"Não fecha a porta", gritavam os eleitores à porta de uma das seis mesas da assembleia de voto instalada na Escola Secundária Noroeste 1, subúrbios de Maputo, enquanto um agente da polícia tentava serenar os ânimos de quem ansiava entrar para votar, por entre uma longa e desorganizada fila.

Eram já 19:00 (menos uma hora em Lisboa) - as urnas fechavam oficialmente às 18:00 - e resistiam os eleitores, envolvidos pela escuridão do exterior da escola, de cartão e senhas na mão, estas distribuídas pelos membros da mesa de voto a quem tinha entrado até à hora legalmente prevista.

Os que chegaram depois da hora contestavam, entre gritos, empurrões e até algumas ameaças, à procura de uma senha, enquanto os membros da mesa, de lanterna na mão, conferiam as senhas de quem entrava para, finalmente, votar.

"Só a esta hora é que estou a conseguir", explicou à Lusa Castro Sardinha, desempregado de 46 anos, orgulhoso. Passava das 19:00 e foi a terceira e derradeira tentativa que fez ao longo do dia para votar, devido à forte afluência que encontrou e que parecia crescer a cada hora.

"Três vezes que estou aqui, ir e voltar", descreveu, para logo depois assumir, ao guardar o cartão de eleitor e a senha que tinha recebido: "Estou feliz".

Uma espera que para Castro Sardinha teve um sentido: "Esperamos que isto mude. O desespero está a partir o coração".

As mesas de votação nas eleições gerais moçambicanas, incluindo a escolha do novo Presidente da República, começaram a encerrar às 18:00 (17:00 em Lisboa), seguindo-se um período de até 15 dias para serem conhecidos os resultados nacionais.

Na escola do bairro Noroeste 1, a longa fila de Castro era partilhada com Manuel Taulo, negociante de 34 anos que chegou ainda era dia. Na mão guardava a senha com o número 100: "Estamos aqui na fila a exercer o nosso direito. Temos a esperança".

Essa esperança concretizou-se uma hora e quarenta minutos depois do fecho oficial das urnas. Eram 19:40 e dezenas ainda aguardavam na fila pelo mesmo.

"Muita gente aqui à espera, muita gente. Estão com surpresa, porque têm vontade de exercer o direito de votar", admitia.

Dêncio Marques, alfaiate de 28 anos, também recebeu senha para votar depois da hora, porque chegou, depois de sair do trabalho, antes do fecho oficial.

"Muita gente quer votar para ver se as coisas mudam", descreveu, convicto que chegaria o momento de entrar para a sala de aula, convertida em mesa de voto no dia de hoje.

"Estamos aqui na fila e estamos quase a entrar e vamos votar", garantia, já quase a entrar.

A mesma sorte não teve Dânia Cossa, atleta profissional de 23 anos. Foi ajudar a família durante o dia e só regressou a casa ao final da tarde, mas ainda tentou.

"Vi a hora e vi que ainda dava para me aproximar", começou por explicar. Chegou às 18:30 à porta da sala e ficou de fora, sem direito a senha.

"Estou muito triste por isso (...) vinha com esperança", relatou, assumindo a frustração por falhar o voto, pela primeira vez: "Não um bocadinho [frustrada], muito mesmo. Porque eu queria tanto".

As eleições gerais de hoje incluíram as sétimas presidenciais - às quais já não concorreu o atual chefe de Estado, Filipe Nyusi, que atingiu o limite constitucional de dois mandatos - em simultâneo com as sétimas legislativas e quartas para assembleias e governadores provinciais.

Na Escola Secundária Noroeste 1, iniciou-se de seguida, com largo atraso, o longo processo de contagem de votos, um a um, noite fora.

Concorrem nesta eleição à Presidência da República Lutero Simango, apoiado pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM, terceira força parlamentar), Daniel Chapo, com o apoio da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder desde 1975), Venâncio Mondlane, apoiado pelo partido extraparlamentar Podemos, e Ossufo Momade, com o apoio da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo, maior partido da oposição).

A publicação dos resultados da eleição presidencial pela Comissão Nacional de Eleições, caso não haja segunda volta, demora até 15 dias, antes de seguirem para validação do Conselho Constitucional, que não tem prazos para proclamar os resultados oficiais após analisar eventuais recursos.

A votação incluiu legislativas (250 deputados) e para assembleias provinciais e respetivos governadores de província, neste caso com 794 mandatos a distribuir. A CNE aprovou listas de 35 partidos políticos candidatas à Assembleia da República e 14 partidos políticos e grupos de cidadãos eleitores às assembleias provinciais.

 *** Paulo Julião (texto), Estevão Chavisso (vídeo) e José Coelho (fotos) ***

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