Pedro Pablo Pichardo acha que foi “um ouro perdido” e não uma prata ganha. Depois do 2.º lugar no triplo salto, o atleta lamenta os “erros” que cometeu, nomeadamente “não acertar na tábua”, fazendo os seus ensaios sempre longe do limite permitido.
“Custa muito perder assim”, assume o campeão olímpico de Tóquio. Pela escassa margem entre Pichardo, que fez 17,84 metros, e Jordan Díaz, que saltou a 17,86 metros, o medalhado de prata acredita que “bastava saltar cinco centímetros mais perto da tábua e ganhava”.
“Sempre acreditei que conseguia ultrapassar o Jordan. Fui sempre à procura, mas infelizmente não saiu”, diz um Pedro Pablo que não quer “procurar desculpas” para não ter conseguido revalidar o título olímpico.
Mas esta foi a mais pequena parte da presença de Pichardo na zona mista. O português entra recordando que prometera falar depois da final e indica que estará “o tempo que for preciso” em diálogo com os jornalistas. A promessa foi cumprida.
A maior parte do tempo é passada com o atleta a criticar a falta de condições em Portugal e a confessar que a retirada lhe passava pela cabeça. O triplista revela que “tinha prometido” à mãe que só terminaria a carreira em 2028, depois dos Jogos de Los Angeles, mas “os últimos anos têm sido muito complicados”, levando a pensar “retirar-se já hoje”.
O dedo é apontado às pessoas com mais responsabilidades. “Infelizmente, em Portugal não temos apoio das instituições. O Governo só olha para o futebol. Somos atletas mas não temos apoio nenhum”, atira.
Medalhado de ouro em Tóquio 2020, de prata em Paris 2024, campeão mundial e europeu em 2022, Pichardo fala ainda das conhecidas divergências recentes com o Benfica: “Tenho vindo a ter problemas com o clube, já não tenho o apoio que tinha no começo.”
Este conjunto de circunstâncias leva a que o quinto campeão olímpico da história nacional considere colocar o tal ponto final: “O que me passa pela cabeça é parar aqui, que hoje tenha sido a minha última competição. Tenho falado comigo próprio… A saúde está bem. Não sei, vou pensar e ver se continuo.”
Indo por partes.
Em relação ao Governo, o atleta diz que ainda não viu Luís Montenegro, que está em Paris a assistir a esta ponta final dos Jogos. Caso falasse com o Primeiro-ministro, o que faria o responsável por duas das 31 medalhas da história nacional? “Seria bom sentar-me com ele e ser se conseguem dar apoio aos atletas fora do futebol. Pedir-lhe-ia apoio. Sei que Portugal é só futebol, mas também somos atletas. Precisamos um bocadinho, não estamos a pedir muito. Daquilo que dão ao futebol, um bocadinho para nós seria suficiente.”
O português assume que esta nova rivalidade com Jordan Díaz dá “motivação”. Não se quer retirar com a memória de ficar atrás do espanhol nos Europeus e nos Jogos na cabeça, assume. Mas ao “chegar a Portugal e lidar com as dificuldades todas, a cabeça não aguenta”.
“Já estou velho, tenho três filhos, uma família, tenho 31 anos. Já não sou um jovem com a emoção do começo. Preciso de treinar com uma boa estrutura. Cheguei até aqui, conquistei resultados para ter uma estrutura, mas, infelizmente, em Portugal está difícil”, explica.
Detalhando a tal falta de estrutura para treinar, Pichardo diz que sai de casa, chega às suas sessões de preparação e “a pista não está em boas condições”. Tem de andar a “emendar os buraquinhos da pista”, lamenta que “a tábua não esteja boa”, que “a caixa não esteja boa”. “Estar todos os dias a treinar com falta de condições não é fácil”, resume.
Pichardo agradece o apoio da Câmara Municipal de Setúbal, que lhe cede a pista do complexo municipal de atletismo para treinar, mas lembra que é “um favor” que lhe fazem e não “uma obrigação” camarária. A federação também o tenta ajudar, refere, mas “também não tem muito apoio”. E é aqui que se aprofunda o tal tema do apoio adicional do Benfica que, segundo Pedro Pablo, antes havia e agora não há.
Desde fevereiro que são públicas as divergências entre o clube da Luz e um dos seus mais titulados atletas. Pichardo queixa-se da dificuldade em falar com Rui Costa, queixa que reitera nesta zona mista, indicando que o presidente do Benfica deve “estar muito ocupado”. Recentemente, José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, revelou que Pichardo lhe pediu ajuda para ser recebido pelo líder das águias.
Agora, Pichardo disse que recebeu uma mensagem de Rui Costa antes da partida para Paris, tendo ambos combinado reunir-se quando o atleta regressasse dos Jogos. “Espero chegar a Portugal, reunir com o presidente e chegar a acordo”, deseja.
É conhecida a má relação do triplista com Ana Oliveira, coordenadora do atletismo e do projeto olímpico do Benfica. Pedro Pablo também fala da dirigente: “Espero que a diretora do clube me deixe em paz. Tem-me chateado muito”, queixa-se quem espera “arranjar uma solução”, levantando mesmo a hipótese de “ver” se o “deixam sair” da Luz.
O que decidiria se tivesse de decidir neste instante sobre a continuidade na carreira? “Gostaria de continuar em Portugal e ficar no Benfica, mas preciso de condições. Pelo que tenho conquistado, eu mereço ter uma estrutura de treino bem formada”, diz.
E prefere sair do Benfica ou melhorar as condições que tem no Benfica? “Gostaria de ficar no Benfica, mas com melhores condições. E ter um acordo para que a diretora me deixe em paz. Vou treinar, representar o clube, mas sem nada a ver com a diretora.”
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