O carbono negro é um dos poluentes mais antigos da História, com impacto devastador na saúde, no clima e nos ecossistemas. Da atmosfera saturada em cidades asiáticas ao degelo do Ártico e dos glaciares dos Himalaias, é um superpoluente omnipresente.

“É o poluente mais antigo do mundo. O primeiro humano que domesticou o fogo na sua gruta respirou carbono negro”, disse à AFP Xavier Mari, biogeoquímico, diretor de investigação do Instituto de Investigação para o Desenvolvimento (IRD) em Banguecoque.

O carbono negro ou fuligem é formado durante a combustão incompleta de biomassa (madeira, resíduos verdes) ou de combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás).

Provém do aquecimento doméstico e da cozinha (43% das emissões globais), dos transportes (23%) e da indústria (11%), contribui para a poluição atmosférica. Desde a Revolução Industrial, as emissões deste poluente aumentaram dez vezes, embora tenham registado uma ligeira redução desde o pico na década de 2010.

Embora permaneça na atmosfera apenas cerca de 12 dias, o carbono negro afeta gravemente a saúde, sobretudo das populações do Sul da Ásia e em África.

“São partículas finas que penetram profundamente nos pulmões”, alerta Bertrand Bessagnet, gestor de qualidade do ar no ICIMOD, no Nepal. Estas partículas estão associadas a problemas graves, como doenças cardíacas e cancro do pulmão.

Vários estudos realizados ao longo dos anos têm demontrado a relação entre a poluição e doenças cardíacas bem como um aumento de 30% no risco de cancro do pulmão, num estudo do Inserm francês publicado em 2021.

Com 1.500 vezes mais poder de aquecimento que o CO2

Nocivo para a saúde, o carbono negro tem também um poder de aquecimento até 1.500 vezes superior ao do dióxido de carbono (CO2), segundo a Coligação para o Clima e o Ar Limpo (CCAC)do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP).

“Devido à sua cor preta, estas partículas absorvem luz e armazenam-na como calor” , explica Xavier Mari.

Este efeito amplifica o degelo em zonas sensíveis como os Himalaias, os Alpes e o Ártico. Levada pelo vento, o carbono negro deposita-se no topo dos glaciares dos Himalaias e chega até aos polos. Uma vez cobertas de fuligem, estas superfícies normalmente brancas perdem o seu efeito albedo, ou seja, a sua capacidade de refletir a radiação solar.

Nos Alpes franceses, por exemplo, o "carbono negro", combinado com as poeiras do Saara, acelera o degelo: este fenómeno reduziu a duração da cobertura de neve em 17 dias nas últimas quatro décadas. Antecipa também o pico do degelo da primavera, de acordo com um estudo publicado em 2022 naNature Communications.

“São apenas necessárias pequenas quantidades de carbono negro para que haja um impacto na cor da neve e, portanto, no degelo”, explica Marie Dumont, chefe do centro de estudos de neve (CNRS/Météo France) e co-autora do estudo.

Este degelo precoce “perturba o equilíbrio dos frágeis ecossistemas montanhosos” e pode também ter repercussões na agricultura e na produção hidroeléctrica.

Carbono negro contamina todos os oceanos do mundo

O carbono negro não se limita à atmosfera ou ao gelo: é também um poluente significativo dos oceanos. Segundo Sian Prior, conselheiro da Aliança Ártica Limpa (CAA), as emissões de carbono negro pelos navios de cruzeiro têm "um impacto desproporcional" no degelo marinho do Ártico.

Esta aliança que junta 23 ONG apela à adopção de regulamentos vinculativos, a fim de reduzir drasticamente as emissões de "carbono negro" dos navios que navegam no Ártico.

O carbono negro contamina todos os oceanos do mundo. Anualmente, a quantidade de carbono negro que chega aos oceanos é entre duas e dez vezes superior à massa de plástico que entra nos mares. Este poluente compromete a eficiência do mecanismo que armazena CO2 a longo prazo nos oceanos.

Pior ainda, o carbono negro entra na cadeia alimentar, desde o zooplâncton até aos mamíferos e foi detetado até em bebés recém-nascidos, pois atravessa a placenta.

Europa dá o bom exemplo

Apesar do cenário preocupante, há sinais de progresso. Na Europa, as emissões de carbono negro diminuíram significativamente desde a década de 2000, o que ajudou a mitigar, em parte, o impacto do aquecimento global no derretimento da cobertura de neve.