Contar histórias (storytelling) é uma atividade humana presente em todas as culturas e períodos históricos. É uma prática profundamente enraizada na comunicação oral, que ocasiona partilha de conhecimento entre gerações, estabelece tradições numa comunidade e ilustra casos humanos de superação pessoal face às várias estirpes de adversidades encontradas no meio externo. Como elementos constitutivos das culturas, as histórias oferecem entretenimento, mas também educam nos valores morais. Sabe-se, então, que storytelling emerge do mundo social, da experiência coletiva de interagir com o mundo. Há quem defina a prática como indissociável do ser-se humano ou, melhor, como a essência de ser-se humano.

Para além de trazerem o passado até nós permitindo a compreensão do presente, as histórias constroem-se com os ingredientes da vida quotidiana. Elas são narrativas persuasivas, prendem a atenção, estimulam a imaginação, e alojam-se no acervo de memórias da vida de todos e cada um. O poder das histórias não fica por aqui, já que são inúmeros os testemunhos do dia-a-dia a respeito do impacto emocional, positivo ou negativo, que elas produzem em cada um de nós.

Hoje ainda sabemos pouco sobre como as histórias ajudam à organização e comunicação da informação e do conhecimento, mas o conhecimento a este respeito progrediu em relação a décadas passadas. A investigação mais recente nas áreas da psicologia e da neurociência tem produzido resultados interessantes que as empresas deveriam conhecer, uma vez esses resultados esclarecerem a psicologia do consumidor. Por exemplo, que as histórias ajudam ao processamento de informação, com efeitos na capacidade de a recordar. Ou que ouvi-las (audição) gera mais processamento cognitivo e emocional do que vê-las (visão), o que indicia uma maior capacidade de reter e recordar quando a narrativa ocorre no registo auditivo por comparação com o registo visual.

O uso das histórias nas empresas e, em geral, nas organizações, está a ser observado nos mais diversos sectores de atividade, como na saúde, na educação, ou na hotelaria e turismo. Mas especialmente naqueles de reconhecida elevada pressão concorrencial e em que as marcas são determinantes na promessa de uma qualidade única e distinta. Em qualquer uma dessas áreas, o consumo, enquanto ato de aquisição e utilização de bens e serviços, está recheado de histórias a respeito das experiências dos consumidores na relação que desenvolvem com as empresas e marcas. Mas se antes essas histórias alcançavam não mais do que um pequeno grupo de amigos e familiares, hoje, elas atingem um número impressionante de pessoas, fruto dos novos espaços de comunicação criados pelas tecnologias digitais, sobretudo as redes sociais. Com o advento da Internet, as histórias dos consumidores não são mais as narrativas contadas apenas nessa reduzida esfera de influência.

Observamos diariamente como a partilha de histórias se expandiu à escala global a públicos tão grandes quanto diversos, todavia conectados pelos seus temas de interesse comum. A par disto, tem vindo a ser objeto de análise como as histórias baseadas nas experiências de consumo afetam as perceções dos outros consumidores a respeito da qualidade dos produtos ou das marcas, um aspeto particular do fenómeno de especial interesse e importância para as empresas. Mas as marcas, e não apenas os consumidores, têm as suas histórias para contar. Afinal de contas uma marca bem sucedida não navega sem rumo e destino, pelo que as histórias contadas pelas marcas são também elas um património a preservar, tanto quanto o de uma qualquer comunidade social. Com uma diferença: as histórias das marcas não nascem espontaneamente da vida social, são pensadas para o consumidor construir a sua interpretação da marca e das experiências de consumo por efeito de emoções que são despertadas nele através de uma narrativa empolgante. As empresas que detêm marcas de notoriedade junto dos consumidores têm a seu favor duas coisas: uma, o facto de os seres humanos possuírem apetência natural para prestar atenção a histórias, outra, o de isto mesmo já terem percebido. Capitalizam duplamente, pela estratégia e pelo conhecimento. Na realidade, nada existe de novo no storytelling, exceto o facto de as narrativas se construírem agora com um simbolismo subordinado a um valor económico. Mas muitas empresas e marcas navegam ainda nas margens exteriores deste contemporâneo storyworld.

Professora Auxiliar da Faculdade de Economia e investigadora do Cinturs, Research Centre for Tourism, Sustainability and Well-being, Universidade do Algarve