A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, afirma que houve “desleixo, facilidade, irresponsabilidade e falta de comando” e que foi isso que levou à fuga de cinco reclusos do estabelecimento prisional de Vale de Judeus. A ministra anuncia, por isso, que aceitou a demissão do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais e que este será substituído por Isabel Leitão, até aqui subdiretora-geral. Foram também ordenadas uma “auditoria urgente aos sistemas de segurança" de todas as prisões do país” e uma “auditoria de gestão” ao sistema prisional.

Esta foi a primeira vez que a governante se pronunciou sobre a fuga dos cinco reclusos, ocorrida no passado sábado. “Só agora entendo ser o momento de falar”, declarou a ministra, justificando que “falar por falar" não é o seu “timbre” e que quis “dar espaço à investigação”.

Para a ministra, a fuga em causa “é de uma gravidade" que não se pode “desculpar”, em nome da ”segurança da população, da confiança no funcionamento das prisões, do Estado de Direito e da reputação do país".

A governante retira, desta fuga, três conclusões essenciais. A primeira é que houve “uma cadeia sucessiva de erros e falhas graves, grosseiras, inaceitáveis”, que não quer que se voltem a repetir.

A segunda conclusão é que a fuga “foi orquestrada”. "Não resultou do aproveitamento de uma distração”, explica. "Foi um plano preparado com tempo, com método e com ajuda de terceiros.

Finalmente, a ministra conclui que a recuperação da confiança no sistema prisional vai exigir "a responsabilização a vários níveis e o reforço da fiscalização ao sistema prisional”.

As conclusões

Perante os resultados da averiguação dos factos feita, a ministra da Justiça confirmou que aceitou a demissão do até aqui diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, assim como do subdiretor geral que tinha o pelouro dos estabelecimentos prisionais. A liderança da Direção-geral de Reinserção e Serviços Prisionais vai ser assumida, em regime de substituição, por Isabel Leitão - que até aqui era subdiretora geral.

Foi também ordenada uma auditoria urgente aos sistemas de segurança “de todos os 49 estabelecimentos prisionais do país”. Vai ficar a cargo da Inspeção-Geral dos Serviços de Justiça e os resultados vão ser apresentados até ao final do ano.

Além disto, será também feita uma “auditoria de gestão” ao sistema prisional, para avaliar “a organização e afetação de recursos” em todos os estabelecimentos prisionais do país. Esta será uma investigação “mais demorada”, para ajudar o Governo a decidir “mudanças que se imponham”, explica Rita Alarcão Júdice.

“Aguardo o desfecho de outras investigações em curso e do processo de auditoria que está a ser levado a cabo pelo Serviço de Auditoria e Inspeção, da DGRSP, cujo trabalho deverá estar concluído dentro de um mês”, acrescentou ainda a ministra.

A governante sublinha que não hesitará em avançar com “processos disciplinares ou penais”, se eles se revelarem necessários, na sequência desta fuga.

“Falta de comando”

A ministra da Justiça considera que, estando 35 elementos escalados (33 guardas prisionais, mais dois chefes de equipa) e o sistema de videovigilância operacional (com o responsável pela monitorização das imagens no posto), no momento da fuga, o episódio vem revelar "desleixo, facilidade, irresponsabilidade e falta de comando”.

“Também vimos decisões erradas ou ausência de decisões nos anos mais recentes”, sublinhou Rita Alarcão Júdice, sugerindo alguma responsabilidade do anterior Executivo pelas condições em que o sistema prisional e o Ministério da Justiça foram deixados.

A governante explica que o relatório da auditoria feita vai manter-se “reservado e confidencial”, tendo exposto uma “sucessão de fragilidades” que não será conhecida, “para salvaguardar as investigações em curso e a própria segurança”.

A cronologia da fuga

Rita Alarcão Júdice adianta que, de acordo com o relatório de auditoria à atuação dos serviços de vigilância e segurança, a fuga “demorou seis minutos” e foram usados recursos - “duas escadas” - que não existiam no interior do estabelecimento prisional.

A ministra revelou também que, entre as manobras de aproximação dos cúmplices e a deteção da fuga decorreram 65 minutos.

Entre o início da fuga e a comunicação à polícia criminal competente (no caso, a GNR) demoraram 83 minutos.

É possível estabelecer a seguinte cronologia dos acontecimentos:

às 9h55: começa a operação de fuga dos cinco, “com a intrusão de três indivíduos” no perímetro externo da cadeia;

às 9h57: começa a evasão dos reclusos;

às 10h01: o último recluso em fuga ultrapassa a vedação exterior da cadeia;

às 11h00: a fuga é detetada por dois guardas;

entre as 11h04 e as 11h08: o alerta é dado a toda a corporação;

às 11h10: o diretor da cadeia de Vale de Judeus é informado;

às 11h18: é dado o alerta à GNR;

às 11h19: é informada a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais;

às 12h00: o diretor da cadeia confirma à Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais a identidade dos cinco reclusos;

às 12h30: os serviços centrais e a ministra são informados da fuga.

Uma mensagem aos guardas prisionais

A ministra da Justiça concluiu a declaração com palavras dirigidas aos guardas prisionais, a quem diz que o atual ministério “abriu as portas”.

"Negociámos, durante várias semanas, o aumento do suplemento que tanto reclamavam. Estamos a rever o modelo de avaliação de desempenho, como prometido no acordo que assinámos a 10 de julho”, recordou a governante.

Em troca, diz Rita Alarcão Júdice, o país espera dos guardas prisionais “dedicação, profissionalismo e rigor no cumprimento das suas funções”.

"Acredito que vão corresponder às nossas expectativas”, rematou a ministra, garantindo que mantém a confiança nas forças de segurança.

As explicações da governante são dadas já depois de se saber da demissão do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Rui Abrunhosa Gonçalves.

A governante recebeu, esta manhã, o relatório de auditoria à atuação dos serviços de vigilância e segurança, elaborado pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP).