Há algumas semanas foi lançado ‘Ganhar Voz’, o EP com que Dreia se estreou no mundo da música após o lançamento de alguns ‘singles’ promissores. Através de uma ‘listening party’, que teve lugar em Lisboa para celebrar este lançamento, a jovem artista teve a oportunidade de ter um dos seus primeiros contactos com o público e de se dar a conhecer enquanto um nome a deixar 'debaixo de... ouvido'.

Foi a propósito deste lançamento que o Notícias ao Minuto esteve à conversa (via videochamada) com Dreia, nome artístico de Andreia Monteiro.

Agora com 28 anos, a cantora já passou pelo mundo do jornalismo, mas decidiu voltar a uma antiga paixão que, apesar de sempre ter estado com ela, não estava a ser ‘acarinhada’ como merecia.

É deste processo que nasce o título deste EP - 'Ganhar Voz' - um primeiro trabalho composto por seis (promissores) temas. Dreia falou-nos sobre o começo no mundo da música, o processo criativo, planos futuros e as maiores influências.

Pode ler abaixo esta entrevista na íntegra.

© Diana Mendes

Como correu a ‘listening party’ do EP? Foi a primeira vez que tiveste tantas pessoas em contacto com a tua música.

Correu bem! Foi muito bom celebrar o EP, conversar, contar histórias, estar com as pessoas… Foi bom. Tinha lá muitos amigos, mas também estiveram lá pessoas que não conhecia. Ainda que tenha sido um pouco estranho, ao mesmo tempo soube bem - saber que as pessoas se identificavam com as mensagens e as canções.

Tiveste muitas pessoas a falar contigo sobre as músicas? Como te sentes enquanto artista com esse ‘input’?

Muito bem. Tive muitas pessoas a dizer que se identificaram muito com as coisas que partilhei sobre as canções, que gostaram de me ouvir falar sobre as histórias por detrás de cada canção e acho que isso é uma das principais razões que me leva a fazer música - conseguir ecoar aquilo que tantos de nós sentimos. Sentimos todos mais ou menos as mesmas coisas, os pormenores é que se vão alterando. Às vezes é mais fácil sabermos que não estamos sozinhos.

Ainda que já tenhas lançado algumas músicas, este é o teu primeiro EP. O que é que representa este passo para ti, naquela que acreditas ser a tua jornada enquanto artista?

Acho que é uma apresentação minha enquanto pessoa e artista. É um trabalho muito verdadeiro e autobiográfico. É muito emocionante porque este tema do Ganhar Voz - que dá nome do EP - já existia há alguns anos e, no fundo, é um EP com seis canções, com cada uma delas a ser sobre alguma coisa que aprendi nos últimos anos no processo de ganhar voz. Seja na forma mais literal que possas ter, que é viver a achar que não sabia cantar e houve toda uma descoberta a reconectar-me com a minha voz, livrar-me desses pensamentos, estudar música, começar a cantar e decidir que queria fazer disso vida.

E há também o ganhar voz enquanto pessoa, metafórico. Porque lembro-me de ser pequenina e ter em mim todos os sonhos do mundo e onde o impossível era uma palavra que não fazia muito sentido. Mas de repente começamos a viver, a cruzarmo-nos com outras pessoas, com as limitações que a sociedade impõe e vai entrando no nosso subconsciente… Fui-me afastando de algumas coisas e fui-me perdendo. Nos últimos anos estive, de certa forma, a reconstruir a minha voz, a voltar ao que eu era, às coisas que me faziam sentido e ao que eu queria no inicio, que era ser artista.

O que é que te fez voltar a essa ‘essência’ que tinhas quando eras mais nova? Houve algum acontecimento que consigas apontar?

Sim. Primeiro comecei a estudar música porque, como trabalhava como jornalista, comecei a entrevistar vários músicos e isso despertou-me ainda mais o ‘bichinho’. Mas, quando me decidi despedir para apostar na música, foi porque fiquei doente, com uma depressão e um ‘burnout’, e nessa altura questionei muita coisa. Percebi que ficar doente não é uma hipótese, muito menos para um sonho que não é o meu.

Aí percebi que tinha de fazer alguma coisa por mim e pelo que quero, que tinha de deixar de viver a vida que escolheram para mim e tentar. Ainda nova, para não chegar aos 70 anos e viver amargurada porque nem sequer tinha tentado. Dei esse passo graças à minha rede de apoio. É uma ação corajosa, mas a coragem às vezes tem privilégio. Eu sabia que tinha uma rede de pessoas que me podiam apoiar e decidi dar esse passo.

© Diana Mendes

É natural que, depois de um EP, se comece a pensar nos próximos passos e, claro, no lançamento de um álbum. É isso que está no horizonte?

Não sei. Tenho de ver o que aparece. Para já o que tenho pensado não é um álbum, é mais um EP. Mas não sei. Às vezes as coisas podem mudar e posso vir a ter os meios para fazer um álbum. Adorava [risos]. Quero muito um dia ter um álbum, com mais músicas.

Há artistas que gostam mais do processo criativo de compor e escrever letras, de gravar ou de atuar ao vivo. Estás incluída em alguns destes grupos?

Não sei se consigo responder, porque não tenho muita experiência a cantar ao vivo…

Mas é algo que gostarias de fazer no futuro?

Tenho muita vontade, ainda que sofra muito de ansiedade [risos]. Fico muito, muito nervosa quando tenho de cantar ao vivo, mas eu gosto muito de palco. Isso sei, porque já fiz teatro e cantei ao vivo e, embora aqueles momentos antes de entrar sejam um sofrimento, a verdade é que depois de uma ou duas músicas fico à vontade e já não quero sair do palco. Gosto muito de partilhar com as pessoas, da energia do palco.

Mas também gosto muito de criar. Escrevi as canções com a Rita Onofre e foi muito bonito, porque é mesmo muito bom trabalhar com ela. Também gosto imenso de estar sentada a partilhar histórias com uma pessoa e chegarmos à canção que faz sentido e que melhor serve os temas. Também gosto de gravar, mas às vezes o desafio é que, quando gravamos as vozes finais depois da composição, a emoção pode não estar lá. Houve algumas músicas no meu EP em que isso aconteceu, mas consegui sempre dar a volta e isso também é um bom processo e uma prova de superação.

© Diana Mendes

Falando agora sobre o processo de escrita, é interessante referires que foste jornalista porque, enquanto jornalista temos de saber contar histórias e poucas vezes é acerca de nós. Como é que vês o casamento desse teu lado de jornalista - no sentido de contar outras histórias além das tuas - com escrever novas músicas que não sejam acerca de ti?

Não sei se esse vai ser o meu próximo passo, mas eu acho que, enquanto compositora, por vezes escreverei sobre as minhas experiências e em outras ocasiões sobre histórias que ouça à minha volta e queira meter numa canção. Gostava de eventualmente incluir histórias de outras pessoas, até porque é algo que continuo a fazer - recolher histórias que não são minhas e escrever sobre elas. É algo de que gosto muito e que me enriquece. Se calhar um dia isso aparecerá nas minhas canções.

Após ouvir o EP fiquei interessado em saber mais sobre as tuas influências. Que artistas ou bandas - nacionais e internacionais - dirias que foram influentes para a tua música?

Alguns registos não têm nada a ver [risos], mas houve várias influências. Aquela que é a influência de quase toda a gente: a Billie Eilish. Há também a Willow, nomeadamente o seu álbum mais de jazz - que gostava de ter sido eu a escrever [risos] - e gosto muito do Jacob Collier.

Agora também ouço mais música portuguesa. Obviamente, a Rita Onofre, a Iolanda, a Ana Lua Caiano, um bocadinho de Cláudia Pascoal, a Maro… A nível de interpretação também gosto muito do Salvador Sobral, dos Cordel, José Mário Branco, Rio Grande… Voltei a Madredeus, que ouvia em criança.

Como podes ver são muitas e variadas as influências [risos].

© Diana Mendes

Referiste muitos nomes de artistas femininas, como é o caso da Ana Lua Caiano, da Maro, da Iolanda, entre outras. Nomes que nos últimos anos se têm afirmado bastante. Mesmo que estejas a começar agora a tua carreira, sentes que graças à relevância de mulheres como estas hoje em dia é mais fácil para uma artista feminina trilhar o seu caminho e afirmar-se?

Acho que sim. Mas ser mais fácil não quer dizer que seja assim tão fácil. Certamente houve muita gente a abrir caminho para que estas artistas possam estar também agora a fazer esse percurso e para que mim, que estou a começar. Devo-lhes esse caminho todo que estão a abrir. Uma Carolina Deslandes, uma Bárbara Tinoco ou uma Luísa Sobral vieram a abrir muito o caminho para as mulheres compositoras, sobretudo para que houvesse mais do que uma mulher a ser ouvida. Mas ainda há muita coisa para melhorar.

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