A atenção da União Europeia está voltada para as ameaças externas à democracia: desinformação, autoritarismo, interferência estrangeira. No entanto, continua a ignorar uma grande vulnerabilidade interna, que os setores antidemocráticos compreenderam e exploraram durante anos: o historial da UE em matéria de inclusão e direitos das minorias.

Os Roma, a maior minoria étnica da Europa, continuam a enfrentar uma exclusão sistemática. Em Itália, mais de 15 mil cidadãos Roma vivem em habitações irregulares, vulneráveis a despejos forçados. Na Eslováquia, um sistema educativo descrito como um apartheid empurra as crianças Roma para a pobreza. Também a Hungria foi alertada para a discriminação dos Roma nas suas escolas. Entretanto, o inquérito da Agência dos Direitos Fundamentais (FRA) da União Europeia concluiu que, em 2021, 33% dos Roma se sentiram discriminados, quando procuravam trabalho, por serem Roma.

Esta exclusão não só é moralmente errada, mas é também politicamente ingénua.

Em países como a Bulgária, a Eslováquia e a Roménia, existem milhões de eleitores de etnia Roma. São jovens, estão a crescer e estão dispostos a participar na política. Mas são constantemente alvo de compra de votos, manipulação digital e negligência sistémica. Nas últimas eleições búlgaras, quase metade dos 11,5% de votos do partido DPS-Um Novo Começo vieram da comunidade Roma. Este apoio foi, em larga medida, obtido através da coação e da compra de votos, aos serem exploradas as vulnerabilidades económicas dos Roma.

Ao mesmo tempo, os partidos de extrema-direita em ascensão adotam uma retórica anti-Roma para polarizar o eleitorado e aumentar a afluência às urnas. Na Eslováquia, os grupos de extrema-direita culpam as comunidades Roma pela pobreza e pelo crime, a fim de disseminar o medo do público e mobilizar os eleitores que não pertencem à etnia Roma. Os seus ataques, longe de serem únicos, polarizam os eleitorados, desviam a atenção de questões estruturais e criam um campo de ensaio para táticas antidemocráticas mais amplas – algo que as pretensas forças pró-democráticas da Europa permitiram que acontecesse.

Na Roménia, ultranacionalistas como Călin Georgescu exploram o sentimento anti-Roma para fazer avançar as suas agendas políticas. Ao fazerem da comunidade Roma um bode expiatório, estes atores aprofundam as divisões sociais e corroem a confiança nas instituições democráticas. Estas táticas não só marginalizam a etnia Roma, como também desestabilizam o quadro democrático nacional no seu todo.

Os dados são claros – e condenáveis

Há quem possa chamar a todo este panorama desinteresse pelos Roma. Mas não é bem isso. Trata-se de uma privação de direitos estruturada. Em Itália, 96% dos Roma afirmam que vão votar. Na Roménia, 81%. Na Bulgária, a afluência às urnas desce para 52% – não por apatia, mas devido a intimidação, manipulação e barreiras pré-existentes. Quando os partidos políticos contactam os eleitores de etnia Roma, a probabilidade de votarem aumenta até 80%, de acordo com os números da iniciativa Roma for Democracy. Não é um facto surpreendente, se tivermos em conta que o apoio dos Roma à governação democrática e à participação institucional ultrapassa, de forma consistente, o dos eleitores não Roma. No entanto, na maior parte dos países, os partidos tradicionais raramente se envolvem – a não ser para obter votos através da coação. Os cidadãos Roma não são inacessíveis: são ignorados – até a extrema-direita bater à porta.

Os cidadãos Roma estão a impulsionar a mudança

Em toda a Europa, as organizações Roma estão a fazer o que as instituições nacionais não conseguiram fazer: defender as eleições, formar candidatos, construir plataformas cívicas e promover a confiança no processo democrático a partir do zero. Estão a desenvolver esforços de proteção dos eleitores em comunidades de alto risco, a lançar iniciativas cívicas lideradas por cidadãos Roma com verdadeira responsabilidade, a criar meios de comunicação social independentes para combater a desinformação, a preparar candidatos de etnia Roma credíveis – e não figuras de proa – e a investir no empreendedorismo, na educação e na estratégia cultural como pilares da agência política.

Os resultados são evidentes. Os esforços da iniciativa Roma for Democracy para monitorizar os processos eleitorais na Bulgária viram a participação dos eleitores Roma nos municípios-alvo melhorar significativamente. Tanto nas eleições de outubro de 2022 como nas de abril de 2023, as áreas visadas registaram uma maior participação eleitoral entre os eleitores Roma, em comparação com as áreas não visadas: 22% e 36%, respetivamente, em comparação com 18% e 22% nas áreas não visadas. As campanhas de capacitação dos eleitores e de integridade eleitoral tiveram efeitos semelhantes noutros locais – na Eslováquia, na Roménia, na Macedónia do Norte e em Itália, a participação dos cidadãos Roma aumentou de 15% para 25%.

Na Macedónia do Norte, as organizações locais lideradas por cidadãos Roma garantiram a transparência orçamental, o acesso à educação e a habitação justa através de blocos de eleitores e da apresentação de candidatos nas eleições municipais. Na Hungria, os vereadores Roma eleitos localmente conseguiram redirecionar os recursos para escolas de maioria Roma e para infraestruturas em bairros segregados. Na Bulgária, 50 mil euros de investimento e apoio técnico permitiram que os presidentes de câmara e vereadores Roma obtivessem mais de 7,5 milhões de euros em infraestruturas e financiamento para o desenvolvimento de comunidades muito desfavorecidas. Da mesma forma, na Eslováquia, 120 mil euros permitiram desbloquear mais de 15 milhões de euros em fundos públicos para os municípios de maioria Roma – através de negociação e não de dependência.

Ao mesmo tempo, plataformas como a Roma News desafiam a desinformação e amplificam as vozes das comunidades Roma. Não se trata de um movimento emergente. Já está em curso. Mas continua sem financiamento, excluído dos quadros destinados a “proteger a democracia europeia”. O problema não é o facto de os Roma estarem ou não preparados – é a recusa da Europa em envolver-se.

Por que razão precisamos de investimento estratégico?

Em vez de apoiarem uma verdadeira mudança política de base, as instituições da UE financiam uma performance: uma “indústria de inclusão dos Roma” rigorosamente controlada – um ecossistema que produz relatórios, acolhe diálogos e reforça narrativas que tranquilizam as instituições, enquanto a situação no terreno se deteriora. Os orçamentos são absorvidos sem que se assegure a representação política ou a responsabilidade democrática.

Para uma comunidade da UE verdadeiramente representativa, as nações europeias devem investir na responsabilidade política dos Roma – na segurança eleitoral, na equidade institucional e na resiliência democrática. O financiamento deve ser direcionado para instituições lideradas por cidadãos Roma que assegurem a agência política a nível local. Os governos devem também impor uma monitorização independente rigorosa em áreas de alto risco para travar a compra de votos e a coação.

Defendemos também a expansão de iniciativas como o Plano de Ação Europeu para a Democracia, de modo a incluir programas adaptados de literacia digital e de participação cívica para grupos marginalizados, capacitando-os para reconhecer e resistir a táticas de manipulação. Fundamentalmente, o cumprimento do Estado de direito e o respeito pelos direitos das minorias devem ser pré-requisitos para o financiamento da UE. Só assim a União Europeia poderá abordar de forma credível o “Escudo Europeu para a Democracia” e resistir à desestabilização interna.

Nenhum sistema consegue resistir quando 12 milhões dos seus cidadãos são governados sem representação. E nenhuma união é segura quando a exclusão é normalizada.


Tradução de Nelson Filipe