Há quem espere o ano inteiro pela temporada do cada vez mais raro ciclóstomo. A época já abriu e com ela chegam à mesa receitas tradicionais de lampreia, em arroz e à bordalesa, e outras mais incomuns, como em açorda ou em escabeche. Se é um dos que adora este prato pouco consensual descubra truques e segredos da confeção e conheça seis restaurantes obrigatórios no Norte do país para saciar o desejo de lampreia do rio Minho

Lampreia - Escondido de Chamosinhos
Lampreia - Escondido de Chamosinhos Expresso

Onde se come a melhor Lampreia do rio Minho?

Escondido de Chamosinhos
No restaurante Escondido de Chamosinhos, célebre pela singularidade das carnes exóticas servidas - do corcodilo ao búfalo -, o “Arroz de lampreia”, “apenas do rio Minho”, é estrela em época própria. A preparação requer retirar cuidadosamente a espicha, que “se rebentar confere à lampreia um sabor azedo”, limpar muito bem com água a ferver e colocar o ciclóstomo numa vinha d’alhos durante 24 horas. A marinada leva “vinhão de Ponte da Barca, alho, louro, pimenta, cominhos, cravinho, salsa e sal” que conferem sabor apurado. Segue-se o refogado da lampreia, com cebola e alho, durante 15 a 20 minutos, a que se segue a elaboração do arroz caldoso, explica Óscar Pereira, dono do restaurante que conta mais de 50 anos de experiência. Local de referência para saborear o ciclóstomo, aqui, a lampreia também se prepara noutras confeções, como à bordalesa e no forno, esta última apenas por encomenda.
Rua de Chamosinhos, 511, São Pedro da Torre. Tel. 251839256

Casa Lau
Sempre que é capturada no rio Minho, a lampreia é certeira na Casa Lau, restaurante familiar, que a serve em arroz, mas também de escabeche, assada no forno e à bordalesa. O dom da cozinha corre no sangue da família há perto de 60 anos, antes no centro da vila e agora nesta casa há quase 30. Maria José, na cozinha, e Júlio Vaz, na sala, sugerem ainda sobremesas caseiras como o “Leite-creme”, a cerveirense “Tarte com gila” e o “Pudim Abade de Priscos”.
Lugar de Igreja, Loivo. Tel. 251795162

Lampreia - restaurante Camelo
Lampreia - restaurante Camelo Expresso

Restaurante Camelo
O sabor não deixa ninguém indiferente e no restaurante Camelo, onde constitui “uma experiência de gala” são variadas as confeções para que possa apreciar em plenitude o ciclóstomo que faz parte da ementa da gastronomia nacional. Além de à bordalesa, em arroz e assada no forno, confeções disponíveis para dois ou quatro comensais, consoante o tamanho do ciclóstomo e do apetite, no Camelo a lampreia do rio Minho também se prepara em empadinhas, açorda e escabeche, mas só quando houver em maior abundância.
Rua de Santa Marta, EN119, Portuzelo, Viana do Castelo. Tel. 919983924

Restaurante 7 à 7
Focada nas receitas e saberes de antigamente, esta casa é porto de abrigo para os apreciadores do “Arroz de lampreia”. No Restaurante 7 à 7 prepara-se com vinho verde tinto de Monção e não se retira a pele, “para conservar o paladar”, explica Guilherme Tavares, proprietário e chefe de cozinha. A marinada onde repousa de um dia para o outro leva também vinagre, evitando que o sangue coagule. Sobre o estrugido de cebola e alho, louro, banha, azeite e duas tiras de presunto coloca-se vinho branco e depois a lampreia. Na temporada, é servida também à bordalesa, assada ou grelhada. Com fumeiro produzido na casa, o “Cozido à portuguesa” serve-se o ano inteiro, tal como o “Cordeiro à moda de Monção”, ambos disponíveis à quinta-feira, fins de semana e feriados.
Rua Conselheiro João Cunha, 55, Monção. Tel. 251652577

Lampreia, um das atrações da cozinha do restaurante
Lampreia, um das atrações da cozinha do restaurante Expresso

Adega Sabino
Abriu como tasca nos anos 40, evoluiu para casa de pasto na década de 70 e desde 1993 passou a constar do letreiro de restaurante, que pelas mãos do casal proprietário, Manuel (conhecido por “Sabino”) e Odete, é também sala de visitas de Melgaço. A Adega Sabino soma sabores tradicionais do Alto Minho, sempre na companhia do afamado Alvarinho regional. Na sala, recheada de apontamentos, objetos e recordações, o “Arroz de lampreia” brilha a cada temporada. O preço, tal como acontece com todos os espaços que servem este prato, pode variar a cada semana, consoante os exemplares disponíveis que ditam o valor de mercado. Por estarem sempre disponíveis, aconselham-se o “Cabrito do monte” e o “Naco de vitela”.
Largo Hermenegildo Solheiro, 46, Melgaço. Tel. 963452031

O Gaveto
A abertura da época da lampreia é tão importante neste restaurante, habituado a servi-la com pompa e circunstância, que se anuncia logo na imagem de perfil da página de Facebook deste espaço icónico de Matosinhos. A temporada dedicada ao ciclóstomo começa neste mês de janeiro e prolonga-se até abril e, de acordo com O Gaveto, aponta tanto “para os amantes de lampreia” como para “os que só agora se atrevem a provar este sabor único”. Criteriosamente selecionada na origem é confecionada de forma simples mas com mestria, garante-se, dá origem às receitas clássicas, à bordalesa ou em arroz. Além de saborear o prato no restaurante, também aceitam encomendas através de take away.
Rua Roberto Ivens, 826, Matosinhos. Tel. 229378796

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Lampreia
Lampreia Vila Nova de Cerveira

Manjar divino
“Ó lampreia divina, ó divino arroz. Comida noite velha, em casa do Julião! Sem ter ceias assim o que há-de ser de nós? Sofre meu paladar! Chora meu coração!”, escreveu o poeta Afonso Lopes Vieira, fã da receita capaz de desencadear, em igual medida, paixões assolapadas e profunda rejeição. Este produto é prazer supremo para Nuno Ferreira. Já amanhou mais de oito mil ciclóstomos para os transformar num manjar saboreado todos os anos entre janeiro e abril. Presidente da direção da Confraria da Lampreia do Rio Minho, revela que na região, onde chega do mar “muito gorda” e o exercício de subir o rio, lutando contra a corrente, torna a carne menos gordurosa, mais dura e saborosa, “não se esfola, apenas se lava muito bem, porque o sabor está na gordura e na pele”. Amanhar o ciclóstomo “tem os seus segredos”, garante. Depois de bem lavada, escaldada com água a ferver e esfregada com um saco de serapilheira de modo a eliminar o “véu branco” que cobre a pele, retira-se a espicha, uma cartilagem na cabeça que “dá um sabor amargo se for cozinhada”, e a tripa. O sangue, que será aproveitado para a receita, fica a escorrer, antes de se adicionar a uma marinada – com alho, sal, louro, salsa e pimenta branca. Acrescenta-se vinho, tradicionalmente verde tinto da região, mas que a preferência da cozinha pode ditar ser do Douro, e a lampreia, deixando ganhar sabor por 24 horas.

O estrugido requer “lume vivo e forte” a amolecer cebola e alho-francês em pouco azeite. Cada receita tem segredo próprio. No restaurante 7 à 7 prepara-se “à moda antiga”, escaldando e escovando a pele sem a retirar, usa-se verde tinto de Monção e vinagre, que “evita que o sangue coagule”. Além de alho e cebola, a confeção integra ainda louro, banha e “duas tiras de presunto”, pormenoriza Guilherme Tavares, proprietário e cozinheiro. A lampreia fica a estufar por cerca de 20 minutos e reserva-se depois. Adiciona-se o arroz, de preferência carolino nacional, água a ferver – e, a gosto, parte da marinada – e no final o ciclóstomo regressa à panela. As ovas ou mílharas, que conferem sabor e consistência ao caldo, valorizam a captura das fêmeas.

Ciclóstomo pré-histórico
Antes de ser capturado no rio Minho, este ciclóstomo pré-histórico enceta uma longa viagem. Fóssil vivo, cuja existência remonta há mais de 300 milhões de anos, nasce no rio e migra para o mar, regressando depois ao ponto de partida. A captura pode ser tradicional ou através das pesqueiras, estruturas ancestrais que são Património Cultural Imaterial Nacional desde 2022. Há mais de 900, embora menos de 200 em atividade. Pode conhecer as seculares pesqueiras do rio Minho com a Montes Laboreiro (tel. 251011446).

Um guia para provar tradições de Portugal
Do minhoto “Arroz de sarrabulho de Ponte de Lima”, ao transmontano “Butelo com casulas”, da outrora pobre “Feijoada de sames”, ao cosmopolita “Bacalhau à Brás”, dos raros “Molhinhos de Carneiro com grão”, à serrana “Galinha cerejada”, passando pela tradicional “Espetada regional com milho frito” ou pelas festivas “Sopas do Espírito Santo”, a cozinha tradicional está repleta de truques, segredos, histórias para descobrir no novo guia essencial “Restaurantes, Pratos e Produtos Regionais”.

Dividido pelas sete regiões de turismo – Porto e Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Ribatejo, Algarve, Açores e Madeira, o novo guia “Restaurantes, Pratos e Produtos Regionais”, com a chancela Boa Cama Boa Mesa e apoio do Recheio, está disponível desde de 8 de novembro (€15,90) em banca e/ou online AQUI (com desconto e oferta de portes para assinantes do Expresso).

Ao longo de 260 páginas, dedicadas aos mais típicos sabores locais, revelam-se histórias e curiosidades que dão forma a estas receitas. Cada prato, uma história, por vezes com várias versões, para descobrir pela voz de quem lhe conhece os segredos e pela mão dos guardiões da tradição: os melhores restaurantes tradicionais, que preservam um legado passado de geração em geração.

Sugerem-se cerca de 250 espaços para visitar, sentar-se à mesa e comprovar a autenticidade dos sabores regionais, partir à descoberta dos produtos locais ou “pôr a mão na massa”, em experiências que envolvem gastronomia e vinhos.

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