Tudo terá começado com uma brincadeira, há um ano, durante a etapa da Diamond League do Mónaco. Armand Duplantis e Karsten Warholm, atletas e amigos, campeões, desafiavam-se um ao outro, como só os animais competitivos gostam de fazer, mesmo que tudo seja feito no mais puro ambiente de camaradagem. Duplantis é o homem voador que ainda há dias passou os 6.26m no salto com vara, batendo pela 10.ª ocasião o recorde mundial. Já Warholm, apesar de ter perdido em Paris o título olímpico dos 400m barreiras que havia conquistado em Tóquio, quedando-se pela prata na capital francesa, continua a ser o homem mais rápido da história na distância.
Nesse dia no Mónaco, os dois apostavam quem seria o mais rápido em velocidade, na prova das provas, os 100 metros. “Ele dizia-me que eu parecia rápido e eu logo: ‘vamos correr’”, revelou o sueco Duplantis, numa entrevista ao site de um dos patrocinadores de ambos. A certeza de Mondo de que bateria o amigo fez com que Warholm dissesse que sim ao desafio: “Com o meu ego e com a confiança que tenho em mim, tinha de aceitar”, atirou o norueguês, meio a brincar, mas muito a sério.
Pois bem, o duelo, não ao pôr do sol, mas sim ao início da noite, tem mesmo dia e hora marcados: esta quarta-feira, em Zurique, Armand Duplantis e Karsten Warholm vão correr um contra o outro numa prova de 100 metros. O evento, naturalmente, não é oficial, mas sim um momento de exibição antes da etapa da Diamond League da cidade suíça, no dia seguinte. Ainda assim, esta é a oportunidade de ver dois campeões olímpicos a digladiarem-se numa disciplina que não é a sua, porque os limites da competitividade podem sempre ser quebrados.
No papel, Karsten Warholm parece mais talhado para o desafio: o seu emprego diário é correr o mais rápido possível numa volta completa à pista, impulsionando-se de quando em vez para ultrapassar uma barreira. Só que a grande diferença entre o óvni Duplantis e os terráqueos que praticam salto com vara talvez seja mesmo a sua velocidade, tal como Pedro Pinto, treinador português da especialidade, revelou à Tribuna Expresso após o sueco bater o recorde mundial em plenos Jogos Olímpicos. “Ele é muito mais rápido do que os outros. Tecnicamente, os outros atletas saltam melhor ou igual, não conseguem é fazê-lo tão rápido”, explicou-nos o técnico.
O sueco tem um recorde pessoal no hectómetro de 10.57, com vento, em 2018. Um tempo de fazer inveja a muito boa gente. No salto com vara, a corrida de Duplantis fica limitada aos 40 metros que galga de vara na mão, a preparar a impulsão. Agora, terá de levar esse talento para os 100 metros. Já Warholm tem como melhor marca nos 100 metros 10.49, em 2017. Há, portanto, apenas uma ligeira diferença entre ambos, que será testada esta quarta-feira, embora o norueguês já tenha afirmado que será mais “embaraçoso” para ele ser batido pelo amigo saltador do que se o resultado for ao contrário.
Warholm tem a experiência de saber como se arranca uma corrida a partir dos blocos, para lá da óbvia velocidade. Já Mondo poderá surpreender: “Eu faço muito mais treinos de sprint do que as pessoas pensam, acho que posso surpreender muita gente. Nunca desafiaria o Warholm para uma corrida se não acreditasse que podia ganhar.” Se a dificuldade para o norueguês será correr quatro vezes menos aquilo a que está habituado, Duplantis tem como mais-valia a aceleração, a capacidade de chegar rapidamente a uma velocidade de respeito. O desafio será mantê-la em 100 metros.
A vitória nesta exibição servirá para entreter quem gosta de atletismo, quem gosta destas duas figuras carismáticas do atletismo, e também para dois amigos, conforme o resultado, terem algo para atirar um ao outro nas amenas cavaqueiras que terão pela frente. Afinal, a amizade também é isso.