
Não foi uma noite épica, mas também nem precisava de o ser. Em Paços de Ferreira, casa emprestada do Rio Ave, o Sporting tratou de carimbar o passaporte para o Jamor com a serenidade de quem já levava a lição estudada — e meia eliminatória no bolso, diga-se, de passagem.
O leão fez o que tinha a fazer, com uma vitória por 2-1 que nunca chegou verdadeiramente a tremer, mesmo quando o adversário reduziu e sonhou, por breves instantes, com um final diferente.
Os leões são, assim, os primeiros finalistas confirmados da Taça de Portugal onde, ao que tudo indica, deverão defrontar o Benfica – que joga esta quarta-feira na Luz com o Tirsense, com uma vantagem de cinco golos nestas meias-finais da Prova Rainha.
Ora, antes da tal hipotética romaria ao Estádio Nacional, os leões chegavam ao Estádio Capital do Móvel — casa emprestada dos vilacondenses até ao final desta época — em vantagem na eliminatória, depois de terem triunfado em Alvalade num duelo em que Geny Catamo esteve em destaque (2-0).

Para além disso, a jornada do último fim de semana mostrava um Sporting em melhor forma, depois de ter batido o Moreirense em casa (3-1), com um hat-trick de Viktor Gyokeres, ao passo que o Rio Ave não conseguiu mais do que um empate a uma bola na receção ao Santa Clara.
A grande novidade nos onzes iniciais foi o regresso de Pedro Gonçalves à titularidade, cinco meses e meio depois, com o internacional português a saltar para o ataque, compondo o trio ofensivo ao lado de Viktor Gyökeres e Francisco Trincão. Para além de Pote, Rui Borges fez mais três mexidas no onze, com Jeremiah St. Juste a entrar para o centro da defesa e Iván Fresneda e Matheus Reis para os corredores laterais, saindo Eduardo Quaresma, Geovany Quenda, Maxi Araújo e Geny Catamo.
Na equipa da casa, Petit fez duas alterações em relação ao jogo com o Santa Clara, com Jonathan Panzo a alinhar ao lado Andreas Ndoj no centro da defesa, o que obrigou Konstantinos Kostoulas a sentar-se no banco de suplentes. No entanto, o antigo médio internacional português viu Nelson Abbey lesionar-se no aquecimento, o que levou Marious Vrousai a saltar para dentro de campo.
Ora, relativamente ao jogo em si, esse, teve os seus momentos, mas não teve drama. E isso, para os leões, é elogio. Numa fase da época em que tudo pesa nas pernas e na cabeça, a capacidade de gerir o esforço e controlar o rumo da história pode ser tão valiosa como um golo de bandeira. Rui Borges leu o contexto com sabedoria: entrou para fechar contas e não para fazer “show”, que é o que, precisamente, se pede nesta altura da temporada.
O Sporting pressionava em 4-4-2, com Fresneda a subir até à linha média, formando uma linha de quatro com Morten, Debast e Pote. Trincão e Gyökeres compunham a primeira linha de pressão, condicionando a saída curta do adversário.
Com bola, construção era em 3+2, com Debast e Morten posicionados à frente da linha de três defesas, em diagonal. Frente ao 4-4-2 do adversário em bloco médio, apesar de compacto, havia sempre espaço para explorar nas costas da linha defensiva, sobretudo através de movimentos do inevitável Gyokeres.
O primeiro golo surgiu cedo e com ele veio a tranquilidade. A vantagem dilatava-se para números praticamente irrecuperáveis e o Rio Ave sentiu isso — emocional e taticamente.
Assim sendo, com o golo de Gonçalo Inácio, aos 11 minutos, o Sporting praticamente fechou a eliminatória frente ao Rio Ave. Depois de um início dividido, com os leões a ameaçarem por Matheus Reis e Viktor Gyökeres, foi o capitão leonino quem desbloqueou o jogo. Na sequência de um canto cobrado por Debast (cada vez melhor como batedor de bolas paradas), um desvio ao primeiro poste deixou a bola à mercê de Inácio, que não perdoou no coração da área.
Com efeito, a equipa de Petit, corajosa no início, foi perdendo gás e convicção, encostada por um adversário que sabe ser impiedoso sem parecer agressivo. Com bolas paradas, pressão alta e saídas rápidas, o Sporting impôs o seu futebol com naturalidade, sem correr mais do que o necessário.
Os vilacondenses não chegavam às meias-finais da Taça de Portugal desde 2016 e estava visto que não iam repetir 2014 e 1984, quando atingiram a final. Pouco o Rio Ave conseguiu produzir.
Aliás, esta época, o Rio Ave tem sido uma deceção (quase) total no que à qualidade de jogo diz respeito, e até em termos de resultados, se retirarmos da equação a Prova Rainha, tanto com Luís Freire como com Petit. Bem sei que é difícil conciliar e conjugar tantas nacionalidades numa só época, mas não se vê praticamente nada, designadamente no momento ofensivo. É uma espécie de “bola no Clayton” e ele que resolva em apoios.
Com tanta qualidade individual faz confusão, sendo que em termos de qualidade de jogo, penso que a equipa até tenha piorado com a entrada de Petit, mesmo tendo, por exemplo, empatado a duas bolas na receção ao FC Porto e perdido apenas por 2-3 frente ao Benfica.
Desta forma, e sem mais golos no primeiro tempo, os leões regressaram ao balneário na frente do marcador e com a eliminatória praticamente resolvida.
Para a segunda parte saltaram do banco Theofanis Bakoulas, do Rio Ave, e Geny Catamo, do Sporting, que entraram para os lugares de Brandon Aguilera e Pote, respetivamente.
A partida manteve-se na mesma toada e, na primeira ocasião, o Sporting voltou a chegar ao golo: Geny apareceu a rematar, à entrada da área, para defesa incompleta de Miszta e, na recarga, Gyökeres atirou para o fundo da baliza, à passagem do minuto 50. O sueco chegou, assim, aos 91 golos em 97 jogos, com a camisola leonina. Números absolutamente estratosféricos.

De notar que a equipa leonina relaxou após o segundo golo, e o Rio Ave conseguiu aproveitar para criar algumas oportunidades consecutivas, encostando o Sporting à sua área.
Assim, já com Ricardo Esgaio, do lado leonino, e Ole Pohlmann e Tiago Morais, do lado vilacondense, em campo, a partida entrou num ritmo de gestão, com este último a reduzir, mas tinha partido para a jogada em posição irregular e o resultado manteve-se como estava.
As ameaças continuaram a surgir e, depois de uma grande jogada de Olinho, a bola beijou a barra e caiu em cima da linha de baliza de Rui Silva. Pouco depois, o golo acabou mesmo por aparecer, com os rioavistas a trocarem a bola ao primeiro toque e Clayton a deixar de calcanhar para a finalização certeira de André Luiz, aos 66’.
Rui Borges respondeu de imediato ao golo sofrido e continuou a refrescar a equipa, colocando Biel Teixeira e Conrad Harder no ataque. Já com o novo trio ofensivo, o leão voltou a criar perigo numa jogada em que Catamo isolou Fresneda, mas o lateral espanhol perdeu no duelo com Cezary Miszta.
Em relação ao guarda-redes polaco, com passagem pelo Legia de Varsóvia, demonstra cada vez mais qualidade e capacidade de, para na próxima época, assumir outros voos. Arrisco-me a dizer que é guarda-redes de equipa grande, sendo, neste momento, o jogador mais valorizado do plantel do Rio Ave, a par de Clayton.
Quanto a Biel, os pouquíssimos minutos do brasileiro em campo não obedecem à falta de oportunidades de Rui Borges. Mostrou sempre bons pormenores quando entrou/jogou, principalmente em espaços curtos. Qualidade técnica não parece faltar. A verdade é que o resultado não sofreu mais alterações, em parte por conta de Rui Silva, que negou o empate a Vrousai perto do fim.
Deste modo, o Sporting garantiu mais um triunfo ante o Rio Ave e está pelo segundo ano consecutivo na final da Taça de Portugal e, indica a vantagem de cinco golos dos encarnados na eliminatória contra o Tirsense, prepara-se para defrontar o Benfica na decisão do título.
Os rivais não se enfrentam no jogo decisivo da Prova Rainha desde 1996, resta saber o local do reencontro. Rui Borges diz não imaginar que o dérbi se realize noutro sítio que não o Jamor, mas a indecisão permanece.
Por fim, é de referir, também, o facto de ser mais um ano a discutir todos os títulos até ao fim. Mérito para quem construiu e manteve este plantel durante duas épocas, para Ruben Amorim, mas também para Rui Borges, que, apesar de todas as contrariedades, manteve o Sporting uma equipa sempre competitiva.