"O país, à semelhança da maior parte dos países da África Ocidental, tem sido utilizado pelas redes internacionais do narcotráfico e Cabo Verde deixou de ser apenas um país de trânsito, para começar a ser um local de armazenamento [de droga]", disse Luís José Tavares Landim, na abertura de um seminário, na cidade da Praia, sobre o combate ao tráfico ilícito de estupefacientes por mar e a operacionalização do artigo 17.º da Convenção de Viena de 1988.
O PGR enumerou grandes apreensões de cocaína feitas por Cabo Verde nos últimos anos, como os casos Lancha Voadora (1.500 quilos), Perla Negra (mais de 500 kg), Príncipe III (280 kg), Perpétuo Socorro de Abaete II (2.256,2 kg) e o ESER, a maior de sempre, de 10 toneladas.
Luís Landim disse que as apreensões mostram o compromisso das autoridades cabo-verdianas na luta contra o tráfico de drogas, mas sublinhou que as informações a nível mundial apontam que apenas 10% da droga traficada é apreendida.
Por outro lado, disse que tais apreensões não conduziram ao desmantelamento de redes de tráfico internacionais associados, devido, em grande parte, às dificuldades de cooperação judiciária com certos países, também partes da Convenção de Viena.
"Tendo experimentado sérias dificuldades na obtenção de colaboração de países onde as drogas provêm, concretamente os da América Latina", apontou o PRG, reconhecendo, por outro lado, o esforço do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (ONUDC) e a colaboração do Centro de Análises e Operações Marítimas - Narcóticos (MAOC-N), com sede em Lisboa.
O Procurador-geral explicou que quando se faz apreensão, a ideia não é investigar apenas esse carregamento de droga, porque está sempre ligado a uma rede de associação criminosa, pelo que considerou que o ideal seria investigar essa rede e desmantelá-la.
"Mas para isso é necessária a cooperação com outros países e às vezes há alguma dificuldade, porque há pouca colaboração, os países, infelizmente, não cooperaram, não colaboram como deviam fazer", continuou depois, em declarações aos jornalistas.
Em alguns casos, como no mais recente da maior apreensão de droga no país, adiantou que a procuradoria teve de separar processos, porque tem nomes de pessoas que estão no outro lado do atlântico e que também são arguidos, mas pediu informações e não recebeu.
"Há que separar o processo e esperar que haja cooperação para que isso possa andar", prosseguiu Luís Landim, para quem a ideia é transferir o processo para o país de origem para desencadear a investigação criminal contra essas pessoas que residem fora de Cabo Verde.
Na sua intervenção, o PGR disse ainda que algumas apreensões têm trazido alguns constrangimentos para Cabo Verde, nomeadamente no que diz respeito à gestão de bens apreendidos, concretamente de barcos.
"O Gabinete de Gestão de Bens (GAB), criado para o efeito, tem se deparado com algumas dificuldades na afetação desses bens de grande valor e de difícil gestão, o que tem causado grandes prejuízos ao Estado, com manutenção e conservação dos mesmos", referiu o responsável pelo ministério cabo-verdiano.
No caso de quatro barcos apreendidos e que estão atracados no Porto da Praia, o Procurador-geral disse que tem informações que vão ser vendidos.
Para ultrapassar esses constrangimentos, sugeriu ainda maior concentração das instituições envolvidas na gestão dos bens, para haver melhor cooperação e coordenação internas.
O seminário, destinado a 56 magistrados do Ministério Público de Cabo Verde, realiza-se no âmbito do Projeto de Apoio à Consolidação do Estado de Direito nos Países Africanos de Língua Portuguesa (PALOP) e Timor-Leste (PACED).
Orçado em 8,4 milhões de euros, o projeto, que arrancou em 2015 e vai até finais deste ano, é financiado pela União Europeia em sete milhões de euros e 1,4 milhões pelo Camões - Instituto da Cooperação e da Língua, que também administra.
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