Na semana em que decorre em Lisboa o Colóquio Internacional “Cruzamentos Galiza-Portugal: Redes migratórias e culturais” (dias 10 e 11 de abril na Universidade Nova de Lisboa), o podcast Histórias de Lisboa reflete sobre a diáspora galega na capital portuguesa. Ao longo de várias décadas, os galegos marcaram presença nas esquinas das ruas da capital, em busca de algum tipo de trabalho: “Antes de haver motor de combustão, sempre que não havia um cavalo, havia um galego!”, diz Carlos Pazos-Justo, professor da Universidade do Minho.

“Os galegos que vinham para Lisboa não eram doutores; eram carregadores, moços de fretes, moços de recados, aguadeiros”, trabalhadores braçais que, em parte, substituíram a mão de obra escravizada e supriram as necessidades de uma cidade ainda em recuperação dos efeitos devastadores do terramoto de 1755. Ao mesmo tempo, fugiam das condições das terras de origem, com principal destaque para uma faixa que acompanha a norte a fronteira portuguesa do Minho e Trás-os-Montes. “Fugiam de uma sobrepopulação impulsionada pelo cultivo do milho das Américas trazido para a Europa nos séculos anteriores, mas também da conjugação de outros fatores, como a fuga à tropa, o chamado ‘salto galego’”, diz Pazos-Justo.

José Fonseca Fernandes

Essa migração massiva da Galiza para Lisboa atingiu as dezenas de milhares de galegos ao longo dos séculos XIX e XX, e cedo provocou impacto na cidade, pelo facto de “passarem grande parte do tempo nas ruas à espera de trabalho, pelas vestimentas e pelo sotaque característico”. Rapidamente, se tornaram vítimas de estigmatização e de provérbios insultuosos, entre os quals “trabalhar como um galego” é até o mais brando: ditados como “‘abaixo de galego só o burro’ ou ‘cinquenta galegos não fazem um homem’ foram o reflexo de uma situação social desfavorável comparável hoje aos vendedores da Uber ou da Glovo atuais”, diz o professor universitário.

José Fonseca Fernandes

Com o tempo, alguns galegos conseguiram ascender socialmente, trocando os trabalhos mais penosos por outros, tornando-se, por exemplo, proprietários de tascas. Alguns desses espaços virão a tornar-se famosos, como café Martinho ou os restaurantes Irmãos Unidos e o Gambrinus. São os chamados “lisboanos”, que também criam instituições para proteger os concidadãos lisboetas menos afortunados. Muitos nunca cortaram as ligações com as regiões galegas de origem, todos contribuem para enriquecer a cada vez mais complexa sociedade lisboeta (e portuguesa) dos últimos dois séculos.

O episódio desta semana das Histórias de Lisboa relembra “A minoria mais minoritária: os Galegos em Lisboa”.

SIC Notícias

Histórias de Lisboa é um podcast semanal do jornalista da SIC Miguel Franco de Andrade com sonoplastia de Salomé Rita e genérico de Nuno Rosa e Maria Antónia Mendes.

A capa é de Tiago Pereira Santos em azulejo da cozinha do Museu da Cidade - Palácio Pimenta.

Ouça aqui as ‘Histórias de Lisboa’: