
Se existisse um manuscrito que contivesse o nome das principais figuras da história do Real Betis, Capi estaria certamente incluído. Foram 290 os duelos em que carregou o pesado símbolo dos verdiblancos no peito, repartidos por múltiplas épocas. Um registo bastante significativo, que o coloca no top-10 de jogadores com mais aparições pelo prestigiante clube.
Com uma medalha dourada da Copa del Rey na mesinha de cabeceira, o antigo médio mostrou dificuldades em dar um 'adeus' definitivo ao seu emblema de coração. Como tal, ainda foi a tempo de fazer um biscate no comando técnico. O bichinho pela bola custa a desaparecer, é natural...
Na antecâmara para o jogo entre os heliopolitanos e o Vitória SC, o zerozero teve o privilégio de estar à conversa com o ex-internacional espanhol, que enumerou os princípios que tornam o Real Betis um clube único no mundo, bem como os pilares que regem a rivalidade intensa com o Sevilla.
Bem, chega de sinopse, caro leitor. Seguimos então para o que interessa...

zerozero: Como é que surgiu esta enorme paixão pelo Real Betis?
Capi: A minha paixão pelo Real Betis surgiu quando eu era muito pequeno. O meu irmão sempre foi muito apaixonado pelo clube e, como tal, começou a levar-me ao Estádio Benito Villamarín. Desta forma, de forma gradual, comecei a sentir uma ligação muito forte com o emblema sevilhano, que prosseguiu até ao resto da minha vida.
zz: Quando seguiu para o Granada em 1999/00, estava à espera de regressar aos verdiblancos tão rapidamente?
Capi: Não, não esperava que fosse tão cedo. Eu tinha sido cedido aos nazaríes, depois de estrear-me na Primeira Divisão com 19 anos. Pensava que iria ficar de fora do projeto por mais alguns anos. Contudo, tive muito boas prestações durante o empréstimo, safei-me bastante bem, o que me permitiu retornar a casa. Posteriormente, ajudei os béticos a ascender novamente ao principal escalão. O resto é história... acabei por ficar lá mais 12 temporadas.

zz: 12 temporadas é uma duração impressionante face aos contornos do futebol moderno...
Capi: Sim, é uma carreira praticamente inteira. Depois, já na parte final do meu percurso, decidi fazer ainda dois anos no Xerez, na Segunda Divisão espanhola. Achei, posteriormente, que era a hora certa para me desvincular do futebol enquanto jogador. Senti que já me tinha dado alegrias suficientes para me despedir.
zz: Depois de tantos anos ao serviço desta mítica instituição, qual foi o melhor momento que viveu enquanto jogador?
Capi: Para mim, o momento que mais guardo com carinho foi o dia em que me estreei, com apenas 19 anos, na LaLiga. Era um dia que eu esperava, ansiosamente, desde pequeno. Logicamente, também os feitos que consegui obter com a minha equipa, como o acesso à Primeira Divisão e a conquista da Copa del Rey. Também sinto um orgulho imenso por ter atuado na Champions e na Europa League, bem como ter sido chamado para representar a minha seleção.
zz: Acredito que seja uma sensação única representar a La Roja, especialmente pela grande tradição que tem na modalidade...
Capi: Sim, a verdade é que não esperava que isso alguma vez viesse a acontecer, porque a seleção espanhola está repleta de grandíssimos jogadores. Felizmente, eu estava a atravessar um período bastante positivo na altura. Tive a sorte de jogar por quatro vezes com a camisola da minha nação. Um sonho que se tornou realidade.

zz: O seu nome completo é Jesús Capitán Prada, mas sempre foi conhecido por Capi no mundo futebolístico. Esta alcunha surgiu em tenra idade?
Capi: Sim, desde criança. Surgiu quando eu jogava no Camas CF, a equipa da minha comunidade. Toda gente tratava-me por Capitán, um dos apelidos que eu tenho, até que um amigo meu começou a chamar-me Capi. Era um nome mais curto, que dava menos trabalho. A partir daí, as pessoas que se davam comigo começaram, a pouco e pouco, a tratar-me desta forma. O nome colou até ao resto da minha vida [risos].
zz: Ao longo da vasta trajetória, partilhou o balneário com alguns célebres jogadores portugueses, como o Ricardo, o João Tomás, o Nélson e o Calado. Foram atletas importantes para o sucesso do clube?
Capi: Eram grandíssimos jogadores, que vieram ajudar o clube a crescer cada vez mais. Foram muito importantes no sucesso desta instituição. Tal como todos os atletas, viveram momentos bons e outros mais delicados. No entanto, eu guardo recordações muito boas deles, principalmente de como eram enquanto pessoas.
zz: Teve a oportunidade de estar com algum antigo colega luso, recentemente?
Capi: Sim, estive com o Nélson, porque ele está a viver em Sevilha. Também já falei algumas vezes com o João Tomás. Com o Ricardo e com o Calado, infelizmente, já faz muito tempo que não estou com eles. Irá surgir, certamente, uma oportunidade no futuro.
zz: O Real Betis é reconhecido pela sua forte academia, bem como pela sua capacidade de reter talento. Quais são os passos que têm sido dados para aprimorar este modelo desportivo?
zz: Fala-se muito da rivalidade acessa entre o Real Betis e o Sevilla. O que leva Sevilha a ser tão apaixonada pelo futebol?
Capi: O Real Betis e o Sevilla são as duas principais equipas da cidade, apesar de existirem muitas mais. Ambos os conjuntos pertencem à elite, o que faz com a rivalidade se estenda há muitos anos. No entanto, é muito normal encontrarmos famílias futebolisticamente dividias... um pai bético e uma filha sevillista, por exemplo. O Sevilla será sempre o nosso eterno rival, mas haverá sempre muito respeito pelas duas massas associativas. No entanto, as partidas são, e sempre serão, muito escaldantes.»

zz: Depois do ponto final na carreira enquanto atleta, ainda arranjou uma solução para estar perto do prazeroso cheirinho a relva. Em 2014/15, acabou por aceitar o convite de Juan Merino para ser adjunto do Betis. Como descreve esta experiência distinta?
Capi: Tivemos juntos dois anos, na primeira equipa do Real Betis. O Juan ficou como treinador principal e eu como adjunto. A experiência foi incrível e tudo correu bastante bem. No primeiro ano, disputamos, apenas, quatro partidas e ganhamos todas. Estes triunfos permitiram ao clube retornar à Primeira Divisão. No ano seguinte, assumimos o conjunto durante um período conturbado, mas deixamo-lo numa posição confortável na tabela classificativa, no décimo lugar. Foi uma experiência que jamais esquecerei.
zz: Denílson, Joaquín, Edú... teve a oportunidade de atuar com estes e outros jogadores de craveira mundial. Foram jogadores importantes para o seu crescimento individual?
Capi: Tive a tremenda sorte de partilhar o balneário com inúmeras estrelas, como Denílson e Joaquin Sánchez. Para além destes que mencionou, ainda joguei com outros futebolistas com uma qualidade acrescida, entre os quais Ricardo Oliveira e Alfonso Pérez Muñoz. Como tal, o meu percurso enquanto profissional viveu sempre de uma grande aprendizagem. Sempre quis aprender e desenvolver as minhas capacidades com os inúmeros craques que tive o privilégio de ter ao meu lado.