Que significa este regresso à SFUAP [na Cova da Piedade, Almada] passados sete anos de lá ter estado duas épocas como treinador e onde foi nadador dos 10 aos 21 anos e internacional?

— Estive sete anos no Benfica, durante os quais fiz o ciclo olímpico para Tóquio e agora de Paris. Em termos de regresso, é um desafio novo, em que, ao fim e ao cabo, tinha estado dois anos enquanto treinador principal antes de ingressar no Benfica, e nos quais tivemos grandes resultados, atletas internacionais e campeonatos da Europa de juniores. Por isso, é com grande vontade que abraço este  projeto que foi criado. É um desafio. Ou seja, estamos a tentar dar as melhores condições possíveis para a realidade atual do clube e estou entusiasmado com este novo desafio porque não é algo para que exista um resultado imediato, mas para ser trabalhado a curto, médio e longo prazo.

Vamos tentar fazer com que concelhos que têm uma população tão grande façam com que a margem sul do Tejo volte a ter atletas de referência, como acontecia no passado.

— É para voltar a tornar a SFUAP com numa equipa com uma formação forte, que era um dos aspetos que marcava o clube?

— O grande objetivo penso que não passará só pela SFUAP. Creio que o desafio que terei é tentar expandir a todas as entidades que rodeiam a SFUAP, como, por exemplo, a Câmara de Almada ou Seixal, porque em termos de equipas, na proximidade existe a SFUAP e o CIRL e não existe praticamente mais nada. Em resumo, não será só um movimento SFUAP, vamos tentar fazer com que concelhos que têm uma população tão grande façam com que a margem sul do Tejo volte a ter atletas de referência, como acontecia no passado.

Acho que todos os projetos devem ser ouvidos e foi o que aconteceu: apresentaram-me um bastante estimulante.

— E quando foi desafiado para esse projeto?

— No final de agosto. Tive todo o mês passado ausente de telemóveis, quis pensar realmente o que queria fazer da minha vida e no final de agosto entraram em contacto a pergunta-me se fazia sentido falarem comigo. Disse que gosto de projetos que sejam interessantes e possam estimular-me para o futuro. Acho que todos os projetos devem ser ouvidos e foi o que aconteceu: apresentaram-me um bastante estimulante.

— Mas ficou admirado quando foi abordado pela SFUAP?

—  Sim, porque para todos os efeitos, da forma como terminei [no Benfica], não tive tempo para procurar se havia outro clube. Todas as equipas já se tinham organizado e estruturado. Independentemente de tudo, só um clube que estivesse à procura de um técnico é que realmente poderia procurar-me, mas nunca pensei na SFUAP pelo simples facto que imaginava que tratava-se de um clube com processos já mais avançados de contratação. Por isso, nunca me passou pela cabeça, mas, na verdade, também não procurei clube.

Para já a direção até disponibilizou um investimento de 6 mil euros para que seja montado um ginásio atualizado, porque as máquinas que existiam no atual estão muito velhas.

— Até porque referiu que há um desejo de formação de atletas mas também recolocar o clube num patamar mais elevado do atual, tem a equipa masculina na 1.ª Divisão, mas a feminina não. O primeiro passo da sua ambição é elevar igualmente as raparigas à 1.ª Divisão ou pensa que os masculinos podem aspirar a algo mais cedo do que os femininos?

— Neste momento a minha preocupação é ver a realidade de tempo, porque nem sei se vamos ter nadadoras femininas para podermos competir num Nacional de clubes. É necessário um número mínimo de atletas e nesta altura não faço a mínima ideia se teremos suficientes porque a realidade é que o clube no passado recente não tinha uma formação para fazer com que tenhamos muitas soluções. No caso feminino não temos atletas, é algo que está em cima da mesa, e, provavelmente, nem poderemos competir na 2.ª Divisão. Nos rapazes, temos atletas para  a 1.º Divisão e terei que trabalhar com aqueles que existem e que mostram grande vontade em ajudar nesta nova etapa em que estamos a olhar para baixo. Vamos tentar arranjar as melhores estruturas possíveis para que a formação tenha resultados e que a SFUAP seja, novamente, uma referência na natação portuguesa.  Para já a direção até disponibilizou um investimento de 6 mil euros para que seja montado um ginásio atualizado, porque as máquinas que existiam no atual estão muito velhas.

Os atletas que chegaram a um determinado patamar e querem estar num processo mais competitivo podem ter essa situação no Benfica porque existe uma estrutura muito direcionada para o alto rendimento. A SFUAP ainda não tem esse processo, por isso não acredito que atletas venham atrás de mim.

— Quando foi para o Benfica — e enquanto lá esteve — houve nadadores muito ligados a si, alguns que até o acompanharam na mudança de clube. Virão agora alguns consigo para a SFUAP?

—  Não, acho que as pessoas não acreditam que isso aconteça, porque, sinceramente, o que os atletas querem é andar para a frente. A realidade de um nadador que se encontra num clube como o Benfica e a da SFUAP em que estamos neste momento são completamente diferentes. Os atletas que chegaram a um determinado patamar e querem estar num processo mais competitivo podem ter essa situação no Benfica porque existe uma estrutura muito direcionada para o alto rendimento. A SFUAP ainda não tem esse processo, por isso não acredito que atletas venham atrás de mim. Aliás, nem sei se vem alguém, porque talvez não faça sentido. Quando antes as pessoas me procuraram, não foi só por mim. Foi por causa do Ricardo, o meu projeto, o meu plano, mas também as condições que o Benfica dava. Não é o Ricardo, mas toda uma estrutura que estava montada para o alto rendimento. Os atletas vão querer continuar a pensar no alto rendimento.

— No Benfica a conquista de títulos nacionais individuais já eram habitual, mas acabou a ganhar o Nacional de clubes masculino e o feminino na mesma época, algo que o Benfica nunca tinha conseguido. Não terem desejado continuar consigo surpreendeu-o?

— Acho que não é o caso de ser uma surpresa, são mudanças de paradigmas em que sei o que é que nós tínhamos que fazer durante aqueles sete anos, porque na antiga gestão e treinador, que é o atual coordenador Mário Madeira, tinha uma equipa com um determinado perfil e quando me foram contratar foi com a ambição de trazer o clube para um nível completamente diferente, de excelência, tal e qual o Benfica merecia. Acredito que o consegui e, neste momento, está muito bem entregue, com dois técnicos de excelência [José Machado e Miguel Frischknecht]. Foram escolher dois dos melhores treinadores para dar continuidade ao meu trabalho. A mim nada me surpreende porque fui contratado para fazer dois ciclos e agora quiseram mudar o paradigma, por isso não tenho que ficar chateado.

A maneira como saí não foi, acho eu, aquela que merecia, mas aceito que quando as pessoas terminam os contratos pretendam continuar as suas vidas e mudar, trazer sangue novo e ter ideias diferentes.

— Nem magoado?

— Magoado não, desiludido. Penso que a maneira como saí não foi, acho eu, aquela que merecia, mas aceito que quando as pessoas terminam os contratos pretendam continuar as suas vidas e mudar, trazer sangue novo e ter ideias diferentes. E acredito que estas duas pessoas o possam fazer. Agora, acho que na minha situação muito particular, por tudo o que dei ao clube em termos de profissionalismo, dedicação e resultados desportivos, porque estamos a falar deles — são os melhores do Benfica dos últimos largos anos e dois títulos que nunca foram alcançados em simultâneo na história do clube —, foi com grande orgulho que fiz parte desse processo, juntamente com várias pessoas e os atletas. É um trabalho de várias pessoas, não do Ricardo, mas de uma estrutura que deixámos montada e agora outras pessoas têm de dar continuidade àquilo que foi construído. Porém, não gostei da forma como saí, porque acho que não foi digna para o serviço que prestei a uma instituição como a Benfica.