José Reis, da Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes, disse à agência Lusa que "valeu a pena a persistência das associações", que conseguiram que "ao fim de 14 anos" a lei fosse regulamentada.
Mas este tempo de espera instalou "alguma descrença" entre os deficientes, mesmo que o novo regime crie "alguma expectativa". Ao mesmo tempo, admite que "vai ter que haver muita vontade das partes" para que resulte.
"Não é de um dia para o outro que vai mudar tudo, mas estamos a avançar", assinalou, defendendo que para além do novo regime, é preciso "aproximar as pessoas com deficiência que procuram emprego de quem as pode recrutar".
As empresas que cumpram as suas obrigações devem ter benefícios, entende a Confederação, começando com "majorações nas candidaturas a fundos públicos".
A partir de hoje, as empresas públicas e privadas de média e grande dimensão passam a estar obrigadas a contratar entre 1% e 2% de pessoas com deficiência.
De acordo com o novo regime, que estabelece o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, todas as empresas, sejam públicas ou privadas, de média ou grande dimensão, passam a estar obrigadas a cumprir quotas.
No caso das empresas médias com um número igual ou superior a 75 empregados, estas devem contratar pelo menos 1% de trabalhadores com deficiência, enquanto as empresas de grande dimensão estão obrigadas a contratar pelo menos 2%.
Para conseguirem cumprir a nova legislação, está previsto um período de transição de cinco anos para as empresas com um número de trabalhadores entre os 75 e os 100 funcionários, e de quatro anos para as entidades com mais de 100 empregados.
António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial Portuguesa, disse à agência Lusa que é impossível antecipar que impactos o novo regime terá para as empresas, sublinhando que "a realidade de cada uma é diferente".
Começa a aplicar-se num contexto em que os empresários estão cientes das "responsabilidades sociais a atender" e da necessidade de a cultura das empresas ser solidária.
"Muitas já têm essa postura e atitude, é uma prática que já existe", afirmou, salientando que aplicar este regime "por imposição é algo que tem que ser acautelado".
Para António Saraiva, que salienta que a sua opinião não vincula a Confederação, era preferível que "fosse mais uma orientação, um caminho no sentido da auto-regulação".
No entanto, reconhece que "muitas vezes, a sociedade só reage com estímulos desta natureza".
O sindicalista Fernando Gomes, da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP), reconhece que para essas empresas estarão mais bem colocadas para acolherem o novo regime e "em condições de adaptar as suas estruturas de funcionamento".
Outras necessidades são um reforço dos meios da Autoridade para as Condições de Trabalho para conseguir fiscalizar a aplicação do novo regime, em que se preveem contraordenações para as empresas que não cumprirem, e "apoios para as empresas em condições para adaptarem postos de trabalho", defendeu.
Mas trata-se de um passo positivo em relação a propostas anteriores em que "só se punha as pessoas no teletrabalho, a trabalhar em casa, isoladas".
"É precisa uma mudança cultural mais do que uma lei, e contratar trabalhadores com base nas suas capacidades", defendeu, mesmo em setores em que os deficientes têm tido "pouca empregabilidade".
Na hotelaria, por exemplo, Fernando Gomes afirma que "não faz sentido que não haja pessoas com deficiência, com a eliminação dos balcões, a atender clientes".
Fernando Gomes salienta que o preconceito existe e que "quando vão duas pessoas a uma entrevista de emprego, se uma for uma pessoa com deficiência, fica logo em desvantagem".
Mesmo no universo sindical, a CGTP está agora a "começar a trabalhar para [as pessoas com deficiência] se sentirem mais representadas pelos sindicatos", uma vez que a prática é recorrerem a associações específicas de deficientes para reclamarem os seus direitos.
Lina Lopes, responsável pela área da igualdade na União Geral dos Trabalhadores (UGT), disse à Lusa que o novo regime "fica muito aquém do que se podia fazer", sublinhando que a meta de contratação de 1% de pessoas com deficiência para empresas com 75 trabalhadores significa "0,75%, ou seja, uma pessoa".
Mas a UGT "congratula-se com tudo o que se faça para incluir" e considera "bom que exista uma lei em que se obrigue a incluir", sublinha.
A dirigente sindical considera que o processo de adaptação das empresas às quotas "não vai ser complicado", sublinhando que já há muitas empresas, universidades e entidades públicas que já se moveram para não excluir e contratar pessoas com deficiência.
O período de transição, entre quatro e cinco anos, "é longo demais", assinala, indicando que "só em 2020 é que [o novo regime] começará a ter algumas consequências".
O caminho da sociedade portuguesa, antevê, é que "qualquer dia se olhe apenas para trabalhadores" e não para pessoas com deficiência que trabalham.
As empresas podem conseguir exceções a este regime, desde que comprovem a impossibilidade da sua efetiva aplicação no respetivo posto de trabalho ou atestem que não existe um número suficiente de candidatos com deficiência inscritos nos serviços de emprego e que reúnam os requisitos necessários para preencher os postos de trabalho.
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