Candidato à compra da TAP desde o governo de António Costa, o grupo IAG mantém interesse na privatização da transportadora portuguesa, mas aguarda pelo caderno de encargos para decidir se avança, não esconde a preferência pela compra de uma posição maioritária e a totalidade dos direitos económicos, porque considera ser mais eficiente e melhor para a estratégia comercial, mas não fecha a porta à compra de uma participação minoritária.
Num encontro com jornalistas portugueses em Dublin, sede da Aer Lingus, subsdiária da IAG, a gigante europeia desdramatizou a proximidade do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, do aeroporto de Barajas, em Madrid, assegurando que está na sua estratégia global manter e desenvolver os hubs (plataforma giratória de distribuição de voos) das companhias que compra, dando como exemplo o caso da antiga empresa de bandeira irlandesa, que já mais que duplicou de tamanho desde que foi comprada pela IAG em 2015.
"Antecipamos que o governo português queira proteger o hub e encorajamos isso", assegurou Jonathan Sullivan, administrador e Chief Corporate Affairs Office (CCAO) da IAG, uma das pessoas da equipa do grupo anglosaxónico e ibérico que já reuniu com o governo português e a equipa do Ministério das Infraestruturas, para mostrar o interesse em participar na privatização da TAP. "Dublin é mais perto de Londres do que Lisboa é de Madrid". Sullivan puxou do mapa para mostrar que Lisboa fica mais longe de Madrid, do que Dublin de Londres, com as capitais de Portugal e Espanha a distarem 514 quilómetros, e as da Irlanda e a Inglaterra 450 quilómetros. Mostrou também que os hub de Paris e Amesterdão, ambos dos grupo Air France/KLM, ficam à distância de 420 quilómetros (KM). E que no caso da Lufhansa, por exemplo, Bruxelas fica 360 km de Frankfurt e Zurique a 261 km.
"O hub de Lisboa é um ativo estratégcio para a TAP. Queremos que esse ativo cresça. Essa é a única coisa que faz sentido para o negócio. Eu não consigo imaginar mais nada", afirmou Jonathan Sullivan quando questionado sobre os risco de desaparecimento do hub da transportadora portuguesa, face à proximidade do aeroporto de Barajas, uma infraestrutura com espaço para crescer, em claro constraste com os constrangimentos do Humberto Delgado. O gestor não teme aliás que o crescimento da TAP possa ser travado por isso. Há sempre formas de crescer, defende, apontando para o uso de aeronaves maiores.
"O hub é muito importante. O que se ouve hoje da Aer Lingus é que o desenvolvimento do hub de Dublin fez da Aer Lingus um bom negócio e tornou-o mais resiliente. Temos muito orgulho em desenvolver hubs", frisa. A manutenção do hub a Aer Lingus em Dublin, foi uma das exigências do governo inglês, que na carta de compromissos assinada com a IAG, obrigava à sua manutenção por sete anos.
Aposta no Brasil e nos EUA é para manter
Com uma quota de mercado a rondar os 4% no mercado brasileiro - bem distante dos quase 30% da TAP -, o mercado brasileiro é um dos trunfos da privatização. A IAG não se alonga muito em comentários sobre a relevância deste mercado numa futura compra, mas sublinha a sua importância, e afirma que se comprasse seria para manter e reforçar, tal como os EUA, onde o multinacional britância é fortíssima.
" Brasil é parte da conectividade da hub, dada a sua posição geográfica única e as longas conexões culturais entre o mundo de falantes de português e Portugal. E o recente e muito bom crescimento do mercado no EUA é um ótimo ativo, não se pode deitar fora é uma coisa boa", salienta.
Desenvolver os hubs, fazer crescer as rotas e a frota, manter a independência das marca e da cultura é a receita que o grupo IAG tem usado nas companhias que compra e que gostaria de aplicar à TAP, assegura Jonathan Sullivan. Foi esse o compromisso assumido com a Aer Lingus, que explica Donal Moriarty, antigo CEO da companhia irlandesa e Chief Corporate Affairs Officer, adiantando que foi criada a figura da "Share B", que dá ao Estado poder de intervir em questões estratégicas.
"O interesse do IAG é desenvolver mais TAP. Gostaríamos de nos envolver com a TAP mantendo-se como uma empresa orgulhosamente portuguesa, como a Aer Lingus é orgulhosamente irlandesa e a British Airways é orgulhosamente britânica. E ficar assim para sempre", frisa Sullivan. Acrescentando: "Criámos estruturas de propriedade por forma a garantir que todas as companhias do nosso grupo mantém a nacionalidade numa perspectiva de controle. A IAG ajuda a trazer a escala para as companhias, permitindo-lhe fazer negócios juntos à volta do mundo. É a cooperação entre as várias companhias do grupo permite que os negócios se tornem maiores e melhores ao longo do tempo".
A IAG quer vir a jogo. "Se as condições [do caderno de encargos] o permitirem participaremos no processo [de privatização], e teremos a oportunidade de melhorar a TAP", diz o gestor. Apontando: "Podemos cooperar comercialmente, o que significa que podemos planear juntos as redes, podemos pagar juntos combustível, partilhar inventário".
Não ter a maioria é um obstáculo para a IAG? Pode desistir por causa disso? Ou oferecer menos dinheiro? Jonathan Sullivan não se compromete. "Vamos ter de refletir, porque é apenas uma hipótese agora. É preciso entender a proposta como um todo".
A IAG não quer pressionar o Governo com datas e metas. "Estamos à espera do tempo do governo português. Estamos a esperar pacientemente. Deixemos o governo fazer o que tem de fazer. Isso é muito importante para Portugal. Não há pressão de tempo para vender este negócio. E isso é bom, porque o governo pode ser cuidadoso e garantir o que é melhor para Portugal".
Mais forças que fraquezas
A IAG prefere olhar mais para a força da TAP do que para as suas fraquezas. "Honestamente não posso dizer [quais são as fraquezas], não olhei profundamente e o suficiente para o negócio. Podemos dizer quais são as forças, é um hub fantástico, uma frota relativamente nova, grandes conexões".
E os atuais gestores? "Fizeram um bom trabalho. Trouxeram o negócio de volta ao lucro, depois da maior e mais difícil crise na história da aviação".
Cotada nas bolsas de Londres e Lisboa, a IAG destaca-se pelo desempenho positivo no mercado de capitais e pela margem de Ebitda de quase 12%, uma das mais elevadas do setor. Com sete empresas no portfólio, cinco delas companhias aereas - British Airways, Iberia, Vueling, Aer Lingus e Level -, a IAG tem 580 aviões, cobre mais 250 destinos e tem mais de 70 milhões de trabalhadores.
Em 2015, quando a IAG comprou a Aer Lingus, a companhia era cotada em bolsa, o Estado tinha uma participação de 25% e a Ryanair, o principal competidor, era também acionista com 25% do capital.
A jornalista viajou para Dublin e visitou a sede da Aer Lingus a convite da IAG