Nas últimas semanas o tema tem estado envolto em polémica. Afinal, quantas pessoas abandonam Portugal?

SIC Notícias

De acordo com as Nações Unidas, Portugal conta com cerca de 2,1 milhões de pessoas a viver noutros países. Um número elevado se pensarmos que a população residente ronda os 10,6 milhões.

Portugal é hoje um país de imigrantes, mas de emigrantes nunca deixou de ser. Este não é um fenómeno que resulte somente da emigração que se verificou no passado. Trata-se, antes, de uma realidade bem presente. E que realidade é esta?

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Olhando os dados, vemos que o número anual de saídas permanentes, isto é, o número de pessoas que abandonaram o país para viver no estrangeiro por, pelo menos, um ano tem vindo a aumentar desde 2021. Em 2008, foram cerca de 20 mil.

Depois de um pico no período da crise económico-financeira, o número de emigrantes voltou a aumentar, estimando-se que, em 2023, tenham sido mais de 33 mil pessoas a abandonar o país.

Que idade têm os emigrantes portugueses?

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Se atentarmos à idade daqueles que abandonam o país, vemos que se trata, sobretudo e cada vez mais, de jovens. Em 2023, 75 por cento das pessoas que decidiram emigrar tinham até 39 anos.

Uma realidade impressionante tendo em conta a demografia portuguesa.

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Na última década, mais de dois terços dos emigrantes tinham até 39 anos.

Um dado ainda mais impressionante é que mais de um terço das pessoas nascidas em Portugal, com idades entre os 15 e os 39 anos, vivem hoje no exterior, de acordo com os dados do Observatório da Emigração. Com consequências negativas para os próprios e para o país.

Os emigrantes são mais jovens e mais qualificados.

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Além do número estar tendencialmente a aumentar, o perfil dos emigrantes também está a mudar. Se em 2015, 30 por cento dos emigrantes portugueses tinham o ensino superior, em 2023 os diplomados já constituíam 42 por cento do total. É talento qualificado em fuga do país.

O que leva os jovens a procurar outros países?

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Portugal testemunhou um avanço extraordinário ao nível da escolarização da população, desde que se estabeleceu a democracia. Ora, durante algum tempo, o aumento da escolaridade foi acompanhado de aumentos na produtividade da economia e, consequentemente, nos salários. Não é isso que se tem verificado nas últimas décadas.

O valor acrescentado por trabalhador, utilizado aqui como medida da produtividade, tem divergido cada vez mais da escolaridade da população ativa. E isto reflete-se ou não nos salários?

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Reflete-se nos salários que têm estado estagnados. Em 2011, o salário de um trabalhador com o ensino superior era aproximadamente 670 euros mais elevado do que o salário de um trabalhador com o ensino secundário.

Doze anos depois, esse prémio salarial tinha caído para uma diferença de 470 euros. Se compararmos com os outros países, perdemos.

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Ora, os baixos salários são uma das razões pelas quais os jovens decidem emigrar. Senão vejamos alguns dos países de destino que escolhem mais frequentemente: Suíça, França, Espanha e Alemanha.

Todos os países em que o rendimento líquido de quem tem entre 18 e 64 anos e o ensino superior completo está acima daquele que se aufere em Portugal – cerca de 23 mil euros por ano. Estamos, aliás, bastante longe da média europeia que se situa em mais de 30 mil euros.

Além dos baixos salários, o mercado de trabalho não tem sabido integrar as qualificações dos jovens.

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A verdade é que, em Portugal, o emprego tem crescido em setores com menores níveis de produtividade e que requerem menos qualificações.

Consequentemente, mesmo para aqueles que ficam em Portugal há dificuldades em fazer corresponder as suas qualificações aos empregos que exercem. Em 2022, quase um em cada quatro trabalhadores jovens com ensino superior, entre os 25 e os 34 anos, tinham qualificações superiores às necessárias para a função que desempenhavam.

Recentemente discutiu-se a ideia de a imigração jovem e qualificada que tem chegado a Portugal anular os efeitos negativos que decorrem da fuga dos jovens portugueses. Isto confirma-se?

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É verdade que temos atraído imigração jovem e qualificada. No entanto, de acordo com um recente relatório do Banco de Portugal, os trabalhadores portugueses mais jovens são mais qualificados do que os estrangeiros.

Além disso, não é certo que os jovens que chegam de outros países estejam a desempenhar funções que correspondem à sua formação académica. Na realidade, é muito frequente os imigrantes trabalharem, pelo menos numa fase inicial, em profissões de menor valor acrescentado para a economia. E isto tem consequências negativas.

Estamos a perder parte do impacto positivo que o talento e a formação poderiam ter no crescimento da economia portuguesa e a estimular os mesmos setores de baixa produtividade. Perder jovens qualificados significa, no fundo, limitar a produtividade e o desenvolvimento do nosso país.

Que outras consequências decorrem dos níveis elevados de emigração jovem e qualificada que têm caracterizado o país?

As consequências são múltiplas, desde logo para os próprios. Muitos jovens abandonam o país quando, tendo melhores condições, não hesitariam em ficar e construir em Portugal as suas vidas e famílias. Este é um direito que lhes é negado.

Por outro lado, a saída de jovens, em idade fértil, acentua o problema de envelhecimento da população num país em que a taxa de natalidade não é suficientemente alta para garantir o limiar da substituição de gerações. Se há menos jovens, haverá menos crianças.

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Finalmente, é possível estimar as perdas associadas à emigração dos portugueses mais qualificados.

De acordo com um estudo da Associação Business Roundtable Portugal, estima-se que a emigração dos mais qualificados tenha significado uma perda anual de 1,9 mil milhões de euros de investimento público em educação, acrescidos da perda de receita de IRS e Segurança Social dos emigrantes em idade ativa, avaliadas em 2,3 e 4,7 mil milhões de euros, respetivamente.

O que pode Portugal fazer para reter o talento?

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O número de pessoas nascidas em Portugal que voltam ao país aumentou consideravelmente nos últimos anos. Em 2022, quase metade dos que regressaram, tinham entre os 15 e os 39 anos, o que é positivo.

Algumas medidas implementadas têm ajudado: devolução de propinas, IRS Jovem, durante os primeiros cinco anos de trabalho, regime dos residentes não habituais, entretanto extinto, mas que ainda tem milhares de beneficiários e o “Programa Regressar”.

Além de medidas de incentivo fiscal, há mudanças ao nível das empresas que podem contribuir para uma maior satisfação dos trabalhadores, sobretudo dos mais jovens.

Nestas incluem-se medidas de apoio à habitação, apoio à parentalidade, à conciliação da vida familiar e profissional e regimes de trabalho híbrido (que combinam o trabalho remoto com o presencial).