos e muitas das coisas que disse, mas os seus méritos são indiscutíveis.

69 títulos (só no futebol) e mais de 2500 (!) títulos em todas as modalidades, elevando o FC Porto a uma dimensão internacional estratosférica e a ser um emblema respeitado não só no futebol, mas em todo o mundo do desporto.

Estamos a falar daquele que é indubitavelmente o melhor dirigente desportivo de todos os tempos, e o seu legado irá perdurar no tempo.

Estarão os dirigentes de Benfica e Sporting a contribuir para um ambiente saudável no futebol português com estas atitudes pouco institucionais e igualmente um pouco injustificáveis? A minha resposta é novamente um contundente NÃO.


Pinto da Costa marcou presença no funeral do malogrado jogador húngaro Miklos Féher (num momento que ainda hoje nos arrepia sempre que o recordamos, dado o dramatismo do mesmo).

Naquele momento, as rivalidades foram postas de parte e se não me engano, Pinto da Costa esteve igualmente presente no funeral da figura maior do nosso futebol e do Benfica: Eusébio da Silva Ferreira.

Sim, Féher e Eusébio foram seguramente figuras mais consensuais do que o antigo dirigente portista, e não criaram tantos anticorpos durante o seu percurso desportivo.

Presente no funeral de Pinto da Costa, Paulo Futre (em alusão a este silêncio institucional de Benfica e Sporting), enalteceu o fato dos presidentes de Barcelona e Real Madrid terem ido ao funeral do Gil y Gil (mítico antigo presidente do Atlético de Madrid), numa altura em que a rivalidade entre esses clubes era muitíssimo maior do que alguma vez se viveu entre Benfica, Sporting e FC Porto no nosso país.

Não podemos comparar a rivalidade entre os nossos principais clubes com uma rivalidade visceral que se vive noutros países, como são o caso dos clubes argentinos Boca Juniors e River Plate.

Quando Diego Maradona morreu, vimos adeptos de ambos os clubes a abraçarem-se, gesto repetido quando a Argentina se sagrou campeã do mundo em 2022.

Nestes momentos, todos os envolvidos nesta indústria desportiva, deviam enterrar o machado de guerra por um bem comum. Contudo, como se costuma dizer, as atitudes ficam para quem as pratica.

Este desprezo institucional de Benfica e Sporting pode ser o combustível necessário para que a equipa de futebol (que vive uma época de transição e cujos recursos futebolísticos são escassos) cerre fileiras, e quem sabe, não provoque o mesmo silêncio ensurdecedor dos seus rivais com a conquista de mais um campeonato nacional.

A resposta que o FC Porto deve dar a esta atitude ultrajante e desrespeitosa dos seus principais rivais, tem que ser dada em campo, lutando arduamente até à última gota do seu suor por um clube que fez da garra, da mística e da entrega as suas principais imagens de marca sob a presidência de Pinto da Costa.

O mesmo silêncio ensurdecedor que se registou neste momento em que todos os corações portistas choram a morte de Pinto da Costa, o presidente dos presidentes.