É na “Princesa do Alentejo”, Vila Nova de Milfontes, que damos início a um périplo, a pé ou de bicicleta, pelo concelho de Odemira. Propomos seguir até ao Almograve, ao longo de uma das 13 etapas do Trilho dos Pescadores que perfaz 226,5 km, quase na totalidade ao longo do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. Integrado na Rota Vicentina, que se estende de Sines a Lagos, é considerado “um dos melhores percursos costeiros do mundo” e é no concelho de Odemira que se encontra a maior oferta de percursos da Rota Vicentina. O Trilho dos Pescadores, que decorre sempre junto ao mar seguindo os caminhos usados pelos habitantes locais para acesso às praias e pesqueiros, é um dos mais belos da costa alentejana. Sempre que iniciar uma caminhada deve ter água, calçado confortável, proteção solar e chapéu e, naturalmente, se possível, partir bem cedo para evitar as temperaturas mais elevadas.
Um ponto de partida bem fresquinho inclui paragem na geladaria San Pietro (Tel. 924036661), pelas 08h30, para um gelado artesanal, um sorvete, ou um sumo natural. O contacto com o vento do mar, a paisagem costeira e a natureza selvagem e persistente são uma constante neste percurso e renovam a alma de quem o vivencia. Esta é uma sugestão, para um início suave, acessível, que permite contemplar a foz do rio Mira, a vila e as encostas cobertas por matos mediterrâneos que produzem bastantes bagas e atraem aves e pequenos mamíferos. Com passagem pela ponte sobre o rio Mira, com margens ladeadas pela vegetação, deixa ver uma entrada única no Atlântico. Ao longo das curvas do rio, na maré vazia, nos sapais, onde a vegetação abunda e a salinidade é elevada, cruza-se com juncais, caniçais e prados húmidos. É uma oportunidade para trincar uma salicórnia salgadinha acabada de colher. Perceba as espécies piscícolas, os moluscos e crustáceos que ali vivem, algumas são quase únicas. A foz deste rio e a sua vegetação é aproveitada por muitos peixes para a sua proteção quando estão na desova.
Entre Almograve e a Zambujeira do Mar
De março a outubro observam-se os andorinhões, um belo espetáculo da natureza. Este rio, nascido na serra do Caldeirão, é fonte de recursos para os locais, em Vila Nova de Milfontes e todos os pontos do seu curso. Além de motivo para passeios de barco e prática de desportos aquáticos, é nele que acontece a captura de muitos peixes nobres, através da pesca artesanal, uma atividade que afeta fortemente o turismo, ao levar as mesas o peixe de qualidade afamada. Chegado ao Almograve, aldeia erguida entre o mar e a planície, com praia homónima a cerca de 500 metros. Despois de um mergulho, faça o percurso circular das dunas do Almograve, acompanhe a ondulação dunar e pasme perante a geomorfologia na Foz dos Ouriços. No troço mais interior do Trilho dos Pescadores, encontra um caminho povoado de charcos temporários, um mundo de observação de habitats singulares, integrados no âmbito da proteção do Parque Natural, assim como acontece com a área do cágado-de-carapaça-estriada. Para não perder pitada, siga pela pista de terra até ao portinho de Pesca da Lapa das Pombas e aproveite o miradouro.
Passeios a cavalo e cegonhas nas falésias
Rume ao sul, descubra portinhos de pesca artesanais, dunas avermelhadas, ninhos de cegonhas em falésias, num caminho perfumado pela brisa do mar e pelos pinhais. As falésias altas e escarpadas deste troço de 22 km que integra o Trilho dos Pescadores, apesar de expostas ao vento salgado e teimoso do mar, são locais escolhidos para nidificação por mais de 20 espécies de aves. É o caso da gralha-de-nuca-cinzenta, do corvo-marinho-de-crista, do falcão-peregrino e da cegonha-branca, que elegeu as escarpas do cabo Sardão para “constituir família”, sobre o mar, como não acontece em mais lado nenhum no planeta. Tente vigiar a falésia e apreciar o voo destas aves. Visite o farol centenário. Ao passar pela aldeia de Cavaleiro, carregue baterias no snack-bar Adélia (Tel. 962298632), sinta o ambiente de um refúgio de beira-de-estrada, onde se reúnem locais e caminhantes. Está aberto todos os dias a partir das 6h00 e prepara tostas em pão alentejano além dar a provar a famosa batata-doce do Cavaleiro. Faça um passeio a cavalo junto ao Cabo Sardão com Filipe Serralha (Tel.964053824). Termine a caminhada com uma massagem de recuperação com a Stress Free Zone (Tel. 963059956).
Por aqui andou o elefante europeu
“Ver, ouvir, saborear um outro Sul” é um programa de exploração dos sentidos, na Casa do Lado (Tel. 919968116), uma unidade de Bed & Breakfast gerido por uma família de Vila Nova de Milfontes. A experiência consiste na estadia neste alojamento juntamente com o usufruto de duas atividades proporcionadas pela própria família. A Mariana cozinha um jantar surpresa com os produtos locais e sazonais, e a Paula proporciona uma caminhada guiada pela costa, com cerca de 5km. Junto à Praia do Malhão pode ver os vestígios do Elephas antiquos, o elefante europeu entretanto extinto. Na manhã seguinte, a degustação dos sabores tradicionais continua ao pequeno-almoço, pão, compotas, sumos frescos de fruta com um toque da brisa da manhã. As plantas medicinais e aromáticas são também motivo para partir com a Hike In Alentejo (Tel. 961298880)) pela serra de São Domingos, até ao cimo da montanha, e a aldeia de São Luís. A flora envolve e relaxa os caminhantes enquanto ficam a conhecer diversas plantas medicinais e algumas plantas comestíveis. A bióloga guia identifica e ensina como utilizar estas preciosidades na preparação de remédios caseiros e pratos culinários. Chegados ao ponto mais alto do Parque Natural Sudoeste Alentejo e Costa Vicentina, os caminhantes são presenteados com uma vista sobre campos floridos, florestas e montes até ao mar azul. Aproveite para visitar a aldeia de São Luís, o Mercado Municipal, as várias ermidas, o lavadouro, assim como dois moinhos de vento recuperados, o da Lage e o da Agonia. Para um mergulho refrescante, siga até às piscinas naturais de Pego das Pias, formadas pelo curso de água da ribeira do Torgal e pela erosão das rochas. Este é um passeio que permite contactar com o modo de vida rural, percorrendo caminhos de terra através de montados e planícies, vislumbrar os habitantes locais a cuidar dos animais até chegar ao riacho que forma lagos naturais de tirar o fôlego. Toca a aproveitar para dar mergulho refrescante. A Finn’s Routes(Tel. 965794525) pode guiar este passeio.
O espelho de água de Santa Clara-a-Velha
Associados à Rota Vicentina estão assinalados diversos percursos circulares. Com grau de dificuldade baixo e distâncias até 16 km, é possível explorar o território de Odemira, entre o litoral e o interior do concelho. Um percurso circular de 10 km, parte da pacata aldeia de Santa Clara-a-Velha, com a albufeira homónima e a ribeira, nome localmente dado ao rio Mira, como protagonistas da caminhada. Pode também optar por fazer esta experiência de BTT. O concelho de Odemira inclui mais de 1000 km de percursos cicláveis, comportando cinco núcleos localizados em Santa Clara, na vila de Odemira, onde encontra, à beira-rio, o Centro de Cyclin’Portugal, estrutura de apoio a ciclistas na Costa Alentejana e Vicentina, e em São Teotónio, São Luís e Colos.
Ao avistar um grande lago na imensa serra do vasto concelho de Odemira a surpresa é total. A presença constante da água e as vistas desafogadas sobre um Alentejo montanhoso fazem deste passeio até à Barragem de Santa Clara um deleite para o olhar. Foi concebida para beneficiar cerca de 12.000 hectares de terreno, embora sirva também o consumo público. Mandada construir pelo Estado Novo, a albufeira é uma das maiores da Europa. No percurso junto ao rio, a jusante da barragem, a vegetação ribeirinha inclui acácia, mimosa, choupo, freixo, salgueiro, juncos e atabuas. Os agriões e o poejo, plantas usadas na gastronomia local formam um tapete nos troços menos profundos do rio enquanto os mais profundos estão cobertos por nenúfares. Nos terrenos mais férteis, há hortas e pomares de laranjeiras, figueiras e oliveiras. As aves aproveitam estes bons habitats para alimentação e nidificação, embora a primazia caiba à pega-azul, localmente designada de charneco. Tome um banho refrescante na praia fluvial da Barragem, passeie de barco ou faça canoagem. A aldeia de Santa Clara merece uma paragem com tempo. É quase obrigatório conhecer e adquirir produtos locais únicos, como o excelente mel e a aguardente da Clara Medronho (Tel. 912581175), projeto com raízes locais e familiares. À entrada da aldeia, sugere-se uma paragem na fonte do Azinhal, datada de 1892, ótimo local para piqueniques e com água de excelente qualidade.
São Luís, São Martinho das Amoreiras e São Teotónio
Termine esta viagem de descoberta com uma caminhada fácil, um percurso circular que dá a conhecer as hortas e quintais da aldeia de São Luís e a magia de uma floresta de sobreiros. São Luís foi sempre uma aldeia rica em recursos, fossem mineiros, na serra de São Domingos, a extração da cortiça ou o comércio a partir do porto fluvial da Casa Branca. Forneceu de produtos agrícolas a Vila Nova de Milfontes, cuja população se dedicava inteiramente à pesca. Atualmente é conhecida pela recuperação de uma prática antiga, a construção em taipa. Se subir à Serra de São Domingos, acrescenta 4 km ao percurso. Prepare-se para um passeio pelo ponto mais interior da Rota Vicentina, assim como o ponto mais alto, o sítio do Moinho da Serra. Conheça a pitoresca aldeia de Odemira, São Martinho das Amoreiras, famosa pelo pão cozido a lenha de esteva, tido como um dos melhores do Alentejo, e prove as doces Alcôncoras de Amoreiras.
A 7 km a sudoeste da aldeia, descubra a estação arqueológica Necrópole do Pardieiro, que desvendou algumas características da comunidade que ali habitou há 2500 anos. Junto dos onze túmulos da necrópole encontraram-se estelas epigrafadas, ou seja, lajes de pedra com inscrições na escrita do Sudoeste, a primeira forma de escrita alfabética na Península Ibérica. Conheça a outra face de São Teotónio num percurso circular pela charneca, onde é possível sentir o modo de vida mais tradicional do sudoeste português. No outono há medronhos para apanhar, mas pelas bermas do caminho as plantas vão florindo à vez ao longo do ano. Depois do medronheiro, surgem o rosmaninho, as perpétuas-das-areias, urzes, tojos e orquídeas selvagens. Algumas destas plantas são usadas popularmente para curar maleitas, como é o caso do fel-da-terra, que acaba rapidamente com as ressacas. Nos campos abertos, aprecie as rapinas a caçar ou o canto das petinhas. Nos caminhos de terra ou lama, repare nas pegadas das raposas, ginetas, texugos e saca-rabos. Nas zonas húmidas, mora o único roedor protegido da Europa, o rato-de-cabrera. Nos matos, a terra revolvida é sinal de que o javali andou por ali. O trilho atravessa o Barranco de Água de Peixe, com a galeria de salgueiro e carvalho-português. Na travessia desta linha de água, observe os dejetos e pegadas de lontra, que ali pesca no recato do crepúsculo.
Caminho Histórico
Em paralelo ao Trilho dos Pescadores, a Rota Vicentina apresente o Caminho Histórico, com etapas em São Luís, Odemira, Santa Clara e São Teotónio. Este percurso tem um total de 263 km, “para fazer devagar, ao sabor da vida no campo”. Percorre as principais vilas e aldeias num itinerário rural com vários séculos de história. Constituído maioritariamente por caminhos rurais, trata-se de uma clássica Grande Rota (GR), com troços de montado, serra, vales, rios e ribeiras, numa viagem pelo tempo, pela cultura local e pelos trilhos da natureza. O percurso está homologado pela Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal e integra a GR11/E9, ligando Sagres a São Petersburgo.
Saiba mais sobre a oferta de percursos pedestres na página do Turismo de Odemira.
Para a produção desta reportagem a equipa Boa Cama Boa Mesa contou com o apoio da Câmara Municipal de Odemira.