A minha jornada na investigação sobre as leguminosas já dura há muitos anos. Acredito que são uma parte integral de uma dieta e de um ambiente saudáveis, e excelentes fornecedoras de serviços de ecossistema, sejam eles de aprovisionamento, de regulação e manutenção ou culturais. E é com muita satisfação que tenho vindo a testemunhar na Europa um aumento da sua visibilidade.
As evidências e consequências deste aumento de notoriedade são muitas. A produção mundial aumentou cerca de 60% entre 2000 e 2021, impulsionada pela procura tanto em mercados emergentes, onde são uma fonte acessível de proteína, quanto em países desenvolvidos, onde são valorizadas em produtos alimentares à base de plantas. Criou-se em 2019 o Dia Mundial das Leguminosas, um evento global designado pelas Nações Unidas para reconhecer a importância das leguminosas (lentilhas, feijão, grão-de-bico, tremoços, entre outros) na nossa alimentação. Celebramos hoje a sua sexta edição.
A nossa roda dos alimentos tem uma fatia dedicada às leguminosas, para salientarmos a importância do seu consumo regular. Também em Portugal, concebemos o LeguCon, um consórcio nacional de partes interessadas em leguminosas. Foram criadas sociedades científicas internacionais muito ativas, específicas para as leguminosas, como por exemplo a Sociedade Internacional das Leguminosas (ILS). Há congressos inteiros dedicados a elas. Só para nomear alguns: o congresso internacional de genética e genómica das leguminosas, a caminho da 12ª edição; a conferência internacional de investigação sobre leguminosas alimentares, a caminho da 8ª edição; e a conferência internacional das leguminosas, que já vai para a 9ª edição. E temos revistas científicas especializadas internacionais que publicam artigos sobre leguminosas, como por exemplo a revista Legume Research, da Agricultural Research Communication Centre, Legume Science, da Wiley, e a Legume Perspectives, coordenada pela ILS.
Contudo, o seu cultivo e o seu consumo são ainda muito baixos na Europa, o que nos traz alguns paradoxos. O primeiro é que novos países fora da União Europeia estão a ganhar relevância como produtores e exportadores de leguminosas. A Rússia tem impulsionado as suas exportações de ervilhas secas, enquanto a Argentina consolidou-se como um fornecedor importante de feijão. A Turquia está a investir no aumento da produção de leguminosas, especialmente lentilhas vermelhas, para expandir a sua participação no mercado global. Essas tendências reforçam a crescente relevância das leguminosas no setor agrícola e alimentar global, evidenciando a sua importância na nutrição, sustentabilidade e economia.
O segundo, é que há ainda um grande desequilíbrio na quantidade de investigação realizada nos países onde as leguminosas desempenham um papel central na alimentação da população (por exemplo nas terras áridas do Sul da Ásia e da África subsariana). Paradoxalmente, os países de baixo rendimento são responsáveis por aproximadamente 55% da produção global. Logo, deveríamos equacionar um aumento do investimento da investigação para as leguminosas nestes países. Terceiro, é sabido que queremos aumentar a produção e consumo de leguminosas na União Europeia, reduzindo o consumo da proteína animal. Mas cerca de 60% das leguminosas que importamos é ainda canalizada para a ração animal. E finalmente, temos políticas ambientais exigentes para promover uma agricultura mais sustentável na União Europeia, e muitas das leguminosas que importamos provêm de países onde as condições de produção não seguem os padrões que queremos “cá dentro”.
Na Europa, temos muita investigação e inovação nas leguminosas, mas continuamos a precisar de aumentar o consumo e a produção, quer para o mercado regional, quer para o mercado global. Estaremos a canalizar os nossos esforços da forma mais eficaz? Estará o público europeu consciente para a necessidade desta transição, ou continuaremos dependentes das importações externas? Nesse sentido, diversos projetos europeus, como por exemplo o projeto legumES, financiado pelo programa Horizonte 2020 e coordenado pela Universidade Católica Portuguesa, no Porto, procuram trabalhar estas questões, descobrir e valorizar melhor os serviços de ecossistema fornecidos pelas leguminosas (que são inúmeros), podemos conseguir melhores resultados, e mais rapidamente.
Investigadora e docente da Escola Superior de Biotecnologia/CBQF da Universidade Católica Portuguesa, Porto