Este ano, o verão estava a acabar e pensei que estávamos livres de incêndios. Mas o cenário repetiu-se e as imagens na televisão são um remake de anos anteriores. É triste e desolador.

O habitual em Portugal é construir casas de qualquer forma no meio da floresta, sem respeitar as leis florestais - em faixas de aceiros ou perímetros de segurança em torno dos centros urbanos - e sem estarem legalizados. Portugal é habitualmente o líder europeu em número de incêndios, em área ardida. Em média, os incêndios em Portugal são seis vezes superiores aos de Espanha. Há anos em que mais de metade da área destruída em toda a Europa é portuguesa, quando o país ocupa apenas 92 mil quilómetros quadrados dos 4,4 milhões que a UE possui.

O norte do país é fustigado pelos incêndios, isso deve-se ao clima, propriedade rural, ao seu  abandono e a mão criminosa Luís Montenegro e Marcelo Rebelo de Sousa  têm estado bem, mas é preciso um murro na mesa para mudar esta tendência.

Sou a favor da criação de uma direção-geral, estilo SNS, presidida por um engenheiro florestal,  dedicada exclusivamente à prevenção e combate de incêndios. Sou contra a mudança  de rumo da Proteção Civil de acordo com a cor política.

Em Portugal, 85% da floresta está em mãos privadas, segundo o Inventário Florestal Nacional. O Estado Português possui apenas 2% da floresta (o resto são áreas públicas). Sabe-se que quase toda a montanha é privada, mas pouco mais se sabe.

Os  registos de casas são escassos, menos ainda dos seus ocupantes e proprietários. Ora, é fundamental continuar a atualização do registo florestal nacional, criado com Pedrógão. Os terrenos que não estejam registados devem passar  para o Estado, após um período sem reclamações. Hoje sabe-se muito pouco quem são os donos da floresta e quem nela vive.

Uma coisa é certa, sabe-se que existe uma parte da floresta que nunca arde: a da indústria. As fábricas de papel administram 6,5% das terras privadas, pouco mais de 200 mil hectares. Os seus eucaliptos não queimam e quando queimam é por contágio do vizinho. O setor investe quatro milhões de euros anualmente em trabalhos de prevenção e silvicultura. A sua brigada de intervenção rápida permanece em alerta durante todo o ano. Quase todos os incêndios extintos (85%) ocorrem em propriedades vizinhas.

Portugal combate incêndios com bombeiros voluntários, em  Espanha combate-se o fogo com profissionalismo e conhecimento. Na década de noventa, Espanha e Galiza alteraram o plano de extinção de incêndios tornando-o mais eficiente, mais baseado no conhecimento, mais profissional, mais americanizado. A Galiza foi pioneira na utilização de aeronaves anfíbias, nas técnicas de fogo controlado, nos centros de coordenação e na instalação de câmaras de vigilância automáticas. Um plano  impressionante, com análises de incidentes e causalidades por semanas, por dias, por horas. Na Galiza, dois terços do orçamento são atribuídos à prevenção e apenas um terço ao combate; em Portugal é o contrário.

Portugal tem de gastar mais dinheiro na prevenção. Espanha gasta cerca de 2.000 milhões (anuais) apenas para a extinção. Acho que, com exceção dos Estados Unidos, não há outros países que tenham tanto orçamento por pessoa. Em Portugal são 100 milhões, é muito pouco.

Os bombeiros  voluntários portugueses recebem cursos de vez em quando, compram os seus materiais de trabalho e, se forem chamados, cobram x por dia de trabalho. Sem fogo, eles não são pagos. Eles são os primeiros a chegar ao incêndio, mas o seu conhecimento técnico é limitado e as suas ferramentas ainda mais. O bombeiro profissional, com salários entre 800 e 1.500 euros mensais e horário fixo, deve também cuidar do transporte de pacientes para um hospital.

Quando deflagra um incêndio, a responsabilidade do comando passa para a Proteção Civil, é um bom serviço para defender vidas e casas, mas não para extinguir o incêndio.

Há falta de coordenação das diferentes estruturas e comandos. A Guarda Nacional é responsável pela vigilância, o Ministério da Agricultura pela prevenção, o Ministério da Administração Interna pela extinção. É preciso  um comando único para todo o trabalho, desde as equipas de prevenção até à intervenção militar urgente.

A natureza mostrou aos políticos que o caminho é a prevenção. Se não houver uma gestão preventiva da silvicultura, as tragédias vão repetir-se. Mas a prevenção é o parente pobre do combate a incêndios. Aposta-se quase tudo na extinção. Portugal tem apostado no combate, assumindo que estruturas robustas e eficientes podem responder a todas as situações, e isso é impossível. Apenas 5% do orçamento florestal é dedicado a trabalhos de prevenção, como limpeza de florestas ou criação de aceiros, 15% à vigilância e o restante à extinção.

O abandono deixa as florestas não só sem cuidado, mas, sobretudo, sem uso; a lenha cortada para a casa, a erva para os animais, o pastoreio, todas estas tarefas evitariam incêndios. Isso está em desuso.

Não faltam meios para extinguir os incêndios, é preciso prevenção, controlar os interesses da indústria de papel e os pirómanos. Os pirómanos  que cometem crimes contra o bem público deveriam ser acompanhados em termos psicológicos e usar pulseira eletrónica com GPS, sempre sujeitos a acompanhamento. E no verão, estarem em locais longe da floresta e seguidos diariamente, ou mesmo presos.

Fundador do Clube dos Pensadores