O Meo Rip Curl Pro Portugal, que se realiza em Peniche desde 2009, começou em 15 de março e acabou no domingo, com a norte-americana Caroline Marks e o brasileiro Yago Dora campeões, e contou com milhares de fãs na Praia de Supertubos, mas são muito mais os que elegem Peniche como destino de férias, ou mesmo de residência, por causa das condições ímpares para a prática do surf.

Isto, porque a península de Peniche proporciona ondas para todos os gostos e níveis, possibilitando encontrar (quase) sempre uma praia em que a direção da ondulação e do vento é favorável. E se Supertubos, apelidada de 'Pipeline' da Europa, é a mais famosa, por acolher a prova de elite da Liga Mundial de Surf (WSL), as praias vizinhas da Consolação, do Baleal, do Lagide ou da Almagreira, entre várias outras, também atraem inúmeros surfistas.

A forte procura pelas apetecíveis ondas de Peniche tem um efeito proporcional na economia local, com o desenvolvimento da indústria do surf nos últimos 16 anos a ser acompanhado pela abertura de inúmeros restaurantes, cafés, bares, lojas, hóteis, alojamentos locais, escolas de surf, e diversos outros negócios, dinamizando a cidade que acolhe o porto de pesca mais ocidental da Europa continental.

"Quando anunciei que Peniche ia ser a 'capital da onda', a população não estava desperta para o potencial do surf, não tinha a consciência da importância de acolhermos uma prova do campeonato do mundo. Mas com o passar do tempo a comunidade de Peniche passou a perceber que, para além da pesca, o surf é, de facto, aquilo que mais promove nacional e internacionalmente o seu território, as suas atividades e os seus recursos", realçou à Lusa António José Correia, antigo presidente da Câmara Municipal de Peniche (2005 a 2017) e consultor da Fundação Oceano Azul.

Segundo um estudo do impacto sócio-económico do evento em Supertubos elaborado por Diogo Melo, estudante de mestrado do ISEG, Lisbon School of Economics & Management, que foi divulgado em outubro do ano passado pela WSL, o evento de Supertubos em 2024 implicou um investimento de 3,5 milhões de euros, gerando um retorno de 20 milhões de euros.

A 'fatia de leão' das receitas estimadas são relativas ao consumo de mercadorias e serviços durante as estadias para observar a competição que reúne os melhores surfistas do mundo, e que, na edição do ano passado atraiu 120 mil espetadores.

"Para mim, o que mais mudou desde que temos este campeonato foi a percepção de que a população de Peniche passou a ter sobre a questão do surf e do seu impacto nas suas vidas. Chegaram às famílias, muitíssimas famílias, os efeitos que beneficiaram muito os seus rendimentos", sublinhou 'Tozé' Correia, figura incontornável da história da prova de Supertubos e que, este ano, voltou a não perder pitada da ação.

Claro que o forte aumento de turistas, a maioria surfistas, nos últimos anos não é exclusivo de Peniche, com várias zonas da costa portuguesa a sentirem o impacto do surf, como a Ericeira, Costa de Caparica, Aljezur, Vila do Bispo, e a inevitável Nazaré, que não tem rival quando o assunto toca a ondas gigantes.

Mas a verdade é que Peniche é a única que recebe uma etapa do Championship Tour (CT) da WSL. E não é só a única em Portugal, é a única na Europa.

A distância de apenas uma hora de Lisboa também potencia o turismo naquela que é a 'bandeira' desportiva da Região do Oeste, que até já se 'esqueceu' da palavra sazonabilidade.

"Desde que o campeonato veio para cá, Peniche cresceu imenso. Antes era mais calminho, agora vem gente de todo o lado e durante todo o ano. Só o mês de janeiro é que é mais parado, de resto, está sempre cheio de surfistas, principalmente estrangeiros", lançou Joana Nazário, rececionista do Surfers Lodge, no Baleal.

Uma ideia partilhada por Mário Loureiro, dono do Riclé, o bar em Ferrel que acolheu a festa da Rip Curl, marca de surf que patrocina a prova de Peniche desde o início (2009), e que estimou que tenham passado cerca de 500 pessoas pelo espaço na noite de terça-feira (dia 18 de março).

"Antes o turismo era sazonal e agora é o ano todo. Aqui mais de 90% dos nossos clientes são estrangeiros. Felizmente, o que o surf nos trouxe foi trabalhar o ano todo", vincou.

Também Fernando Pereira, proprietário do restaurante Maresia, à entrada e Peniche, que tem três filhos, a Joana e a Maria, que trabalham com ele, e o Ricardo, que tem uma escola de surf, está rendido ao impacto da modalidade na zona.

"Sem dúvida nenhuma que o surf veio trazer uma alma muito mais enriquecedora à nossa cidade. A nível de negócio, claro que isto mexe muito e veio dinamizar muito as boas praias e as boas ondas que nós já tínhamos", realçou.

Já na aldeia do Lugar da Estrada, na freguesia da Atouguia da Baleia, a gerente do bar do Sporting Clube da Estrada, Filipa Costa, explicou que o impacto do campeonato na Praia do Medão Grande, agora conhecida mundialmente por Supertubos, é pequeno na coletividade durante os dias da competição, até porque a clientela, mais 'madura', liga mais ao futebol, mas que os surfistas também lá aparecem regularmente para comer uns petiscos de janeiro a dezembro.

"O campeonato não tem muito impacto, até porque estamos mais afastados, mas vêm cá surfistas durante o ano inteiro surfar à Consolação e, como já me conhecem, vão trazendo amigos e, por isso, temos cá muitos surfistas", revelou, comprovando a teoria de que há mais 'vida' em Peniche além da prova mundial.

Ou seja, o Meo Rip Curl Pro Portugal pode só voltar para o ano, mas há surf em Peniche todos os dias.

*** Diogo Nunes, da agência Lusa ***

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