Uma alegria, por vezes, acelera por uma reta não muito comprida e Inês Pereira, no verão, teve pouco espaço para acelerar. Estava a proteger a baliza do Servette, na Suíça, quando o Everton, clube do mais endinheirado e competitivo campeonato de futebol jogado por mulheres a quis levar. Aos 25 anos, chegava a provável melhor oportunidade da sua carreira, a mesma que apanhou a portuguesa numa curva burocrática.

A guarda-redes, de facto, assinou preto no branco e tem contrato com o clube de Liverpool, mas nunca chegou a jogar na Women’s Super League devido às regras de outras papeladas que tornam a contratação de qualquer futebolista estrangeiro em Inglaterra um jogo dentro de um jogo, em que Inês Pereira não conseguiu pontos suficientes.

Na avaliação da sua working permit, a guarda-redes registou 20 pontos e não o mínimo de 24 para ficar elegível a ser inscrita. Na mixórdia de parâmetros considerados, Inês Pereira saiu-se bem nos que afetam o lado clubístico - era campeã da Suíça, titular no Servette -, mas não tanto na seleção nacional, onde é uma habitual convocada e ocasional titular pela rotação que não usualmente o treinador, Francisco Neto, gosta de aplicar na baliza, conforme as valias das adversárias de Portugal. A nível internacional, importava o número de jogos, minutos e o ranking da respetiva seleção.

Não podendo, para já, ser inscrita pelo Everton, a solução foi emprestar a portuguesa ao Deportivo La Coruña, novidade vinda de um nega que desviou a guarda-redes rumo a outra alegria, como se tem visto nos meses desde então: Inês é a titular na baliza da equipa e, pelos vistos, não há quem na Europa e nos EUA defenda tantas bolas contras as expetativas.

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Segundo os dados da Opta, empresa que faz vida das estatísticas no futebol, nenhuma guarda-redes das cinco principais ligas europeias ou da norte-americana NWSL tem tantos remates parados numa equipa que registe um xG contra (expected goals, a métrica que avalia a qualidade e probabilidade de um remate acabar em golo) tão elevado quanto a portuguesa. Traduzindo a façanha, não há guardiã que evite tantos remates prováveis de entrar na baliza.

Era suposto o Deportivo ter encaixado 48.4 golos e Inês Pereira evitou 8.6., rácio que surge graças à aptidão da portuguesa nas balizas como pela permeabilidade da sua equipa, que está na cauda da Liga F em Espanha.

A equipa da Galiza é a 15.ª e penúltima classificada, tem 21 golos sofridos em 13 jornadas e não é o pior registo do campeonato, em parte, graças a Inês Pereira, titular em 12 dessas partidas (nas quais encaixou 15 golos).

O Deportivo é a equipa que mais remates (82) permitiu às adversárias, não é de espantar que seja igualmente a que vai com maior número de defesas (62), quase todas (57) da responsabilidade de Inês Pereira, a guardiã que lidera o campeonato nesse capítulo - além de ter parado 78,9% dos remates que foram à sua baliza no campeonato.

Quando o próximo verão chegar e for momento de regressar ao Everton, a sua licença de trabalho talvez estes números possam contar para a pontuação.