"Ser de esquerda é, como estar na direita, uma infinidade de maneiras que o homem pode escolher ser um imbecil:
ambos, com efeito, são formas de hemiplegia (paralisia) moral."
José Ortega y Gasset
(La Rebelion de las Masas, 1937)

Vai para aí grande espavento com a expulsão de “ilegais” (sejam eles que categoria tenham) dos EUA, agora que a nova Administração Americana tomou posse, a 20 de janeiro. E grassa, outrossim, mais uma choradeira dos direitos humanos, por causa dos coitados, que vêm algemados, etc. Ora, tal facto é uma constante na história dos EUA, que começaram até por constituir uma espécie de “campo de confinamento”, numa ilha à entrada de Nova Iorque (que por acaso já visitei) a fim de fazerem um rastreio adequado de quem quisesse imigrar para os EUA.[1] E, numa situação algo inversa, até criaram um país em África, em 1847, a Libéria, para onde pretendiam encaminhar (irradiar) toda a população negra, já depois da abolição da escravatura. A coisa falhou, mas a intenção estava lá. O país ainda existe, e não parece que se recomende.[2]

Permitam-me que ilustre o que se passa hoje em dia, com dois exemplos em que fui ator. Durante algum tempo fui piloto de companhias de aviação charter. Estas companhias fazem todo o tipo de voos que as companhias aéreas de bandeira, ou outras, de transporte regular de passageiros, não fazem. Alguns desses voos destinavam-se ao transporte de “deportados”. Calharam-me alguns e vou dar dois exemplos que ocorreram no início da primeira década do presente milénio.

O primeiro voo ocorreu entre a capital de Trinidad e Tobago (duas ilhas a norte da Venezuela) e Lagos, capital da Nigéria. O avião voou vazio de Lisboa até Trinidad e ficou parqueado numa zona remota e isolada do aeroporto. A tripulação foi descansar e regressou no dia seguinte de manhã. Quando entrámos no avião, já lá estava um diplomata nigeriano, sentado num dos lugares. Cerca de meia hora depois de se terem iniciado os preparativos do voo seguinte, parqueou ao lado, um avião Boeing 767 (creio), pertencente ao Departamento de Justiça dos EUA, com umas poucas dezenas de nigerianos que iam regressar ao seu país, todos algemados e acompanhados de um marshall (um para um). Cada par sentava-se distanciado uns dos outros (o avião tinha capacidade para 304 passageiros). Comiam as refeições com garfos e facas de plástico e iam à casa de banho, acompanhados pelo polícia que os escoltava. Havia, pois, um cuidado muito grande com a segurança.

Fizemo-nos à pista e umas horas depois estávamos no aeroporto de Lagos, terra onde qualquer civilizado apenas quer ficar o menor tempo possível. Saíram todos da aeronave – ainda fomos mimados com uma ameaça entre dentes, por os termos transportado de volta – e logo que os marshalls americanos regressaram depois de terem entregado os expulsos, às “autoridades” nigerianas, fecharam-se as portas “e ala que se faz tarde”, para Lisboa, via Sal. Os polícias pernoitaram em Lisboa (no Hotel Sheraton) e regressaram no dia seguinte aos EUA. Imagine-se quanto custa uma operação destas!

O segundo caso deu-se a partir de Estocolmo, para onde foi posicionada uma tripulação. Três dias depois foi render uma outra que trazia o avião com deportados (como os anteriores), embarcados em Washington. Desta vez o destino era Islamabad, capital do Paquistão. Lá aterrámos com calor e humidade infernais. Tudo com mau aspeto. Havia agitação política e social (o costume por aquelas bandas), vendo-se amiúde veículos militares com pessoal armado. E lá regressámos a Lisboa, via Muscate, com os mesmos trâmites relativamente aos polícias americanos.

Em conclusão, as operações de repatriamento de ilegais fazem-se há muito tempo e requerem medidas de segurança (daí virem algemados, para prevenir qualquer distúrbio a bordo). Mesmo relativamente a portugueses – normalmente açorianos – aqueles que estão sem documentação ou caíam nas malhas da justiça, eram recambiados. E tudo isto era feito com alguma discrição.

O que mudou entretanto? Bom, o que mudou foi a escala; a luta política e ideológica; a mudança de alguns paradigmas; e a ampliação mediática. Enquanto até há poucos anos, a imigração clandestina orçava em poucos milhares, agora anda na casa das centenas de milhares, até milhões. Mesmo para um país de emigrantes e do tamanho e riqueza dos EUA, tal é incomportável. E o que se assiste é a uma verdadeira “invasão”, que é paga e fomentada por organizações tipo ONG ou personalidades, cujo expoente mais falado é um tal de George Soros (judeu húngaro, naturalizado americano, a quem chamam de “filantropo”), cujos objetivos são “oclusos”.

A luta política e ideológica está subjacente a tudo, focalizando-se na figura de Donald Trump, mas obviamente é mais vasta e tem que ver com agendas de “marxismo cultural”, que desembocaram na atual cultura woke, algo sinistro, que é apadrinhado pela maioria dos “esquerdopatas” existentes no leque partidário; cumulativamente com isto, abandalhou-se a atribuição da nacionalidade para capturar votos (por interesse) e subverter as sociedades por dentro. O que se passa na Europa é exemplo acabado disto e muito mais haveria a dizer.

Na mudança de paradigmas temos a registar as consequências das chamadas “primaveras árabes”, que espalharam milhões de migrantes, refugiados e imigrantes e o mais que se queira, em todas as direções (menos para os países muçulmanos mais ricos e estáveis…).

A Agenda 20/30 da ONU, que representa uma abominação e que deu origem à farsa das cimeiras relativamente às “alterações climáticas”, de tal modo que agora até já há “migrantes climáticos” – isto é, pessoas que invocam más condições de clima para se poderem acomodar noutro país – é caso do “Pacto de Marraquexe” de dezembro de 2018, que numa palavra permite que qualquer cidadão do mundo tenha direito em ir estabelecer-se e trabalhar em qualquer local do planeta.

Na prática são visados apenas uns 30 países, e tal se for desenvolvido paulatinamente, acabará com as fronteiras, os países, as raças e qualquer grupo comunitário que tenha uma individualização cultural. Ficará tudo uma “amálgama”. Bruxelas passou a subsidiar estas coisas (mandando até, às urtigas, o subjacente ao Acordo de Schengen). Talvez nem seja por acaso que o Dr. António Costa tenha ido parar ao cargo que tem atualmente já que foi o primeiro responsável pela política de portas abertas (melhor dizendo sem portas) que conduziu o estado deplorável em que neste âmbito se encontra Portugal. E ainda não vimos nada. É preciso parar, a bem ou a mal, toda esta loucura insana.

Finalmente os órgãos de comunicação social ampliam e repercutem todos estes conflitos cruzados e, ao contrário do que o seu estatuto devia obrigar, não se limitam a dar notícias, tomam partido, o que torna a situação atual numa autêntica babel. Resultado, está-se a gerar a anarquia a todos os níveis, a maioria dos políticos ocidentais andam perdidos no meio disto tudo e a única coisa que os preocupa é como ganhar votos (para continuarem, ou irem para o poder), logo não resolverão um único problema dos existentes; as redes do crime e corrupção estão a aumentar exponencialmente – pois cada vez é mais difícil de os controlar, nem há vontade política para tal – e não é necessário ser astrólogo para perceber que os povos vão caminhar rapidamente para serem pasto das calamidades mais pavorosas.

A migração serve ainda para se obter mão-de-obra barata, a ser explorada por empresários sem escrúpulos, e é simpática para muitos nacionais que não gostam de trabalhar no duro, ou não têm apetência para ganhar a vida, que não seja estar das 09.00 às 17.00 à frente de um computador, num sítio com ar condicionado ou a viver de subsídios.

Acresce a existência de uma série de “burgueses”, com alguma fatia de gordura no estômago e na bolsa, que não quer (ou não lhe interessa) ver um pouco para além da linha do horizonte e se refugiam nos slogans do falso humanitarismo, dos direitos humanos (curiosamente nunca ninguém fala em deveres), etc., confundindo constantemente a beira da estrada com a estrada da Beira! E querem fazer confundir questões humanitárias com questões de geopolítica.

É nesta “ladainha” que a Santa Sé também se deixou enredar. Resultado: tudo irá piorar.

Os problemas de cada país devem ser resolvidos dentro de cada país. E se não conseguirem – a não ser que estejam dominados por outros (mas isso é outra discussão) – só têm que se queixar de si próprios, individualmente e como comunidades. Não têm que exportar os seus problemas emigrando, ou outros, que os queiram ter lá por não quererem ter filhos ou sujar as mãos. Também se aplica a Portugal e aos portugueses.

Oficial Piloto Aviador (Ref.)

[1] Trata-se da “Ellis Island”, ilha na foz do Rio Hudson, que foi durante o século XIX e princípio do século XX a principal porta de entrada de imigrantes nos EUA. Estima-se que cerca de 12 milhões de pessoas tenham lá desembarcado.

[2] Libéria (do latim “terra livre”), país fundado em 26/7/1847, com capital em Monróvia - nome dado em honra do presidente James Monroe (até a bandeira é parecida com a americana…) – com 111.369km2 e 3.955.000 habitantes (censo de 2008). Calcula-se que actualmente só 2,5% da população é descendente dos escravos libertos, vindos dos EUA. Outros 2,5% serão descendentes de escravos oriundos das Caraíbas. Os autóctones do território só foram considerados cidadãos do país, em 1904. Foi o primeiro país independente, em África.